A escolha de Pequeno Segredo para representar o Brasil na disputa pelo Oscar de filme estrangeiro selou a sina do longa de David Schurmann: o drama familiar dirigido pelo velejador virou inimigo público número um da democracia por ter tirado a vaga de Aquarius do ringue hollywoodiano. Natural. O filme estrelado por Sonia Braga que se transformou em símbolo da luta contra o impeachment de Dilma Roussef seria, na visão de grande parte da população, o candidato natural ao pleito, enquanto o segundo trabalho de Schurmann sequer havia sido visto por alguém. Pequeno Segredo foi julgado, condenado e apedrejado com a mesma intolerância com que um homossexual ou uma mulher adúltera encontra em países regidos por fundamentalistas. Sequer foi visto, já era considerado execrável.
As coisas mudam a partir de agora, quando o filme finalmente chega aos cinemas. A avaliação, desta vez, é baseada em fatos reais, assim como a história do longa, que anuncia sua nobre origem já em seus créditos iniciais, com um lettering que cruza a tela seguido por uma marca d’água que repete a frase numa espécie de caligrafia clonada, como se Schurmann quisesse deixar claro, desde o começo, o lado humano da história. “Baseado em fatos reais” tem cada vez mais sido usado como referendo para qualquer tipo de obras, especialmente filmes, como se o fato de aquela história que está sendo contada fosse mais importante do que uma trama original. Em Pequeno Segredo, o carimbo ajuda a amaciar a inexperiência do diretor na ficção. Seu primeiro longa, Desaparecidos, que pode ser encontrado na íntegra no YouTube, não traz um exemplo muito eficiente de talento dramático.
Mas o novo filme parece um passo além. Pelo menos na maquiagem das inconsistências. Schurmann se cercou por colaboradores mais experientes, alguns até vencedores do Oscar; recrutou atores conhecidos, como Julia Lemmertz e Marcello Anthony, além de chamar Fionula Flanagan para uma participação especial; e parece realmente incumbido de contar uma história de maneira poética. A questão que seu senso de poesia, desde a marca d’água dos créditos, parece bastante questionável, seja visualmente quanto nos diálogos e no desenho dos personagens. O filme é cheio de imagens-clichê como a borboletinha virtual que dá suas caras aqui e ali, que só não incomodam mais do que a cena em que a personagem de Julia Lemmertz confronta a de Flanagan (que parece caçoar do espectador com sua vilã caricata), perguntando “o que é o amor?”.
O texto, coescrito por Marcos Bernstein, um dos autores de Central do Brasil, parece poesia ruim de aluno da quarta série. Sua incompetência falha quando a intenção é emocionar e só facilita o trabalho dos críticos, que não é tão simples, diante de uma história bonita de altruísmo e dedicação. O mais complexo na análise de um filme como Pequeno Segredo é que ele transborda boas intenções em cada cena. Schurmann dedica o filme a sua mãe e a sua irmã, o que é bastante coerente com o fato de que as duas são as protagonistas absolutas do longa. Num esforço de talvez tentar manter algum distanciamento da trama que está contando, uma história tão próxima dele, o diretor praticamente elimina a si mesmo e a seus irmãos como personagens do filme. Eles aparecem em algumas cenas, mas sem ser nominados, o que causa no mínimo um certo desconforto.
A fragilidade do filme revolta mais do que seu bom mocismo. Este parece ser um panfleto ideal para os tempos de hoje: seu visual envernizado serve para encobrir a falta de criatividade; sua armadura sentimental ajuda a esconder as inconsistências e a incapacidade de flexão dramática; e sua assinatura, “baseado em fatos reais”, é um escudo que protege tanto a falta de textura quanto o maniqueísmo de uma história que se pretende inspiradora. A comissão do Oscar estava certa mesmo: Pequeno Segredo é o representante natural para o Brasil neste momento obtuso em que vivemos.
Pequeno Segredo ★½
[David Schurmann, 2016]
Vi o filme é o achei de uma sensibilidade ímpar, sem contar com a atuação de Júlia que como sempre é soberba. Parabéns a toda equipe do filme. Maravilhoso.
Fui ai cinema ver um outro filme, e como os ingressos estavam esgotados, vi o Pequeno Segredo. Achei que ia ser uma bomba, mas adorei o filme. Recomendo ver antes de falar mal.
Que bom que você gostou. O filme encontrou seu público.
Existem especialistas em filmes que só falam besteira. A revista Veja por exemplo só sabe criticar os filmes nacionais. Ora bolas, vão até as salas de cinemas e entrevistem as pessoas. Fui assistir o Pequeno Segredo e é um filme maravilhoso. Todos que estavam lá no cinema se emocionaram e realmente está a altura de representar o Brasil no Oscar. Oxalá desta vez consigamos. Agora meu caro critico – deixe de falar asneiras sobre o filme e pergunte à quem assistiu. Você tem a sua opinião e fim. A opinião do publico é outra.
Assisti também Aquários. É um lixo comparado com o Pequeno Segrego. E a Lilian Lemertz dá de 10 a zero na Sonia Braga. E fim de papo!!!!!
Lilian Lemmertz, que Deus a tenha, morreu em 1986. E fim de papo!!!!!
Acho louvável a homenagem de Schurmann à pequena Kat (afinal, antes de mais nada Pequeno Segredo é uma homenagem, certo?). Entretanto, quero destacar uma frase neste texto: “Sequer foi visto, já era execrável.” Como um filme que sequer foi visto pode ser escolhido para representar o país em uma premiação como o Oscar?
PS- na minha opinião o melhor filme desta safra é Boi Neon…