Bling Ring

A música que abre Bling Ring diz muito sobre o novo filme de Sofia Coppola. As distorções do Sleigh Bells em “Crown on the Ground” transformam o som da banda num pop sujo, que desequilibra a harmonia da música, lançando-a para fora do lugar comum. A canção oferece um paralelo direto com a maneira com que a cineasta apresenta suas personagens: cinco jovens comuns, fúteis, que preenchem o vazio de suas vidas com visitas não-autorizadas a casas de personalidades. A diretora evita dar texturas dramáticas que expliquem ou justifiquem os atos dos protagonistas. Ela prefere retratá-los de maneira áspera – como num vídeo do TMZ – como uma geração vazia.

Estamos em Los Angeles, terra do glamour e da superficialidade. Para a novaiorquina Sofia Coppola, uma cidade de simulacros, onde o projeto de uma vida feliz para as pessoas que moram ali passa direta ou indiretamente por mimetizar ricos e famosos. Os adolescentes que estrelam seu filme carregam consigo esta lógica da Cidade dos Anjos: eles cometem crimes para emular a vida que não têm e chegar perto de materializar o que não são. Os roubos não pretendem corrigir diferenças sociais nem sustentar vícios. O objetivo é mais “nobre”. Eles apenas permitem que jovens ordinários visitem o status de notoriedade de seus ídolos virtuais.

Trailer legendado do filme “Bling Ring – A Gangue de Hollywood”

A partir de um caso específico, história real que virou uma reportagem da Vanity Fair, Sofia Coppola parece ajudar a traduzir as regras desta geração, que segue o passo-a-passo das celebridades nas redes sociais e para quem as amizades surgem a partir de cliques no Facebook. Para a diretora, não foram apenas as relações interpessoais que ganharam uma plataforma abstrata, artificial, mas a própria vida. Numa das cenas que exemplificam isso bem, Rebecca, personagem de Katie Chang, grande destaque do elenco, considera roubar o cãozinho de Paris Hilton. Para ela, levar o animal para casa é uma extensão natural do processo de assimilação da vida alheia que ela tenta cultivar.

O olhar frio da diretora para os personagens tem duas consequências. A primeira é que, ao se abster de fazer juízo de valor sobre aqueles jovens, Sofia consegue dar corpo a sua motivação, que, em maior ou menor grau, é o vazio. Por outro lado, este afastamento faz com que a construção dos personagens pareça, contraditoramente, superficial, como se a diretora demonstrasse algum desprezo por eles. A cena em que em Leslie Mann, que interpreta a mãe das personagens de Emma Watson e Taissa Farmiga, ensina as filhas em casa com base na filosofia de O Segredo é um exemplo de como Sofia enxerga aquele universo. A performance de Emma sofre um pouco com essa descrença. Mas a sequência não tem nada de ficção. Ela é a reprodução quase literal da cena de um reality show protagonizado pela família (melhor assisti-la depois de ter visto o filme).

O fato é que esse caminho do meio escolhido por Sofia Coppola aproxima os jovens deste longa dos outros personagens criados pela diretora. Todos, de uma maneira ou de outra, procuram uma direção para suas vidas. Embora a “juventude transviada” retratada pela cineasta pareça concentrar seus personagens menos melancólicos, são justamente esses cinco adolescentes, esses cinco incompreendidos, aqueles que, entre todo o elenco dos filmes de Sofia, não recebem uma segunda chance. Todos parecem estar condenados a um mundo que está reiventando as relações e a própria vida na base da tentativa e erro. O mais assustador nessa perspectiva é que eles parecem se divertir no meio disso tudo.

Bling Ring: A Gangue de Hollywood EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha½
[The Bling Ring, Sofia Coppola, 2013]

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Comentários

comentários

Um pensamento sobre “Bling Ring: A Gangue de Hollywood”

  1. Não senti que elas se divertem nessas aventuras, senti que elas não sentem, senti o vazio que você comentou.
    Acho que a distância da Sofia Copola é interessante porque não condenando as jovens explicitamente, ela acaba por condenar também os famosos. A primeira seqüência mostra isso: fotos dos famosos, ostentação, mercadoria de luxo.
    Se ela tivesse mostrado a cena do julgamento o filme seria outro. A gangue não é lamentável só porque rouba, mas porque seus valores são distorcidos assim como de todas as vítimas que tiveram seus objetos roubados.

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