A tragédia que se abateu hoje sobre o cineasta Eduardo Coutinho foi uma das notícias mais chocantes que o cinema brasileiro recebeu nos últimos muitos anos. Primeiro porque, confirmada a versão de que o diretor, um dos maiores da história do país, sem medo de cair no exagero, teria sido morto pelo próprio filho, já carrega desastre suficiente. Segundo porque Coutinho reencontrou sua melhor fase de produção nas últimas duas décadas, entregando filmes cada vez mais inspiradores, mesmo chegando aos 81 anos. Terceiro porque esta tragédia familiar dialoga com tantas tragédias familiares registradas pelo diretor ao longo de seus filmes. A tragédia dos personagens de Cabra Marcado para Morrer, dos moradores do Edifício Master ou do morro de Babilônia 2000, sem falar nas tragédias das mulheres, verdadeiras ou não, da obra-prima do cineasta, Jogo de Cena.
Difícil falar sobre Coutinho sem se emocionar com seu olhar para o homem. Sua maneira de intervir na entrevista, de interagir com o entrevistado que sempre se sentia em frente a um velho amigo, era seu maior diferencial. O cineasta se aproxima de cada pessoa com um olhar crítico, mas apaixonado. Ele tinha talento para humanizar aqueles que outros cineastas tratariam como vilões, como o síndico do Edifício Master, aquele que começava “com Piaget, depois usava Pinochet”. Começou no cinema, no início dos anos 60, chegou a dirigir longas de ficção, mas teve que interromper um de seus maiores filmes, Cabra Marcado para Morrer, que retomou apenas 20 anos mais tarde, uma década depois de escrever seu nome na história do telejornalismo brasileiro no Globo Repórter. No programa, (re)descobriu seu talento para o documentário. E voltou a se dedicar só ao cinema.
Seu registro do humano alcançou seu ápice em 2007, quando lançou Jogo de Cena. No filme, Coutinho subverte a própria lógica de seu cinema, de deixar os personagens registrarem sua história em seus depoimentos, para lançar um ensaio sobre a representação. Coutinho estabeleceu um paralelo impressionante entre as mulheres de verdade e as atrizes de verdade. Quando Andréa Beltrão não segura as lágrimas ao ‘interpretar’ uma mulher que não chora, é praticamente impossível não se comover. Mas, além da comparação, há a investigação. As atrizes são entrevistadas em seguida sobre o processo de ‘tradução’ das personagens. E quando você acha que não poderia haver mais, Coutinho nos aplica um golpe final: a mais triste das histórias se transforma em interpretação e uma personagem real surge para provar que as aparências enganam mesmo. Gostaríamos nós de que a tragédia de hoje não passasse de um ficção, que os protagonistas mudassem, que a vida real fosse tão demasiadamente humana quanto nos filmes de Eduardo Coutinho.
Veja também:
– Quando Eu Era Vivo, com Sandy Leah
– Top 100 filmes favoritos
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muit bom o blog, adorei!!
Valeu!
Que dia triste para o Brasil e o mundo!!!!!!!!! Sua morte é o documentário que nunca queria ver…
Muita saudade!
Que tristeza… na intimidade de seu lar, Coutinho guardava a maior de todas suas historias… sua relacao com o filho esquizofrenico… talvez o mais belo, quase certamente o mais dificil, de todos depoimentos que nunca foram feitos… mas quis o destino assim, tal qual nem os Deuses planejariam… veio a publico da maneira mais tragica, numa ensolarada manha de domingo… que drama a todos nos brasileiros, nao mereciamos isso… Eduardo va em paz, nos fez mais humanos, mais proximos…
Faço minhas as suas palavras Antonio, um homem de tantas histórias e que certamente tinha na sua um grande drama, que vem a nós de maneira tão cruel, conviver com a esquizofrenia é um desafio. que ele descanse em paz.
Que dia! Acesso a internet e dou de cara com a notícia da morte do Philip Seymour Hoffman e logo depois com a chocante morte do Eduardo Coutinho. Realmente muito triste!
Triste demais.