Desde que teve sua primeira exibição, em fevereiro de 2012, no Festival de Roterdã, na Holanda, de onde saiu vencedor do prêmio da crítica internacional, O Som ao Redor tem escrito uma história inédita no recente cinema brasileiro. História que ganha mais um importante capítulo hoje, um ano e sete meses depois, com uma merecida – aliás, merecidíssima – indicação para ser o representante oficial do Brasil na disputa pelo Oscar de filme em língua estrangeira. Não que o Oscar seja grande coisa, mas todo o universo que ele envolve joga o filme de Kleber Mendonça Filho num outro patamar.
Leia entrevista com a atriz Maeve Jinkings, de O Som ao Redor
Um feito e tanto para um filme pernambucano, produzido de forma independente, com atores em sua maioria desconhecidos do grande público, e que rejeita tanto modelos narrativos convencionais como soluções fáceis de roteiro. Em sua investigação da vida pequena numa cidade grande, herança de um sistema colonialista que está encrustrado na essência da maioria das capitais nordestinas, O Som ao Redor abre nossos ouvidos para o que está em volta e no meio de tudo. Conseguir traduzir essa voz (ou essas vozes) para o Brasil e para o mundo, sem fazer concessões, é um feito ainda maior.
O longa de Kleber Mendonça Filho apareceu na lista de dez melhores filmes do ano passado de diversas publicações estrangeiras, participou de festivais da Argentina até a Austrália, fez uma bilheteria notável para um filme sem grandes apoios, mexeu com os brios de grandes corporações, mas seu maior feito foi o boca a boca. Na época em que foi lançado nos cinemas brasileiros, não se falava em outro filme. Foi um verdadeiro fenômeno cultural. Seu maior mérito foi surgir do baú das produções independentes para a estratosfera dos filmes que rendem mesas redondas, estudos sociológicos, análises detalhistas.
Coroá-lo com uma pré-indicação ao Oscar foi arrojado. O filme talvez não tenha o perfil do que se espera dos longas geralmente selecionados para a disputa, mas o que importa não é isso. Acredito mesmo que, diante de sua aprovação internacional, o longa tenha boas chances de terminar como finalista, mas esta decisão de transformá-lo no candidato oficial do Brasil é mais do que tudo um posicionamento político que parece já premiar um filme cuja história foi construída – em sua concepção, trajetória, repercussão -, justamente por uma sucessão de atos políticos. O Brasil acerta quando quer.
Veja que outros países já selecionaram seus candidatos ao Oscar de filme estrangeiro.
O Som ao Redor certamente vai fazer bonito aos olhos de cinéfilos que como eu, ficaram atentos e curiosos para apreciar este filme “nosso”.
Que venha mais uma obra de arte brasileira!
Abraços.
Grande texto! Curto e absolutamente certeiro! Quando assisti ao filme no cinema (duas vezes, não consegui ver apenas uma vez), pensei comigo que um filme desse tamanho não poderia ficar restrito a pouca gente e a indicação ao Oscar certamente ajudara para que mais gente possa presenciar esse momento histórico do cinema nacional (daqui a uns dez anos, dizer isso sobre o filme não sera nenhum exagero), mesmo concordando com sua visão de que o Oscar é apenas a maior festa do cinema americano, e não mundial! Que mais formadores de opinião como você exaltem o som ao redor!
Excelente texto. A escolha do Brasil, de fato, indica um posicionamento político. Sinceramente, achava que eles iam acabar escolhendo “Faroeste Caboco” ou “Colegas”, ambos longas legais e simpáticos, mas que não tem a ousadia ou o nível de relevância para o Brasil atual do longa de Kleber Medonça Filho.
Ainda bem que não foi “Colegas”!
Primeiro, por que os cronistas não assinam mais seus textos?
Quem escreveu essa notícia?
Segundo, não entendo a finalidade de tentar diminuir a importância de um evento (“Não que o Oscar seja grande coisa”…) para então celebrar o filme nacional que disputará o prêmio.
Da um ar de falsa cultura, de empáfia. esse tipo de comentário.
Considerando que o Oscar é o maior evento mundial de cinema, é como falar que alguém ganhou um Nobel ou um Pulitzer e dizer “Não que esse prêmio seja grande coisa…”
Acho que o bom escritor consegue entender seu lugar no mundo, o lugar das coisas sobre as quais escreve e a necessidade de mostrar cultura sem tentar ostentar a que não tem.
Fica claro o porque de não assinarem mais as matérias.
Caro Ferreira Neto, caso você não tenha percebido, este blogue é assinado unicamente por mim. Sobre a importância do Oscar, eu adoro a festa, mas chamá-la de “o maior evento do cinema mundial” me parece meio bobo porque ela é uma festa americana em que os americanos apenas abrem espaço para alguns estrangeiros. Grande abraço.
O filme não tem teor comercial, e por isso mesmo custa a ter sua confirmação de indicado brasileiro aceita pelo telespectador médio acostumado com produções de maior orçamento. A escolha foi justa e veio só corroborar essa veia cultural que pulsa no estado de Pernambuco. Não é genial, é apenas inteligente e devidamente reconhecido.