Trapaça é, junto com Gravidade, o filme com o maior número de indicações ao Oscar. São dez, que incluem tanto as principais (filme, direção e roteiro), as de elenco (quatro) e as técnicas (montagem, desenho de produção e figurinos). Com um currículo como este, o filme de David O. Russell se iguala em número de indicações a clássicos como Lawrence da Arábia e O Poderoso Chefão. É para tanto? O que longa de David O. Russell realmente representa na corrida deste ano: é um favorito, seria um azarão ou uma tentativa da temporada de prêmios de construir um placebo para tumultuar a disputa?
A verdade é que Trapaça parece ser uma ameaça em quase todas as categorias, mas não é favorito em nenhuma e pode terminar a noite de domingo como um dos maiores perdedores da história do Oscar. Assim como o filme anterior de O. Russell, Trapaça foi revelado ao mundo pouco antes da temporada de prêmio começar, causou rebuliço por ser um filme de época, ter vários nomes famosos no cast e parecer uma boa aposta em vários quesitos do Oscar, mas, pouco antes dos prêmios dos críticos começarem a ser revelados, o filme já estava meio em baixa nas apostas, saindo dos prognósticos de alguns sites dedicados ao assunto, o que mudou quando a prestigiada New York Film Critics Association abriu a temporada, chamando-o de melhor filme do ano.
Vieram outras indicações e o trabalho de O. Russell estava espalhado por todo lugar, mas o Screen Actors Guild deu um baque nas pretensões, ao ignorar Christian Bale e Amy Adams entre os melhores protagonistas. Quando os prêmios começaram a sair quase nada sobrou para o filme, a não ser que ele fosse relegado à categoria de comédia, onde levou dois Globos de Ouro, além do que foi para as mãos de Jennifer Lawrence, que sempre se apresentou como uma das preferidas para ganhar o prêmio de atriz coadjuvante. Quando o quesito misturava misturava dramas e comédias, os jornalistas estrangeiros em Hollywood escolhiam outro filme, caso de Ela, que venceu em roteiro, categoria em que Trapaça era favorito.
As dez indicações ao Oscar reativaram o burburinho sobre as chances do filme ganhar em várias categorias. Bale, Adams, Lawrence e Bradley Cooper conseguiram ser finalistas, fazendo com que O. Russell conseguisse indicar quatro de seus atores em dois anos consecutivos, mas Trapaça falhou bem onde seria um franco favorito, a categoria de maquiagem (agora “maquiagem e cabelos”). Mas a verdade é que, mesmo indicado em dez categorias, existe uma possibilidade forte de que ele saia da festa de domingo com as mãos abanando. Vamos analisar as chances do filme em todas suas indicações, começando com aquela onde mais se aposta nele: melhor atriz coadjuvante.
Uma vitória de JLaw, que na teoria seria um dos prêmios mais fáceis para o filme, poderia ser um miniescândalo. Na história do Oscar, só cinco intérpretes ganharam por dois anos consecutivos – Luise Rainer, Spencer Tracy, Katharine Hepburn, Jason Robards e Tom Hanks – e, na maioria dos casos, ou eles eram lenda vivas, ou estavam em situações muito específicas, como quando Hanks apareceu com um irresistível Forrest Gump um ano depois de ganhar um Oscar político. O fato é que Jennifer Lawrence, aos 23 anos, não parece ter esse cacife todo para convencer a Academia a premiá-la de novo um ano depois. E os votantes têm opções: a estreante Lupita N’Yongo, que aumentaria o leque de prêmios de 12 Anos de Escravidão, seria a primeira. Ou os votantes podem usar a categoria – e não seria a primeira vez – para eleger uma veterana até então desconhecida (June Squibb, de Nebraska) ou uma coadjuvante de prestígio (Sally Hawkins, Blue Jasmine).
Quando Amy Adams apareceu na lista de atrizes, derrubando Emma Thompson, que todo mundo dava como concorrente certa por Walt nos Bastidores de Mary Poppins, logo começou a se falar que ela poderia derrubar o favoritismo de Cate Blanchett. Mas quais as chances de uma atriz que não foi sequer indicada ao prêmio do Screen Actors Guild, o sindicato dos atores, vencer o Oscar. Sindicato e Academia divergem muitas vezes, mas desde que foi criado o prêmio todas as vencedoras da categoria no Oscar foram pelo menos indicadas ao SAG. No mais, Blanchett foi elogiadíssima, ganhou todos os prêmios que pode, e não sofreu o mínimo abalo com as acusações que seu diretor, Woody Allen, recebeu de que teria abusado da filha, o que poderia manchar suas chances. Blanchett continua favorita e Adams está mais para um azarão, diferente de Christian Bale e Bradley Cooper, que têm chances zero de ganhar como ator e ator coadjuvante, respectivamente.
Na categoria de direção de arte, um dos trunfos do filme, Trapaça teria que passar por O Grande Gatsby, Gravidade e Ela, três vencedores dos prêmios do sindicato, além de 12 Anos de Escravidão, principal candidato a melhor filme. Bem difícil. No quesito de figurinos, em que tem mais chances, teria que derrubar o favoritismo de Gatsby e a possibilidade da Academia usar a categoria para aumentar o número de prêmios de 12 Anos. Em outros anos, o prêmio de montagem poderia ser uma aposta, ainda mais quando o longa ganhou um prêmio do sindicato, mas Trapaça só ganhou no sindicato porque foi eleito entre as comédias. É muito mais provável que Capitão Phillips, premiado pelos montadores como melhor edição de drama, divida as atenções com Gravidade, um filme onde a montagem é bem mais visível.
As maiores chances de Trapaça estariam então na categoria de melhor roteiro original, mas depois que Ela ganhou tanto o Globo de Ouro quanto o prêmio do sindicato dos roteiristas, é difícil imaginar que o Oscar vá por outro caminho, a não ser que resolva consagrar o filme. O Bafta preferiu o longa de O. Russell, nunca se sabe. Mesmo assim, a disputa não influencia na categoria de direção, onde o embate promete ficar restrito a Alfonso Cuarón, que ganhou tudo, e Steve McQueen, diretor do filme que tem todas as chances de ganhar a categoria principal. Por sinal, é em melhor filme que Trapaça pode ser chamado de azarão. Pode ser uma opção à briga entre 12 Anos de Escravidão e Gravidade, pode ser um filme mais americano para a disputa, pode ser uma aposta num filme com muitas indicações.
Para ganhar em melhor filme, Trapaça precisaria de uma conjunção de fatores. Se premiar o filme em atriz coadjuvante, a Academia mostra que gosta mesmo dele. Se escolhê-lo também em figurinos, reforça bem essa ideia, e, caso o eleja em montagem, transforma Trapaça num favorito. Um favorito isolado se o filme também ganhasse em roteiro original. Mas a maré não parece muito disposta a levar o filme de O. Russell para o palco não. Em todas as categorias em que ele teria mais possibilidades de vitória, há um empecilho bastante razoável para a vitória do filme. Trapaça corre um sério risco de voltar da festa com dez indicações e dez derrotas, empatando com Gangues de Nova York e Bravura Indômita, perdendo apenas para Momento de Decisão e A Cor Púrpura.
Esse filme me lembrou muito Jackie Brown do Tarantino. Trapaceiros que são pegos armam um plano mirabolante e no final feliz enganam tanto a polícia quanto os bandidos. A diferença é que Trapaça é ruim. Tarantino neles!
Achei TRAPAÇA um filme bem medíocre para ter o número de indicações ao Oscar. Não me surpreendeu em nada não ter ganho uma estatueta sequer, mesmo com JLaw brilhando. O que mais me deixou impressionado foi NEBRASKA não ter ganho nada. Isso sim foi uma tremenda injustiça!
Tomara que saia de mãos abanando mesmo! mais o Oscar que não quero que “Trapaça” ganhe de jeito nenhum é o de Roteiro Original que tem que ir pro merecedor: “Her”. espero que por ser um filme com mais indicações e mais visto, ele não venha a fazer trapaça nessa categoria.
Espero que “Trapaça” realmente saia de mãos abanando! Até torceria pela Jennifer Lawrence se ela já não tivesse uma questionável vitória. Bradley Cooper não tinha nada que estar aí! Achei a montagem do filme problemática, tentou reproduzir a edição dos filmes do Scorsese, mas na minha opinião não teve sucesso. Não quero nem cogitar a hipótese de uma vitória em roteiro, batendo “Ela” e “Nebraska”, seria um total absurdo. David O. Russell pode ser considerado o diretor mais superestimado dos últimos tempos, nos últimos 4 anos seus filmes acumularam 25 (!) indicações. Acho que nessa edição do Oscar, “Trapaça” é o melhor exemplo das indicações por associação às quais você se referiu em outro artigo.
Vale lembrar que ano passado você apostou até o último minuto na atriz de Amor para o prêmio de melhor atriz e, no fim das contas, quem acabou ganhando foi a Jennifer Lawrence. Quem sabe esse ano não acontece o mesmo com Cate Blanchett e Amy Adams?
A situação é diferente, Guilherme. Amy não tem 50 anos de cinema e seu papel não é tão Oscar bait, assim. E Blanchett é uma favorita fechada, não como JLaw ano passado.