A ESTRANHA FAMÍLIA DE IGBY
Os vícios do cinema independente norte-americano podem ser quase todos encontrados em A Estranha Família de Igby. É evidente o esforço do diretor e roteirista estreante Burr Steers em reforçar o lado esquisito de seu filme em cada cena. A história da família do personagem de (um cada vez melhor) Kieran Culkin parece ter um único objetivo: deixar óbvia a hipocrisia de uma classe social de aparências, o que rendeu pelo menos um fã apaixonado, Almir de Freitas, da revista Bravo, que ficou assumidamente revoltado com a recepção fria que o filme recebeu da crítica. Almir afirma que os críticos que criticam Igby não estariam preparados para ver tamanha franqueza. Mas o que há, na verdade, no filme de Steers é uma ingenuidade quase adolescente.
A Estranha Família de Igby quer mostrar a decadência da família como instituição (ou seja, tem um objetivo prático, sério), mas, para isso, apela – muitas vezes – para a farsa, o que o deixa incoerente. Os personagens agem como se estivessem numa comédia nonsense, como Depois de Horas (85), de Martin Scorsese (por sinal, um filme muito bom). A culpa não é dos atores. Todos eles adotam a coerência do roteiro de Steers e têm bons desempenhos. Em não raros casos, desempenhos muito bons. O problema é que tudo soa tão artificial que, caso o filme não tivesse um objetivo sério, seria uma excelente e inteligente diversão.
Kieran Culkin atua com um sarcasmo e uma ironia flagrados antes em grandes atores. É doce e amargo, sem nunca perder o molejo. Ryan Philippe, que desde Assassinato em Gosford Park (01), tem revelado um crescente talento dramático, faz um contraponto perfeito. Amanda Peet e Claire Danes, entre altos e baixos, mantêm a dignidade de seus papéis. Bill Pullman, num papel pequeno, é o grande destaque, sobretudo na excelente cena do banheiro, ao lado de Rory Culkin. Quem sofre com o texto é Susan Sarandon, que recebe um papel tão caricato – e com tanta necessidade de parecer esquisito -, que é impossível extrair dele uma boa atuação.
Igby tem quase tudo para se fazer um bom filme, mas, ao refutar os lugares comuns das grandes críticas à high society, Burr Steers abraça idéias tão desconexas que desperdiça um bom plot e muitos bons atores. As idéias são o problema em Igby. Elas são muitas, mas quase nunca funcionam.
A Estranha Família de Igby
Igby Goes Down, EUA, 2002.
Direção e Roteiro:Burr Steers.
Elenco: Kieran Culkin, Claire Danes, Jeff Goldblum, Jared Harris, Amanda Peet, Ryan Phillippe, Bill Pullman, Susan Sarandon, Rory Culkin, Peter Anthony Tambakis, Bill Irwin, Kathleen Gati, Gannon Forrester, Celia Weston, Elizabeth Jagger, Nicholas Wyman, Gore Vidal.
Produção: Lisa Tornell e Marco Weber. Fotografia: Wedigo von Schultzendorff. Edição: William M. Anderson, Robert Frazen e Padraic McKinley. Direção de Arte: Kevin Thompson. Música: Uwe Fahrenkrog Petersen. Figurinos: Sarah Edwards.