Daniel Day-Lewis, Cameron Diaz, Leonardo Di Caprio

Sexta-feira desesperançada e uma pergunta: – vamos ver Gangues de Nova York? O Guilherme disse que sim. Fomos os dois ao Cinearte, no Conjunto Nacional, porque queríamos ver o filme numa tela grande – e aquela é enorme. Martin Scorsese é um cineasta de grande talento, mas – exceto por Taxi Driver – nunca me envolve como outros diretores. Fui assistir Gangues de Nova Yorkesperando ver um filme grandioso, bem dirigido e com perfeição técnica, mas estava enganado. Além disso tudo, o novo filme de Martin Scorsese é genial.

O cineasta aproveita-se do cenário da guerra civil norte-americana, onde a intolerância racial e social moviam um país em formação, para contar uma pequena história de vingança pessoal. Houve quem achasse que esse microcosmo era o que era o filme. Foi quem não soube olhar nas entrelinhas e nem nos olhos de Daniel Day-Lewis, a encarnação da América. Envolto na bandeira do país, o maior ator do ano confessa: – eu sou quem eu sou por causa do medo que eu provoco nas pessoas. Metáfora?

Martin Scorsese narra o surgimento de uma cidade, a construção de uma nação a partir do choque entre as pessoas que ali estavam. O cruzamento de genes que determina o povo norte-americano é resultado de suas origens diversas. Aqui o cineasta presta uma homenagem ao povo de seu país. Mas Scorsese também lança farpas contra seu próprio umbigo. Gangues de Nova York é um exercício de reflexão sobre o papel que os EUA ocupam no mundo e sobre o que é não suportar diferenças. Sobre começar guerras por causa delas. Aqui o cineasta consegue ser tão atual como jamais pensaria em ser.

O roteiro, inteligentíssimo, amarra tão bem essas duas premissas à história do órfão que volta para se vingar do assassino de seu pai que em momento algum Gangues de Nova York ganha ares de exaltação ao país ou de denúncia.

Apesar das quase três horas de projeção, Scorsese salta os clichês e mantém uma narrativa acelerada, mas completamente integrada ao filme, que alcança a perfeição técnica em quase todos os prismas. Na fotografia azulada de Michael Ballhaus, na edição agitada de Thelma Schoonmaker, na exuberante reconstituição de época de Dante Ferretti e Sandy Powell. Gangues de Nova York é um filme de época moderno. Um épico interior. Um épico sem heróis. Um épico que não épico. Um dos melhores filmes de seu diretor. Um dos maiores clássicos do cinema recente. Principalmente porque tem gente que não percebe isso.

Gangues de Nova York 
[Gangs of New York, Martin Scorsese, 2002]

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