[mostra de cinema de são paulo – boletim três]
[eu não quero dormir sozinho ]
direção: Tsai Ming-Liang.
I Don’t Want to Sleep Alone, 2006. De certa forma, tudo o que o diretor sempre fez está aqui mais uma vez. O cinema de Tsai Ming-Liang se reafirma como um cinema do solitário em busca de companhia e de um canto. E falar sobre solidão demanda o silêncio caro aos filmes orientais na mesma medida em que ocupa vazios. O cineasta os preenche com imagens milimetricamente calculadas e, na maioria das vezes, acertadas.
Com Lee Kang-Sheng, Chen Siang-Chyi, Norman Bin Atun.
[a promessa ]
direção: Chen Kaige.
The Promise, 2005. Maldito o dia em que os chineses descobriram os efeitos especiais. Chen Kaige provavelmente virou Herói, de Zhang Yimou, e pensou: “eu posso fazer mais”. Fez, sim: um filme que completamente artificial, que parece querer devorar o título de mais lindo do mundo, mas não passa de um espetáculo com imagens de gosto duvidoso, que viraram lugar comum, e uma tentativa barata de transformar tudo em poesia. Que música horrorosa!
Com Hiroyuki Sanada, Jang Dong-Gun, Cecilia Cheung, Nicholas Tse, Liu Yeh, Chen Hong.
[mary ]
direção: Abel Ferrara.
Mary, 2005. O filme de Abel Ferrara é complementar a Um Filme Falado (Manoel de Oliveira, 2003), enquanto observação sobre religião e sobre a violência como conseqüência de um desejo, ou uma necessidade, quase sobre-humano de impor sua fé. Ferrara discursa sobre intolerância sem levantar a voz, mas com efeitos explosivos. Cresce a galope na memória como uma obra exemplar e importante, um filme incômodo muito mais por seu conteúdo do que por causa de sua estrutura ímpar.
Com Forrest Whittaker, Juliette Binoche, Matthew Modine, Heather Graham, Marion Cotillard, Stefania Rocca.
[um dia de verão ]
direção: Franck Guérin.
Un Jour d’Été, 2006. Começa como aqueles draminhas pequenos sobre descoberta de identidade sexual e, com uma direção segura, um texto corretinho, segue bem até a primeira metade. Mas o roteiro começa a absorver tramas paralelas tão mal resolvidas que acabam afetando fatalmente “a busca pelo outro perdido através de sua família”, o que poderia rendeu um bom filme. Termina sem muito mérito.
Com Baptiste Bertin, Théo Frilet, Jean-François Stevenin, Catherine Mouchet.
[serras da desordem ]
direção: Andrea Tonacci.
Serras da Desordem, 2006. Arriscadíssimo retorno de Tonacci ao cinema, o documentário ficcionalizado tem em seu protagonista adorável sua maior força. Carapirú, ou Awá, é tão apaixonante que vira, de imediato, um herói inquestionável, um mocinho por quem torcer. Tonacci soluciona bem a apresentação da história, com cenas atuais, dramatizações com as próprias pessoas que viveram os fatos, e imagens de arquivo para mostrar os contextos. A montagem tem bons momentos, mas o uso do preto-e-branco às vezes é quase esquizofrênico. Mas, e era pra ser diferente?
Com Carapirú, Tiramukõn, Camairú, Myhatxiá, Sydney Ferreira Possuelo, Luis Aires do Rego, Estelita Rosalita dos Santos, Wellington Gomes Figueiredo, Talita Rocha.
[nosso amor do passado ]
direção: Hans Canosa.
Conversation with Another Woman, 2006. Parecia mais um daqueles filmes de D.R. e talvez até seja, mas o texto, que tem altos e baixos, tem nos primeiros, os altos, os momentos mais freqüentes. Helena Bonham-Carter e Aaron Eckhart, um casal inesperado, funcionam mito bem juntos, ambos com timing perfeito. A tela dividida durante todo o filme muitas vezes parecia não se justificar a não ser como exercício estilístico, mas há momentos brilhantes de montagem, quando a divisão apresenta flashbacks, situações alternativas, cenas seguintes. Foi uma bela surpresa.
Com Helena Bonham Carter, Aaron Eckhart, Nora Zehetner, Erik Eidem, Yury Tsykun, Brian Geraghty.
Lista com notas para todos os filmes da programação da Mostra vistos (inclusive no Festival do Rio).
Bom saber disso, me faz gostar ainda mais do filme, o melhor Ferrara que vi.
Marcelo, o projeto do Mary é de 2000 bem anterior ao filme do Gibson.
Vimos “Mary” hoje (encontramos o Michel), que filme impactante. Você acha que é, entre outras coisas, uma resposta ao Mel Gibson? Binoche está incrível, talvez o papel da vida dela. Whittaker e Modine (este andava sumido) encararam umas cenas bem arriscadas.