Harry Potter e o Cálice de Fogo

O que não muda nos livros ou filmes de Harry Potter talvez seja o que mais cative na obra de J. K. Rowling. Além da magia, dos seres mitológicos, de todo o universo fantástico que circula a escola de Hogwarts, existe a história de um garoto crescendo. Pode ser, e é, muito clichê se debruçar sobre isso (tanto que praticamente tudo o que se escreve sobre este ou sobre o último filmes passa pela supresa em encontrar personagens mais maduras e uma história menos infantil. Surpresa?), mas é exatamente este o trunfo de Harry Potter. Seus dramas e os de seus amigos são de verdade. Identificação.

Primeiro, temos Harry. Ora, Harry é o Superman – ou alguém não percebeu? Ele é o cara íntegro, deslocado da família, cheio de poderes, mas mesmo inocente, completamente responsável no uso deles. Um mauricinho para muita gente já que ele é tão certinho que não comete faltas muito graves. Mas Harry tem, mal comparando, o mesmo peso que o Superman tem. Ele precisa ser certo porque, quer ele queira ou não, ele é o exemplo, uma espécie de líder natural. E ao mesmo tempo, Harry é uma criança. Ou melhor: um adolescente… crescendo, descobrindo o mundo. Claro que o mundo de Harry é bem mais legal do que o dos adolescentes da idade dele. Ele voa e há dragões. E há a magia. E Harry, como o Superman que é, precisa liderar, estar à frente, ser herói. E ainda ser criança, ser adolescente, descobrir como se convida a garota que ele achou bonita para ir ao baile. A vida de Harry não é fácil.

Tem também o Ronnie. Ronnie não é um herói ao contrário do Harry. Ronnie é o melhor amigo. É aquele que sempre estará lá, mesmo que não queira. Melhores amigos, ninguém escolhe. Eles aparecem e assumem seu posto. Ronnie é o Jimmy Olsen do Superman Harry Potter. Ele guarda os segredos de seu amigo-herói, garante a retaguarda, é a segurança, mesmo sendo um adolescente quase assustado, inseguro, careteiro. Segurança nem sempre se define com alguém que bate quando o inimigo se aproxima. Ronnie é porto. Acolhedor. O Harry precisa dele porque Ronnie é praticamente a família dele. E Ronnie, além dessa cansativa função de melhor amigo, é também um adolescente. Ele também precisa ter coragem para chamar uma garota para o baile. Talvez tenha medo de chamar a garota certa. Talvez ainda não saiba muito bem. Ora, é difícil – e muito – ser adolescente.

E tem Hermione. Inteligente, completamente hábil em suas especialidades, espertíssima, quase uma estrategista. Numa história com Supermans e Jimmy Olsens, Hermione não tinha muito o que fazer a não ser ser uma Lois Lane. Forte, decidida, impulsiva, provavelmente sagitariana, briguenta, resmungona, ela nunca se dá por vencida. E se Ronnie é o abraço de Harry, Hermione é seu escudo. É aquela que sempre estará lá para ajudar a resolver a questão. Um fardo grande para uma garotinha. Aliás, para uma jovem. Hermione, além de segunda melhor amiga, também está crescendo, também quer que o menino certo (embora ela mesma não esteja tão certa assim) a convide para o baile. Ela quer estar linda porque as adolescentes sempre querem muito estar lindas (quando não se vestem de preto e ouvem Black Sabbath – tá, estas também querem). Hermione está crescendo também. Ela pode enfeitiçar ogros e retirar encantos, mas imagine como deve ser complicado demonstrar interesse por um garoto da sua idade!

 

O Prisioneiro de Azkaban, o filme, era sobre Harry, Ronnie e Hermione. Três amigos aprendendo a lidar com o mundo, começando a entender o que é deixar de ser criança. O filme de Alfonso Cuarón mudava completamente o foco da trama, que deixava de ser a história de três garotos numa escola de magia e passava a ser a história de três garotos. Quase não havia cenas sem um dos três protagonistas. Na verdade, quase não havia cenas com qualquer fala importante que não viesse de um dos três. Como não havia um torneiozinho para garantir a glória eterna ou um daqueles esquemáticos “trabalhos de Hércules” que resolviam a trama nos primeiros livros/filmes, o foco pode ser voltado para as personagens. Cuarón pôde desenvolvê-las, explicá-las melhor aos espectadores.

Em O Cálice de Fogo, Mike Newell devolve o caráter mais amplo à série, inclusive porque a história pedia isso. É obviamente delicioso – mais uma vez – acompanhar Harry nos mirabolantes desafios mágicos do torneio que virou a espinha dorsal do longa. Há inclusive uma cena maravilhosa, debaixo d’água, quando descobrimos quais os tesouros que Harry tem que recuperar numa das provas. Mas com tanta historinha para contar e um vilão para fazer ressurgir – por sinal, Ralph Fiennes, assustador, ótima escolha – os protagonistas não ganharam um tratamento mais dedicado, o que era o maior trunfo do filme anterior. Sim, há todo o dilema do baile, que nos coloca a par dos pontos fracos de nossos heróis e que é um capítulo à parte no seu crescimento, mas parece pouco perto do que foi apresentado antes.

Eu, provavelmente, nunca vou deixar de gostar de um filme ou de um livro de Harry Potter. Não que eu seja um grande fã, que eu tenha aquele vício de comprar e ler tudo relacionado à personagem. Não. Provavelmente eu nunca vou deixar de gostar de um filme ou de um livro de Harry Potter porque ele conversa comigo. Talvez minha infância seja mal resolvida – geralmente acham isso de quem coleciona bonecos de super-heróis – mas eu, nunca avaliação bem pessoal e, por isso mesmo, parcial acredito que o material é muito bom, as personagens são muito reais, as situações são de verdade. E acompanhar as histórias de três pessoas crescendo, virando adultas, descobrindo como devem reagir ao que a vida traz, é uma coisa verdadeiramente muito prazerosa para mim. Ver Neville Longbottom perder o medo e aparecer acompanhado no baile foi muito importante para mim. Eu fiquei orgulhoso.

Harry Potter e o Cálice de Fogo EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha
[Harry Potter and the Goblet of Fire, Mike Newell, 2005]

Comentários

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18 comentários sobre “Harry Potter e o Cálice de Fogo”

  1. Tem polêmica?

    Marcelo, eu sempre quis fazer essa mudança dos links lá pra baixo. Mas realmente não sabia como. Na verdade, nunca tinha tentado. Mas seu comentário me animou. Fui na “mão grande”, link a link e mudei tudo. Aproveitei e recauchutei a coluna do lado. Ainda aceito sugestões.

  2. Achei bem melhor.

    Devo ver o “…Potter” amanhã. Não estou exatamente animado, não sou fã da série (ainda não vi o segundo filme, e só vi o terceiro porque estava acompanhado de uma ávida e bela fã), provavelmente nunca lerei os livros (a não ser para uma criança), mas a polêmica toda em torno quase me obriga a vê-lo.

  3. impressionante como eu nunca gostei dos filmes e muito menos dos livros do Harry Potter. Eu até tentei ler e relevar algumas coisas. Mas, no final das contas, sempre acabo assistindo aos filmes -nem que seja um mês depois.
    Se cuida Chiquitito… em breve te mando aquele negócio, ok?

  4. Perdi algumas horas dando uma recauchutada nos links e na arrumação deste blogue. Os filmes comentados agora estão lá no fim de tudo (atualizados com os filmes dos últimos meses que ganharm textos maiores).

    Ainda preciso republicar posts do antigo endereço, há muito capturado e ainda sob a forma de rascunho.

    Cortei links de blogues que não são mais atualizados (ainda preciso linkar outros) e deletei umas bobagens, reordenei outras na barra ao lado.

    Me digam o que vocês acham.

  5. Ficaram legais as mudanças.
    Eu ainda cortaria as setinhas ao lado das datas, os quadradinhos cinzas e as bolinhas azuis.
    Ah, pensei que você ia colocar o item últimos posts antes dos melhores 2005.
    Em relação a essa lista melhores, também seria legal converter os nomes em links para os respectivos textos.

  6. Harry Potter e seu amigos deram vassouradas e varinhadas em meus testículos cerebrais durante duas horas e meia sem parar. Até tomar injeção é mais divertido do que ver este filme!

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