Party Girl

Party Girl é o título de uma bela música da cantora canadense Michelle Gurevich, mais conhecida como Chinawoman, gravada em 2007. A letra fala de uma mulher que ama festas, que está lá para seduzir e também para ser seduzida. Mas do que tudo, uma mulher não pede licença ou desculpa para ser quem é porque ela sabe que o certo, pelo menos para ela, é ser exatamente desse jeito. Além de estar na trilha sonora, a canção batiza e também inspira o longa de estreia de três diretores franceses: Marie Amachoukeli, Claire Burger & Samuel Theis, que materializaram uma ideia de Theis: contar a história de Angélique Litzenburger, uma mulher na casa dos 60 anos que viveu praticamente toda sua vida em cabarés, trocando sua intimidade por garrafas de champanhe.

Como na música, o trio de jovens cineastas procura não fazer juízo de valor sobre Angélique. Ela é como a party girl da letra de Chinawoman, uma natural. Numa das cenas mais esclarecedoras do filme, ela recusa violentamente ser chamada de puta por um pretenso cliente porque entende o que ela faz muito mais como um estilo de vida, uma arte, um jogo cênico e de sedução que comercializa tão espontaneamente. Este filme não é sobre pecados e castigos, nem sobre filhos que descobrem o grande segredo da mãe ou são revoltados por causa do rumo que a vida dela tomou. A família de Angélique sabe bem o que ela faz. Cada um convive com isso do jeito que pode, mas a honestidade é o que dá o tom de Party Girl.

O mais impressionante do filme – e isso pode ser um grande spoiler para quem não gosta de saber de sinopses (se foro seu caso, pule este parágrafo) – é que Angélique interpreta ela mesma e reencena cenas que realmente viveu e situações pelas quais passou, assim como seus quatro filhos – entre eles o diretor Samuel Theis -, que assumem seus próprios papéis nesta releitura da história da vida desta mulher. Os diretores mantêm essa informação no bastidor, não a utilizam em momento algum para ajudar a vender seu filme ousado, arriscado e espontâneo. Mas, por outro lado, também não a tratam como um segredo, deixando bem claro que estão interessados mesmo é no realismo.

Mesmo que os filhos aceitem o estilo e a história de sua mãe em graus diferentes, todos reagem tranqüilamente quando ela diz que pretende largar a profissão e se casar com um ex-cliente. É um movimento natural para todos. E, mais uma vez, o filme não trata essa transformação no rumo da protagonista como um processo de redenção, como provavelmente faria uma obra industrial. Angélique, uma natural que resolve mudar a vida mais porque se percebeu velha e sem grandes chances de se sustentar como sempre fez, não está sendo salva por Michel. Nossa party girl, cheia de dúvidas, está apenas entrando numa nova etapa de sua vida. Uma etapa que ela não exatamente escolheu e que, como qualquer outra, pode ser boa ou não.

Afinal, aqui não se trabalha com aqueles conceitos limitados de “dar certo” e “não dar certo”. O certo dura quanto ele puder. Como na vida. Como na música de Chinawoman: “não importa o que você cria se você não se diverte”.

Party Girl EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha½
[Party Girl, Marie Amachoukeli, Claire Burger & Samuel Theis, 2014]

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