Julianne Moore, Dennis Haysbert, Dennis Quaid, Patricia Clarkson
Cada homem guarda um segredo. O segredo de Frank Whitaker é que ele nunca amou ninguém de verdade. Quando ele finalmente descobre seu primeiro amor, já é tarde. Frank está casado com uma esposa adorável, tem dois filhos educados, mora numa bela casa num belo bairro de uma bela cidade, tem um ótimo emprego. Sua vida supera o sonho de qualquer homem comum, sua vida é o próprio sonho americano. A vida de Frank apenas não é suficiente para ele mesmo, que tenta seguir feliz, mas termina mergulhado na angústia de viver o que não é. Angústia que sufoca seu peito e explode pela garganta e que move Longe do Paraíso.

Frank vive nos anos 50, aqueles em que roteiristas e diretores de cinema foram perseguidos por serem comunistas. Muitos nem eram. Na época em que ele vive, não há espaço para relacionamentos entre brancos e negros. A convivência é harmoniosa, mas algo como apertar mãos era improvável e inaceitável. Cathy, a esposa de Frank, é uma pessoa quase perfeita. Mulher bonita, esposa dedicada, mãe cuidadosa, cidadã exemplar. Ela tem poucos preconceitos. Conversa muito com seu jardineiro negro. Para ela, não existe desigualdade. Para os outros, existe.

Cathy é tão pura que, ao flagrar seu marido com um novo amor, o perdoa e tenta fazer de tudo para ajudá-lo a cessar sua triste sina de busca por algo proibido. Continua carinhosa, educada, elegante, mas percebe que sua doce vida tinha a mesma consistência de um sonho. Cathy guarda as coisas para dentro de si. Ela explode para dentro. Nem a melhor amiga consegue quebrar a barreira que ela cria para preservar sua vida, sua privacidade, sua história disfarçadamente perfeita. Cathy, assim como Frank, conversa apenas consigo mesma. Nem percebe, mas vive de aparências. Quando seu mundo colorido começa a rachar, procura alento numa possibilidade de carinho difícil de alcançar com plenitude.

Todd Haynes é um diretor imprevisível. Veneno (91), A Salvo (95) e Velvet Goldmine (98) são filmes muito diferentes entre si, mas guardam semelhanças. Seus personagens são solitários. De uma forma ou de outra. Em Longe do Paraíso, Frank e Cathy não fogem á regra. Gostam um do outro, vivem bem, mas se contentam com pouco. Dennis Quaid, um ator que nunca demonstrou talento especial, toma para si um dos papéis mais difíceis do recente cinema norte-americano. Difícil de sair do clichê, mas Quaid o faz com muita competência.

Do outro lado, está Julianne Moore, a melhor atriz dos dias de hoje. Aqui, ela interpreta com os olhos, com a boca, com as mãos. Não existe muito que falar. Cathy, sua personagem, fala pouco. Julianne consegue o improvável: sua atuação é intensa e discreta. Não rouba a atenção do filme, apesar de ser sua mola propulsora. Julianne Moore está nas árvores coloridas pela esplêndida fotografia, na classe da direção de arte e dos figurinos, na consistência de uma das melhores trilhas sonoras do ano. Ou dos últimos anos. Os tons de sua atuação são tão diversos quanto as cores do filme.

As pessoas cobram muito que as coisas aconteçam em Longe do Paraíso. pouca gente entende que o filme é sobre coisas que não acontecem. Com sutileza, Todd Haynes mostra como as pessoas falham, como a idéia de uma vida feliz é frágil, como tudo pode ter a consistência de um sonho. Um sonho americano.

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[Far From Heaven, Todd Haynes, 2002]

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