[o complexo mundo da vingança sobrenatural]


O espanto da boa atriz que é Radha Mitchell na foto deve ter sido causado quando ela viu o resultado do filme que provavelmente topou fazer porque a) “vai me dar uma bela grana e vou ficar famosa entre os jovens”; e b) “deve ser muito divertido”. Pois bem, Radha, como eu, deve ter ficado chocada com o desperdício de boas idéias num filme confuso, mal explicado, com variações bruscas entre imaginação e a falta dela. Primeiro, o final. É aceitável que não se tenha pleno entendimento de uma trama de um filme de roteiro elaborado, como os de David Lynch ou como Caché (Michael Haneke, 2005), com seu final aberto, mas um longa como Silent Hill tem a obrigação de oferecer uma história entendível quando o espectador – que não jogou e não conhece o game – sai da sala de cinema.

O roteirista, Roger Avary, de Pulp Fiction (Quentin Tarantino, 1994), não concorda comigo. Estava muito mais preocupado em deixar engenhosa a estrutura do filme que passou ao largo de algumas questões básicas para a compreensão do longa. Como, por exemplo, se deu o processo de isolamento da cidade e qual o porquê do mistério que todos nas redondezas tentam preservar? Havia manifestação de poderes ou qual era o motivo da perseguição? E como aquela mulher engravidou?

Avary sequer dá algum embasamento ao que o filme tem de melhor, a ação em planos existenciais diferentes. Afinal, estamos numa outra dimensão?

Christopher Gans até tem certo mérito em apresentar as personagens e as manipular com alguma desenvoltura em cenários bem desenhados. Mas todo o estiloso visual, muitas vezes aterrorizante, é banalizado depois de alguns minutos do filme e o poder da sugestão, que parecia tão promissor e oferecia belos momentos de medo primitivo, dão lugar a um vazio narrativo digno de ser chamado de enchimento-de-lingüiça com personagens de game que definitivamente não funcionam em carne-e-osso, como a velha farrapenta patética que a coitada da Deborah Kara Unger foi obrigada a fazer. O filme desperdiça uma atriz excelente como Alice Krige no papel de fanática religiosa mais clichê que alguém pode escrever, o que culmina com uma resolução megalomaníaca e sem imaginação.

[terror em silent hill ]
direção: Christophe Gans.
roteiro: Roger Avary, baseado nos dois primeiros jogos da série Silent Hill.
elenco: Radha Mitchell, Sean Bean, Laurie Holden, Deborah Kara Unger, Kim Coates, Tanya Allen, Alice Krige, Jodelle Ferland, Eve Crawford, Ron Gabriel, Colleen Williams.
fotografia: Dan Laustsen. montagem: Sébastien Prangère. música: Jeff Danna e Akira Yamaoka. desenho de produção: Carol Spier. figurinos: Wendy Partridge. produção: Don Carmody e Samuel Hadida. site oficial:
terror em silent hill. duração: 127 min. silent hill, estados unidos, 2006.

nas picapes: [come upstairs, snooze]

Comentários

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10 comentários sobre “[terror em silent hill]”

  1. Chicolino,
    concordo com sua crítica. É claro! vimos juntos e tivemos os mesmos questionamenos e a mesma canseira daquele visual maravilhoso (eles conseguiram me cansar! eu, apaixonado com filmes de terror ficaria olhando aqueles monstros cadaveres por 2 dias seguidos, hehehe). Não acho que qualquer filme tenha a obrigação de apresentar os motivos, etc, mas nesse, a personagem fica buscando e te levando a buscar tb o tempo todo o resultado final, os motivos, etc. Parece basico que depois de tantas idas e vindas vc queira saber o porque disso tudo. E não há um porque claro! Nem comente David Linch. O filme passa longe disso….

  2. Acabei de ver o remake que o Stephen King fez de uma série do Lars von Trier que, apesar de teoricamente ser terror (é repleta de fantasmas, monstros, cadáveres-sem-cabeça etc. _sem falar que é num hospital, um dos lugares mais assustadores do mundo), não assusta nem uma mosca. Mas é legal mesmo assim.

  3. Concordo. Mas acho que um filme de terror que não assusta não é obrigatoriamente um fracasso. Já vi filmes de terror que eram, por exemplo, muito românticos ou engraçados.

  4. Cheguei a jogar “Silent Hill” uma vez, não deu para sacar do que se tratava. Agora, eu acho que um filme de terror, paradoxalmente, pode não assustar e não ser necessariamente ruim por causa disso. Caso do “Phenomena”, do já citado Argento, que é considerado terror, mas é muito divertido e pouco ou quase nada assustador.

  5. Eu prefiro filme de terror confuso que filme policial confuso. Adoro A MANSÃO DO INFERNO, do Argento. Mas ainda estou com o pé atrás com esse filme. Vamos ver quando (ou se) estrear aqui.

  6. Carlos, tá, soou preconceituoso, mas o que eu acho, na verdade, é que o filme é confuso e isso prejudica o entendimento de tudo. Eu realmente fiquei com muitas dúvidas. Um filme de terror tem uma função específica, diferente de outros gêneros: assustar. Este aqui poderia ssustar mais se a gente entendesse ele melhor.

    Diego, eu acho tudo o que envolve o fanatismo religioso mal tratado, mal apresentado, cheio de idéias gastas.

  7. Discordo quando você diz que o filme “tem a obrigação de oferecer uma história entendível”. Tem nada! QUe filme tem?

    As coisas ficam claramente surrealistas (pra não dizer non-sense) a partir do acidente, e acho que o filme só piora quando tenta explicar algo (como naquela montagem, que mais serve para entendermos o subtexto sobre fanatismo religioso do que pra sacar o quê realmente aconteceu ali). Não fosse ela, seria um *** na minha listinha.

    De resto, acho o clímax, ainda que over, muito assustador. E a direção de arte é a melhor do ano até agora (mesmo sendo inteiramente baseada na direção de arte dos jogos).

  8. chico, me explique uma coisa… por que um filme de arte pode ser surrealista e um filme de terror não?

    acho que essa foi a principal reclamação contra silent hill, só que o jogo também é surrealista e tem o mesmo clima de “precisa pensar muito para entender algo”. e é muito, muito mais complexo do que se pode imaginar.

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