Poucos cineastas duraram mais de cem anos. Ainda mais, trabalhando. Seu Manoel viveu até os 106 e chegou a assinar dois curtas em 2014, ano em que já não podia mais sair de casa. Foram inacreditáveis 80 décadas de serviços prestados ao cinema. Provavelmente um feito inédito. Se não for, um feito impressionante. Dos 62 títulos que entregou como diretor, 32 foram de longa-metragens feitos para a tela grande. O primeiro deles, Aniki Bobó, parece ter sido fortemente influenciado pelo neorrealismo italiano. Com a diferença de que o neorrealismo italiano só aconteceu alguns anos depois deste filme. Talvez para compensar os muitos anos do início de sua carreira em que só assinou curtas ou não dirigiu filmes, reservou 410 minutos para contar a história de O Sapato de Cetim.
Ao longo da carreira, dirigiu pérolas das mais variadas. De Benilde ou a Virgem Mãe até o mais recente, O Gebo e a Sombra, parindo algumas obras-primas no meio do caminho: Francisca, nos anos 80, Vale Abrãao, nos 90, Um Filme Falado, no século XXI. Manoel de Oliveira se arriscou, inclusive, na seara dos musicais e Os Canibais é um de seus melhores filmes.
Sua obra começou a correr o mundo mais nas últimas décadas de sua vida e de sua carreira. Virou figurinha fácil na Mostra de Cinema de São Paulo, para onde veio algumas vezes e onde teve uma retrospectiva completa de sua carreira até então. Foi quando incluiu Catherine Deneuve, John Malkovich, Michel Piccoli, Marcello Mastroianni, Irene Papas a seu elenco habitual, que, entre outros, pode ser muito bem representado pelos parceiros Luís Miguel Cintra e Leonor Silveira e pelo sobrinho, Ricardo Trêpa. Talvez o nomes que mais se repitam em seus filme. O prestígio permitiu ao cineasta uma ousadia. Retomar a história de um clássico de Luis Buñuel, A Bela da Tarde, no tocante Sempre Bela.
De 1990 a 2010, entregou pelo menos um filme por ano, a maioria longas. Para uns foi pressentimento; para outros, foi a vontade de deixar um presente pro mundo.