A grande imagem de 12 Anos de Escravidão é a imagem em que Solomon Nothrup está pendurado a uma árvore e precisa se equilibrar nas pontas dos pés para se manter vivo. Ao espectador, é reservado o direito de sofrer com a angústia do protagonista, ouvindo os sons de seus gemidos e de seus dedos tentando buscar terra firme na lama. Esse momento, que acontece no meio de uma das sequências mais fortes do filme, entre a cena em que Solomon é chicoteado por um capataz ofendido e aquela em que ele é resgatado de seu destino. Não é uma imagem-chave, mas talvez seja a única em que Steve McQueen realmente se dedica a encontrar uma solução fora dos lugares comuns que predominam em seu longa.
É realmente notável, numa América de cineastas negros tão importantes, com Spike Lee como primeiro nome a ser lembrado, que tenha sido necessário que um diretor inglês tenha feito, tantos anos depois, o filme mais importante sobre a escravidão nos Estados Unidos, como tem sido saudado, e com motivos, o filme de McQueen. Na história do cinema americano, poucos filmes importantes adotaram o tema como questão central. Corrigindo: poucos filme abordaram o tema. Sejam filmes importantes, seja como assunto principal. Raízes, minissérie para a TV, parece ser a que chegou mais longe, mas sem muito requinte. O que dizer de um “gênero”, onde os maiores destaques são Amistad, Mandingo, Bem Amada e – por que não? – Django Livre.
O filme de Steve McQueen vem preencher uma lacuna inexplicável na história do cinema americano. Uma lacuna que o inglês preencheu com britânicos. Chiwetel Ejiofor e Michael Fassbender, principal colaborador do cineasta, são ingleses interpretando estadunidenses. Demérito algum para eles, vergonha talvez só para a América. A questão é que, sendo um filme sério, bem realizado em todos os aspectos, com um elenco acima da média, o trabalho de McQueen ganhou uma relevância maior do que o longa realmente merece. Para um realizador de carreira curta, apenas dois longas, mas que parecia comprometido com temas ousados, para o bem ou para o mal, 12 Anos de Escravidão parece a reciclagem de uma fórmula de drama de superação.
McQueen pareceu se enquadrar a um modelo de filme dramático feito há décadas em Hollywood. Com competência, mas com pouca personalidade. Não há qualquer ousadia na escolha dos enquadramentos, na montagem ou na direção de atores. Todos, por sinal, parecem domesticados, principalmente o protagonista Chiwetel Ejiofor, cuja interpretação “sofrida” parece conquistar muito mais pela história real de sua personagem do que por méritos próprios. Seus coadjuvantes seguem a tabela: Fassbender, o mais talentoso, tenta empregar um “estado de espírito” a seu fazendeiro, mas não encontra muito espaço para arriscar e se acomoda. Sarah Paulson, repetindo cacoetes de mulheres ricas, fortes e um tanto amorais, é mais bem sucedida, enquanto Lupita N’Yongo, estreante promissora, aposta na interpretação “força da natureza”, tem um ou duas boas cenas e para por aí.
Todos, inclusive o diretor, parecem ter se amedrontado diante do tema que resolveram trabalhar. Arriscar num assunto tão delicado poderia parecer uma afronta, então a diretriz principal foi apostar no feijão-com-arroz. Porque mesmo as comentadas cenas de violência do filme não assustam muito quem assistiu a qualquer folhetim televisivo brasileiro sobre a escravatura. Por sinal, nosso país abordou o tema com bem mais propriedade do que o cinema americano. As chicotadas nos personagens de 12 Anos de Escravidão só parecem mais dolorosas porque nunca foram vistas num cinema de estirpe de Hollywood. E o comodismo de McQueen em fazer um filme “à moda antiga” perde mais ainda quando entra em cena o produtor do longa, Brad Pitt, cujo papel é de uma obviedade impressionante. Inclusive nas conexões com o mercado. É o personagem de Pitt que encaminha Solomon Northup para seu destino final. Foi justamente o apoio de Pitt que fez possível o longa de McQueen.
12 Anos de Escravidão
[12 Years a Slave, Steve McQueen, 2013]
Ultimo filme do Oscar que assiti foi justamente o vencedor. Com certeza o filme ganhou não só o Oscar mas o mundo pelo assunto e não pela forma. Parece um filme feito em cima de uma estrutura pré fabricada, tipo modelo padrão com algumas cenas fora da caixinha e estas ficam na memória, no todo é um bom filme, nada mais que isso, dúvido que vão lembrar dele como um filme e não como o filme que tem aquela cena lá da chicotada.
De fato, um filme bemmm careta. Nada surpreende. Decepção.
Discordo da resenha. Lupita foi excelente e merece o oscar, assim como Chiwetel Ejiofor e Fassbander.
Realmente, para quem cresceu assistindo às novelas de época da Globo, “12 Anos de Escravidão” não é nenhuma novidade. Eu também fiquei impressionado como quão convencional é o filme, estava esperando uma outra abordagem vinda do mesmo diretor de “Shame” e “Hunger”. Me lembrou o David Lynch dirigindo “Homem Elefante”, um diretor mais experimental num filme esquemático de superação. O destaque do elenco pra mim foi o Chiwetel Ejiofor, numa interpretação mais econômica. Não fui envolvido por Lupita, achei uma interpretação um tanto acima do tom.
O Fassbander é alemão e não britânico.
O filme realmente traz muitas cenas incômodas. Pra alguém leigo em filmes deste gênero (como eu) após assistir o filme ainda fiquei 2 dias pensando em todo aquele sofrimento, fiquei sensivelmente abalado com as cenas; que acredito que deve ter sido pior que no próprio filme. A cena mais chocante foi a cena em que Lupita N’Yongo leva chicotada nua presa á um tronco, achei a cena MUITO PESADA! foi difícil ver a cena do chicote cortando a pele dela com o sangue espirando. Acredito que ele será o vencedor da noite.