A História da Eternidade

As mesas de almoço são fartas em A História da Eternidade. O sertão do filme de Camilo Cavalcante é tão árido quantos os outros sertões da ficção, mas não é a fome ou a miséria que está em questão. O longa fala de um certo peso ancestral que cai sobre os ombros dos moradores dos confins do Nordeste brasileiro. Nesse sentido, o diretor traz uma visão um tanto mística sobre essas pessoas, como se elas fossem condenadas pelo destino, amaldiçoadas pela inevitabilidade da tragédia. Não por acaso, as três protagonistas das histórias entrelaçadas que costuram o filme são mulheres, o que acentua sua sina de sofrimento.

Cada uma começa o filme com um martírio: Querência enfrenta a perda; Das Dores encara a solidão; Alfonsina padece com a falta de perspectivas. No decorrer de duas horas, Cavalcante irá ajudar a escrever o destino destas três mulheres, incorporando fatalidades recorrentes ao microcosmo sertanejo, fantasmas que assombram este povo geração atrás de geração. É verdade que o diretor abusa de uma poesia calculada em vários momentos do filme. A personagem de Irandhir Santos estrela vários deles e parece uma figura improvável naquele contexto de conhecimento limitado. Mas os excessos do papel e do próprio filme ajudam a entregar algumas cenas memoráveis, como a bela recriação de “Fala”, dos Secos & Molhados. Uma epifania em meio a uma história com os pés no chão.

Talvez os abusos de Cavalcante, um estreante em longas-metragens que traz uma nova perspectiva ao prolífico cinema pernambucano, talvez estes abusos sejam exatamente isso, epifanias, momentos de liberdade poética extremos no meio de um filme tão fatalista. Por isso mesmo, o excesso parece encontrar um espaço adequado nessa reflexão sobre a “Grande Tragédia do Sertão”. Não bastasse, Camilo Cavalcante cria uma lindíssima cena final. Uma cena em que declara seu carinho pelas três personagens principais, curando Querência, confortando Das Dores e libertando Alfonsina.

A História da Eternidade EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha½
[A História da Eternidade, Camilo Cavalcante, 2014]

Comentários

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2 comentários sobre “A História da Eternidade”

  1. O filme é lindo. A cena da “visão do mar” é um espetáculo: a arte cria o que materialmente não se pode. Neste contexto, fazer sonhar (dar asas ao desejo) é perigoso, mas necessário.

  2. Adoro o filme, concordo com o que foi dito sobre alguns excessos, mas o desempenho de Zezita Matos me arrebatou demais!

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