Christian Bale, Gary Oldman, Heath Ledger

O tipo de filme que mais me incomoda é aquele sobre o qual eu não consigo dar uma palavra final. Não um decreto para ninguém, mas uma decisão para mim mesmo. “Este filme é bom” ou “deste filme, eu não gosto”. O tempo ou uma revisão geralmente faz as coisas pesarem para um lado ou para outro, mas Batman – O Cavaleiro das Trevas tem a maior cara de que vai me torturar por anos a fio. Quem lê esse blogue sabe que eu sou fã de quadrinhos desde criança, especialmente Marvel e DC, especialmente especialmente DC Comics, e que nem sempre eu sei separar meu amor pelos personagens das minhas impressões sobre o filme (nem sei se isso é realmente necessário ou se faz parte do jogo), mas eu gostaria mesmo é de gostar deste longa pelo que ele é e não pelo que ele envolve.

Mas a sensação maior depois de assistir ao novo trabalho de Christopher Nolan é incômoda, como se dois filmes convivessem dentro de um. E eles não são muito amigos. O primeiro é aquele que todos imaginavam, uma seqüência imediata do amado/odiado Batman Begins, o filme sóbrio sobre o personagem, fugindo do fantasioso mundo de Tim Burton ou dos carros alegóricos de Joel Schumacher. O cenário abre as portas para a aguardada performance de Heath Ledger como o Coringa, muito menos descontrolada ou anárquica do que se podia esperar, mas não menos genial, composta com cuidados milimétricos, uma caracterização impecável, onde o filme aposta todo o texto bom, com destaque para a cena do interrogatório.

Neste primeiro filme, estão os atores que se esforçam para que o pacote saia íntegro, como Michael Caine, que mesmo num papel resumido mostra porque está entre os melhores, Gary Oldman, que segue negando os tiques que pontuaram sua carreira, desta vez com destaque maior dentro da trama, e o grande Aaron Eckhart, que poderia ter sido facilmente engolido pela interpretação de Ledger, mas se revela o ator mais equilibrado do filme, muito bem da primeira à última vez em que dá a(s) caras. Por sinal, eu que costumo ser relutante a novas versões sobre as origens dos personagens, acho que as soluções encontradas para Harvey Dent deram muito certo.

O segundo filme que mora dentro de O Cavaleiro das Trevas é um monstrengo grandalhão, que me fez imaginar se não teriam deixado as cenas de ação sob o comando de Michael Bay. Juro. Há (muitas) seqüências tão interessadas em demonstrar o quanto podem ser barulhentas e destruidoras que eu pensei que aquilo só poderia fazer sentido para Bay ou para os fãs de Duro de Matar. Conseguiram deixar o batmóvel ainda mais feio, parecendo um modelo inacabado de tanque de guerra. Sei que era essa a idéia, mas o filme não justifica essa visão de Gotham City com a cidade dominada pelos criminosos dos quadrinhos. E, olha, não tenho nada contra filmes de ação pela ação, mas não acho que certas coisas coexistam pacificamente com outros elementos do filme.

O que combina direitinho com essa massa bruta meio disforme é a interpretação de Christian Bale – ô atorzinho tosco! – que não tem a menor idéia do que fazer com sua canastrice, ainda mais com tanta gente boa em sua volta. É até covardia comparar os embates verbais entre o protagonista e Ledger ou Eckhart, mas ele apanha até nas conversinhas mais românticas com Maggie Gyleenhaal – eficiente, assumindo o papel de Rachel Dawes. E não há ninguém que possa me convencer que não foi um sabotador que inventou aquela voz mecânica pro Batman. Sinceramente. É uma escolha estúpida, que desmoraliza qualquer diálogo.

Por sinal, quando eu disse que reservaram o melhor do texto para Ledger, não quis dizer que somente Bale perdeu com isso. Assim como no longa anterior, O Cavaleiro das Trevas também peca por ser muito didático. Existe uma idéia que percorre todo o filme que é a de diferenciar o Batman dos heróis tradicionais ou mesmo de um herói. É uma idéia meio ingênua porque qualquer pessoa com o mínimo de informação, que não precisa ter lido uma HQ na vida, sabe que o Batman não é o Superman ou Capitão América. No entanto, o roteiro de Christopher e seu irmão Jonathan Nolan tem umas idéias interessantes, como o debate ético entre Bale e Morgan Freeman sobre a criação de um sistema espião, que lembra o Irmão Olho das HQs. É quando percebemos a moral discutível do vigilante.

É dessas diferenças que se constrói o filme. Há um espaço farto para que os bons atores entrem em cena, um cuidado para arrendorar personagens, uma decisão corajosa de deixar alguns personagens para trás e um certo esforço para que a investigação central do filme tenha alguns elementos detetivescos, mas também há muita preocupação em atrair platéias com piadas (quando elas vêem de Michael Caine ou Heath Ledger até as ruins ficam boas) e, sobretudo, com as explosões, perseguições e resgates que transformam um filme num blockbuster. Não consigo saber o que pesa mais. Não quero ser condolescente nem injusto, por isso, por enquanto, por agora, eu prefiro mesmo o meio termo.

Batman – O Cavaleiro das Trevas EstrelinhaEstrelinha½
[The Dark Knight, Christopher Nolan, 2008]

Comentários

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89 comentários sobre “Batman – O Cavaleiro das Trevas”

  1. acabo de ver.

    gosto muitíssimo do Begins, mas esse realmente não consegui me decidir. Valeo pelo Heath, mas…

    ps: afffff, achei que era só eu que achava aquela voz do Batman tosca!

  2. Ledger primoroso. Gostei do duas caras, muito boa a performance, mas sem dúvidas o “herói” dessa seqüência não é o morcego, e sim o finado Ledger na pele do Joker.

  3. vi batman e ele não me decepcionor em nada , o que raro, pq os filmes tem mais marketing do que estoria .os atores estão excelentes ,tem uma estória bem resolvida e as cenas de ação não tão sono.dizem q o coringa é engraçado, ele simplesmente hilário .já batman de bale está do jeito q imaginei sombrio e violênto

  4. simplesmente o poderoso chefao dos filmes de quadrinhos.
    Realmente incrivel.
    Assisti na estreia e vou assistir de novo. Como alguem que se diz fa de quadrinhos pode reclamar daquele filme…
    O roteirista pegou o piada mortal batman ano um e o cavaleiro das trevas, misturou tudo e criou as personalidades dos dois malfeitores, tudo em cima dos triangulos “amorosos”, rsrs , como o do bruce rachel e harvey, harvey gordon e batman e coringa batman e harvey…
    o coringa e sensacional, o que ele faz nos quadrinhos de piada mortal com o Gordon, tenta fazer esse convencimento com batman e com o harvey….
    simplesmente incrivel, claro. Um diretor que fez amnesia, tem q fazer coisa boa mesmo.

  5. Só pra ficar claro: meu último comentário não foi resposta à mensagem do Wallace, mas ao comentário imediatamente anterior.

    Quanro à voz do Batman, o que eu acho é bem isso que o Caraça falou.

  6. >No entanto, me parece que faz sentido o Batman ter uma voz diferente da do Bruce, até para não correr o risco de ser reconhecido, não é ?

    Isso é mais do que óbvio. Tem que ser bem idiota para não enxergar isso. E nem é preciso assistir nos extras do DVD para sacar isso. 😉

    >Mas talvez, realmente, isso pudesse ter sido melhor trabalhado.

    Exato. Esse é o problema que eu e o Chico tivemos com relação a isso no primeiro filme. A voz que o Bale faz é mais engraçada do que intimidadora.

  7. Juro que eu acho que tem gente que tem problemas de raciocínio e compreensão de texto. Primeiro, eu vi o filme. A maioria dos detratores aqui nem o tinha visto quando atiraram as pedras. Agora que viram, fico feliz porque serão pedras com mais propriedade.

    Mas o que mais me espanta é que, nesse texto, eu listei coisas de que eu gostava e coisas de que não gostava. Se eu não babei o ovo de cada fotograma do filme como um fã enlouquecido de HQ, que celebra qualquer coisa sem tê-la visto só porque tem uma marca, me perdoe por ter uma opinião (e eu sou um fã de HQ, não enlouquecido, claro).

    Por fim, no “Guia da Folha”, o autor citado pelo rapaz acima escreveu alguns improperios. Tipo dizer que este filme não é uma versão literal da obra homônima de Frank Miller, mas tem nela sua principal inspiração. Ahn? Pelo que eu saiba a série de Miller se passa num futuro alternativo, com o Batman velho e o Robin é uma mulher. Parece com a trama do filme? Acho que não. Depois diz que o Batman encarna “o bem, a moral e os bons costumes”. Ahn? O Batman é o herói mais anti-herói que se tem na DC. O bem, ele até pode encarnar, mas a moral? Os bons costumes? Tsc, tsc.

  8. Chico, assisti o filme hoje e, como imaginava, gostei muito. Muito mesmo. Talvez esteja entre os 3 melhores do ano, ao lado de Sangue Negro e Onde os Fracos Não Têm Vez …
    Ledger, Eckhart e Oldman estão absolutamente perfeitos, tudo na trama se encaixa e tal … mas uma coisa que vc falou me chamou a atenção: a voz do Batman … rsrsrs. É que, de fato, é algo que soa meio estranho e que atrapalha um bocado a interpretação do Bale (que, como já disse anteriormente, considero um ótimo ator). No entanto, me parece que faz sentido o Batman ter uma voz diferente da do Bruce, até para não correr o risco de ser reconhecido, não é ? Mas talvez, realmente, isso pudesse ter sido melhor trabalhado.
    Ah, a cena do ano: “vcs querem ver eu fazer esse lápis desaparecer ?” AHAHAHAHAHAAHAHAHAHAHAHAHA.

  9. Se não tem sentido festejar as qualidades de um filme porque seu personagem é herói popular dos quadrinhos, também não tem sentido descartá-lo por gozar dessa popularidade toda. Julgar sem ver ou ao menos tentar entender o que significam filmes como “Batman Begins” e “Batman – O Cavaleiro das Trevas” no contexto de hoje está longe de ser inteligente.

    critica Alessandro Giannini

    aprenda Chico.

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