Orgulho & Preconceito

Existem algumas palavras que você aprende quando é criança, mas que raramente usa depois que cresce. Cada um tem seu próprio repertório. No meu, há espaço para termos como caudaloso e frondosa. Por isso, eu comemoro bastante quando surge alguma oportunidade para usá-los. E escrever sobre Orgulho e Preconceito é uma grande desculpa para falar de frescor. A mais recente adaptação do romance clássico de Jane Austen é um impressionante exercício de como revigorar uma obra com recorte histórico tão exato, com um tema tão banal para os dias de hoje quanto o amor entre pessoas de classes sociais diferentes.

Há de se celebrar o material original: o texto de Austen, apesar de retratar uma época específica, não tem data de validade, é extremamente inteligente e eqüilibrado. Não é, digamos, um texto de mulherzinha. Contudo, a quantidade de grandes obras de contemporâneos seus, ou da própria escritora, cujas adaptações cinematográficas resultaram em verdadeiros tours-de-force para o espectador por sua pobreza de tradução, pelo excesso de respeito ou pela apatia, é enorme. Este filme poderia ganhar o mesmo destino, mas a mão do diretor estreante Joe Wright expurga qualquer resquício de filme datado. Wright não é um diretor de paisagem, como James Ivory, o papa dos filmes de época, quase sempre é.

O vigor que sua direção impõe ao filme é inexplicável. Orgulho e Preconceito parece um filme moderno, apesar de ser fiel à obra original. Eu diria que é até luminoso e isso se reflete também na concepção técnica do filme, que desta vez não se limita às tradicionais categorias de arte (cenografia e figurinos). A fotografia, inquieta, cheia de travellings, câmera movimentada, jogos de luz dá imenso frescor – olha a palavra aí – para o longa. A trilha sonora é linda, no piano. E a celebrada interpretação de Keira Knightley, que realmente está encantadora, nem é a melhor do filme. Há sempre aquelas personagens periféricas pontuais (com belos momentos para Brenda Blethyn e Donald Sutherland), mas o que mais me surpreendeu foi como Matthew Macfadyen encarna com perfeição o homem romântico, com um olhar triste perpétuo, em contraponto com a efusiva personagem de Keira. Um filme que tinha tudo para dar errado, mas deu muito certo. E eu não sei bem explicar o porquê.

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[Pride & Prejudice, Joe Wright, 2005]

Comentários

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17 comentários sobre “Orgulho & Preconceito”

  1. Será que a Keira vai virar uma nova Audrey?

    Felizmente, peguei uma sessão de “Brokeback” em que ninguém riu (diferentemente de quando eu vi “Carandiru” e a sala vinha abaixo sempre que aparecia o Santoro). Mas eu ri vendo o “Brokeback… to the Future”, onde ficamos sabendo toda a verdade a respeito do relacionamento entre Marty McFly e Emmett Brown.

    Ah, a trilha de “Brokeback” não me sai da cabeça, volta e meia me pego assobiando… É a melhor coisa do filme.

  2. Olá Chico! Voltarei sim. Eu adoro filme, mas não tenho grandes propriedades para comentá-los. De toda forma, vamos dividir pontos de vistas e opiniões, não é mesmo?!!?
    Ainda não consegui ver orgulho e preconceito, provavelmente amanhã.
    E Brokeback assisti na semana passada.
    Engraçado que as pessoas aqui no RS também riram. E eu fico pensando, porque saem de casa, entram numa fila gigantesca (pque esse foi um dos filmes que teve fila na entrada), pagam ingresso, compram pipoca e refrigerante, sabendo que existiria cenas íntimas entre dois homens, para rir. Triste isso.
    Mas gostei bastante do filme, gostei do seu texto, só achei que pecaram na tradução, o que certamente deve ter dado às pessoas algumas impressões erradas.
    Um abraço

  3. Gostei também de “Orgulho e Preconceito”. Keira Knightley está bem, mas concordo com você, Matthew MacFadyen é a surpresa que quando entra, rouba a cena (a declaração de amor, todo ensopado pela chuva, é linda). Muito bem observado seu comentário sobre a fotografia, e eu diria que o filme poderia acabar com os dois alí juntos, com aquele sol dando luz por entre os braços laçados de ambos. Eu reclamaria muito de o filme não terminar aí caso ele não tivesse aquela forma bacana e descontraida nas palavras de Donald Sutherland para dar o desfecho.

  4. Eu vi no Festival do Rio e depois numa cabine para jornalistas. Não vi com o grande público, mas é de praxe que filmes com temática gay levados a sério, sem estereótipo, causem incômodo. Por sinal, uma coisa bem velha, né?

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