Hanezu
[Hanezu, Naomi Kawase, 2011]
A dramaturgia me faz falta em algumas produções de Naomi Kawase, sobretudo naquelas produzidas em digital, onde a diretora parece se desvencilhar mais ainda de uma narrativa convencional. Hanezu vem dessa linhagem de filmes, que se erguem a partir de uma câmera ultradocumental e, a partir disso, parece abrir um embate entre os limites da ficção e do documento dentro de seus longas.
Há uma porção de ideias interessantes, passando por um casamento falido, fantasmas do passado e até por um ser misterioso que mora numa caverna, mas a intenção de Kawase nunca é desenvolvê-los ou desvendá-los. Ela prefere dedicar sua atenção a filmar o cotidiano dos personagens em planos fechados, como se quisesse denunciar suas vidas como cárceres, ou a encontrar metáforas óbvias nos pássaros que às vezes acontecem mais do que as pessoas.
A Ilusão Cômica
[L’Illusion Comique, Mathieu Amalric, 2011]
Um dos mais talentosos atores dos dias de hoje, Mathieu Amalric investe cada vez mais na carreira de cineasta. Depois do interessantíssimo Turnê, em que acompanha uma trupe de showwomen, ele pilota a adaptação para a TV de um texto de Pierre Corneille, feito séculos atrás, sobre um homem à caça do filho, que não vê há dez anos.
Amalric mantém o texto original, em verso, e o transporta para os dias atuais, um trabalho de adaptação delicado porque, como o texto está intacto, é todo o resto que precisa se adaptar. No entanto, mesmo com algumas crueldades pelo meio do caminho, o filme segue tão leve que parece não se aprofundar nas questões que levanta. E o final é tão bobo que quase coloca tudo a perder.
Fora de Satã
[Hors Satan, Bruno Dumont, 2011]
O título já indica que a religião não abandonou o cinema de Bruno Dumont. Pelo contrário. A espiritualidade dá o tom deste filme de tempos mortos, o mais próximo que o diretor conseguiu chegar de seu trabalho mais celebrado, A Humanidade. O protagonista é um homem que vaga por uma terra cheia de arbustos, dunas e pântanos e que exerce um estranho poder na região, condenando culpados e exercendo curas. Dumont abusa do naturalismo: seus atores praticamente não interpretam e, na maior parte do filme, eles apenas estão se deslocando de um lugar para outro. O método do cineasta provoca incômodo, mas os mistérios dessa história fantasmagórica, de tão indecifráveis, despertam encantamento.