[as regras do jogo]


O mundo, meus caros, é dos espertos. Vez por outra aparece um filme assim, como Obrigado por Fumar, um exercício sarcástico sobre alguma faceta sombria do mundo dos negócios. Geralmente são filmes com humor negro afiadíssimo que dispõem de muitas informações sobre o assunto e que, principalmente, estão dispostos a tudo para serem encarados como inteligente crônica contemporânea e assim fazer sua denúncia, vender seu estilo, ganhar seu prestígio.

Muita vezes o diretor deste tipo de filme é um jovem que geralmente depois do impacto de sua obra ganha o adjetivo de promissor. Obviamente, já que a literatura sempre parecerá mais nobre do que o cinema, se o filme for baseado num livro, meio caminho andado. Claro que pela ousadia do tema, no caso aqui a indústria do lobby por trás dos cigarros, raramente conta com muito apoio financeiro, a não ser de gente que achou a idéia do filme super bacana e que quer mostrar engajamento dando suporte para um projeto tão importante e desafiador.

E não é nada raro que se encontre um bom ator, geralmente caro ao circuito independente – mas que, claro, ganha seus trocados fazendo papéis menores em veículos para grandes estrelas – para fazer o papel principal. Aaron Eckhart, que está muito bem, é escoladíssimo no assunto: seu papel breakthrough foi naquele filme misógino, feito neste mesmo esquema, o Na Companhia de Homens. Para dar mais estirpe coadjuvantes de luxo ajudam muito, tipo uma atriz do momento (Maria Bello, ótima como lobista do álcool), um veterano (Robert Duvall, se repetindo e repetindo outros), uma revelação (Cameron Bright, em mais um papel de geniozinho) e um revival (Rob Lowe, inacreditavelmente perfeito).

Pois bem, veja só o quadro: diretor novato + tema polêmico + adaptação de livro + atores respeitados + visual moderninho (bem eficientezinho). Perfeição. Pena que os supostos questionamentos que o filme faz ao caráter de seu protagonista pareçam tão vazios já que podem tranqüilamente serem destinados ao próprio filme, que passa por cima de tudo e todos para fazer sua denúncia, sem perder o charme, sem deixar de ser safo e, principalmente, sem deixar de faturar com isso. Quem sabe não rola um Spirit e até um Oscar de roteiro adaptado? O mundo, meus caros, é dos espertos.

[obrigado por fumar ]
direção e roteiro: Jason Reitman, baseado em livro de Christopher Buckley.
elenco: Aaron Eckhart, Maria Bello, Cameron Bright, Adam Brody, Sam Elliott, Katie Holmes, David Koechner, Rob Lowe, William H. Macy, J.K. Simmons, Robert Duvall, Kim Dickens, Connie Ray, Todd Louiso.
fotografia: Jim Whitaker. montagem: Dana E. Glauberman. música: Rolfe Kent. desenho de produção: Steve Saklad. figurinos: Danny Glicker. produção: David O. Sacks. site oficial:
Obrigado por Fumar. duração: 92 min. Thank You for Smoking, Estados Unidos, 2006.

nas picapes: [deadweight, beck]

Comentários

comentários

7 comentários sobre “[obrigado por fumar]”

  1. Ah, Chico! Achei o filme tãããão divertido! Mas concordo com vc (“Quando faz esse joguinho, o filme é tão sacana quanto a personagem porque fatura em cima da denúncia e da exposição”). Mas que é divertido, é. Também fiquei boquiaberta com o Rob Lowe, que parece que virou ator depois de “véio”.

    Um beijo pra vc!

  2. Vou tentar deixar mais claro. Para mim, o filme expõe a personagem como um sacana simpático. A princípio, isso parece fazer o filme estar ao lado dele, mas nem sempre isso é verdade já que a intenção final é mostrar as sacanagens que ele faz. Quando faz esse joguinho, o filme é tão sacana quanto a personagem porque fatura em cima da denúncia e da exposição.

  3. Bruno, eu vou mais além: a princípio, o filme supostamente defende seu protagonista, mas esta exposição de seu caráter teria a função maior de crítica, de denúncia. É um jogo bem armado mesmo. No entanto, é tão “jogo”, tão armado, que me parecem claras as intenções de faturar em cima dos outros dos próprios autores.

  4. Engraçado vc ter escrito “os supostos questionamentos que o filme faz ao caráter de seu protagonista” pq eu fiquei com a impressão contrária: que o filme defende o ponto de vista do protagonista ao invés de criticá-lo. Por isso achei o filme muito interessante, ainda que superestimado.

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