O mundo provavelmente será muito injusto com Amantes. E a culpa é justamente de seu protagonista. A entrevista de Joaquin Phoenix a David Letterman, em que o ator – em estado estranhíssimo, grotescamente barbado – afirma que deixará o cinema para se dedicar ao rap, é um dos maiores hits dos últimos meses, mas, verdade ou mentira, ofereceu uma visibilidade torta ao filme porque ganhou ares de piada e contornos de trapaça. E isso é tudo o que o cinema de James Gray não é. E essa é toda a atenção que Amantes não precisa.
Gray talvez seja o cineasta que mais me lembra John Cassavetes hoje em dia. É difícil dizer sobre o quê exatamente são seus filmes. Os nós da vida, talvez. Amantes não é diferente. Embora o título ofereça uma expectativa direta, Gray não tem intenção alguma de levá-la a cabo e trabalha com sua própria velocidade, num trabalho completamente particular de composição de cenas, quase todas anti-climáticas, como o primeiro encontro entre Joaquin Phoenix e Gwyneth Paltrow. Mesmo assim, em nenhum momento, o filme não deixa de mostrar o cineasta romântico de Os Donos da Noite.
O romantismo de Gray está não no objeto, mas no caminho até ele. Quando filma seus personagens em Amantes, o cineasta mais nos confunde sobre suas intenções e comportamentos do que nos dá informações sobre eles, tanto na maneira de jogá-los no mundo – há momentos em que a câmera parece ter vida própria, ultrapassando o puro recorte – quanto na de registrar seus afetos. É dessa maneira que todos ganham uma humanização raríssima no cinema de hoje em dia. É difícil defini-los, muito menos julgá-los ou culpá-los, mas entendê-los, por outro lado, torna-se uma arte mais fácil.
Quando Leonard diz que ama Michelle, ele está provavelmente sendo tão sincero como quando beija Sandra pela primeira vez porque nada é tão simples assim nos filmes de Gray. Leonard, de certa forma, catalisa a complexidade de como o diretor enxerga o mundo. Embora nunca se afaste das vizinhanças, o personagem vaga pelo mundo após ser tirado do prumo e se dedica agora a buscar trilhos mais uma vez. Joaquin Phoenix, o mesmo culpado por toda a publicidade equivocada para o filme, é, no entanto, o maior suporte de Gray. Sem ele, Leonard provavelmente não seria tão complexo, tão bipolar no melhor sentido do termo. É a interpretação Phoenix que dá estofo a Leonard e que faz Amantes ser o filme gigante que é.
Amantes
[Two Lovers, James Gray, 2008]
O desfecho, eu acho genial. Me lembra, de certa forma, o desfecho de “Marcas da Violência”, do Cronenberg.
É outra obra-prima. Agora são 4. E quando lembra Cassavetes, está coberto de razão. O que são aquelas cenas no alto do prédio, Chico? Coisa linda.
Eu vi o filme há um mês, acho, e ainda não consigo tirar aquele desfecho da cabeça.
Abraços.
Espero bastante desse filme, e desconfio que vá gostar muito: adorei Os Donos da Noite, e me empolguei bastante vendo o trailer de Two Lovers (gostei do título em português).
Nossa, não acredito que o Two Loves recebeu o mesmo título do filme do Cassavetes…
Ótimo, e parabéns pelo texto!
Marcus, a previsão é dia 24 de abril.
Tem previsão de estréia? Muito ansioso por este.
Eu acho a melhor atuação da carreira do Joaquin, de longe!
Gosto muito do Joaquin Phoenix, pena ele ter ficado meio doidão e desistido do cinema. Acho que ele tem uma intensidade, principalmente no olhar, que poucos atores tem.
Abraço
ja saiu os indicados da academia brasileira de cinema,
http://www.academiabrasileiradecinema.com.br
postem alguma coisa