Um ano, dois recortes. Para selecionar os 20 filmes de que eu mais gostei em 2018, usei o seguinte método: eleger apenas filmes vistos pela primeira vez ao longo do ano, seja entre estreias, festivais ou em casa. Valendo filmes de 2016 a 2018 para manter a lista “quentinha”. Filmes que estrearam em circuito, streaming ou VOD em 2018, mas que eu já havia visto no ano passado, não valem para este top 20, ficando restritos para os Frankies, minha premiação anual de melhores do cinema. Por isso, esta lista de 20 não inclui alguns dos filmes que mais defendi nos últimos doze meses, mas, em compensação, acolhe outros, muito especiais para mim, que ainda não ganharam espaço no circuito.

20 Você Se Pergunta Quem Atirou?, Travis Wilkerman

Pode-se dizer que há um certo exibicionismo em como o diretor usa os pecados de bisavô, um homem branco que matou um homem negro no Alabama, nos ano 40, como se pedisse perdão por algo de que não é culpado. Mas esta superexposição, este envolvimento excessivo com os fatos, a necessidade de dizer que está sendo perseguido por isso, ganha um modelo narrativo muito bem elaborado. Travis Wilkerson parte de um caso específico para fazer um pequeno tratado histórico sobre brancos e negros e sobre o coração da América. E, se quando expõe a si mesmo e a sua família ao escrutínio público, conscientemente, planejadamente, articuladamente, o faz com uma dose cavalar de naturalidade. Travis sente o peso da América racista nos seus ombros e seu “pedido de perdão”, mesmo que, de um modo torto, o transforme num eco de um “herói” como Atticus Finch, parece mesmo um pedido sincero.

19 Oitava Série, Bo Burnham

Lady Bird é a referência mais direta por também ser um coming of age feminino, mas o filme de Bo Burnham é bem mais cruel e profundo em seu estudo da transformação de uma garota. Sem o humor de Greta Gerwig, Bo registra com muita sensibilidade uma personagem que não sabe seu próximo passo, seu dia seguinte, que se apega a tudo o que pode para se manter viva. Elsie Fisher, a voz da Agnes de Meu Malvado Favorito, aos 15 anos, demonstra um talento monstruoso. Talvez seja a atriz do ano.

18 Um Crime Americano, T.J. Martin e Daniel Lindsay

O ódio que você semeia. Ou 200 anos de escravidão.

17 Museu, Alonso Ruizpalacios

Um filme de assalto que vira uma discussão existencialista sobre o lugar e o papel que você no mundo, e sobre destino, fracasso e responsabilidade. Uma surpresa. Gael García em sua melhor performance em anos, ao lado do encantador Leonardo Ortizgris e do retorno triunfal de Leticia Brédice, estonteante como a velha dançarina.

16 A Nossa Espera, Guillaume Senez

O francês Guillaume Senez decide analisar e movimentar seu protagonista a partir do que ele carrega dentro de si mesmo, de quem ele é, de como se construiu, do que pelo golpe familiar que o acometeu. O personagem de Romain Duris, numa interpretação realista e sensitiva – de certa forma, mas por outra perspectiva – reprisa o drama do “herói” de Amanda: deve-se sacrificar o pessoal para assumir uma responsabilidade? Novamente, o “evento” é apenas o motivo para que se discorra sobre sentimentos, angústias e dúvidas. No longa de Senez, se existe uma mensagem, ela é: “está tudo bem“. E, mesmo que as coisas não terminem assim, elas revelam relações honestas entre os personagens.

15 Ponto Cego, Carlos López Estrada

Infiltrado na Klan é um belo filme, mas Ponto Cego é um filme melhor. Talvez bem melhor. Porque é sobre vida, romance e amigos, mas também é o mais efetivo filme recente sobre a “maldição” de ser negro, sobre ter que provar ser bom, ter que provar ser honesto, sobre ter que merecer respeito. Aliás, sobre ter que merecer não sofrer preconceito. Há um punhado, sem exagero, de cenas sintomáticas, em que o discurso passa do debate real, físico, factual para encostar no fantasma histórico, quase assumindo o metafísico. E este filme pequeno passa por tudo isso sem tentar ser didático, sem lamento, sendo também uma comédia, dirigida por um latino estreante, escrita por um negro e por um branco que também são seus protagonistas, SENDO RAP, sendo coerente, mas contraditório.

14 Benzinho, Gustavo Pizzi

Benzinho é sobre a primeira separação de mãe e filho. Sobre o orgulho de ver a cria ganhar o mundo, seguir seu caminho, mas sobre aquele desejo, lá no fundo, de que aquela pessoa que saiu de você, que você fez, esteja para sempre embaixo das suas asas. É torcer 100% a favor e 5% contra, sem que essa conta precise fechar, afinal, amor é elástico. E Benzinho também é sobre amor. Aliás, só é sobre amor. A família de Irene e Fernando se ama demais, é carinhosa demais entre si, se abraça, se beija, se acolhe o tempo todo. Pai, mãe, quatro filhos, tia, sobrinho. É tanto amor que Benzinho poderia se passar por um filme sem nuances, como se nuance passasse diretamente pelo fato de haver intrigas ou invejas entre os membros de uma família. Os personagens do filme são ricos e esta riqueza se revela nos detalhes, na forma como Pizzi filma o cotidiano, como se dedica a cenas banais, como um irmão alimentando o outro, como uma irmã abraçando a outra, como uma esposa dedicando tempo a ouvir os planos do marido sonhador. O filme se destaca pela sinceridade, pelo retrato fiel, pelo carinho que tanto falta nas representações ficcionais que vemos hoje em dia, em que há um entendimento de que para ser fiel à realidade é preciso passar necessariamente pelo registro da violência ou pela corrupção de afetos. Benzinho mostra que existe outro registro possível – e necessário.

13 Eu Não Me Importo Se Entrarmos para a História como Bárbaros, Radu Jude

O momento político no Brasil, com discursos de ódio surgindo como pop ups na tela no celular, parece tão ficcional que quis o destino que um cineasta romeno, repassando a história de seu próprio país, traduzisse sem intenção o que está acontecendo por estas bandas. Radu Jude se desvia da fórmula tradicional do cinema de seu país, que observa tão de perto o cotidiano para chegar às pequenas tragédias de seus personagens, para assumir a metalinguagem e assim poder falar mais claramente sobre a maldade nossa de cada dia. Na primeira cena do filme, a protagonista se apresenta e afirma que vai interpretar uma diretora que quer reencenar o massacre de judeus em seu país durante a Segunda Guerra Mundial com populares interpretando o povo da época. Em seu falso documentário, Jude discute o racismo enrustido e incrustrado na população, a hipocrisia, a negação do debate, a família tradicional, o militarismo, enfim, a Romênia da época, a Romênia de agora — e, por que não? – o Brasil de hoje também. O formato e o método encontrados pelo diretor são um pouco cansativos, com a personagem da diretora numa espécie de luta solitária para reverter o que se revela aos pouco o status quo, mas mesmo isto parece refletir de maneira torta o brasileiro que ignora dados, releva a raiva dos discursos e continua acreditando no que ouviu falar. Um filme longo, mas extremamente necessário.

12 O Outro Lado do Vento, Orson Welles

É difícil listar tudo o que Orson Welles desconstrói – ou tenta – aqui: a indústria do cinema, a imprensa, a narrativa, a lógica. Seu parente mais próximo na filmografia do diretor é, com certeza, “F for Fake”, mas mesmo assim o filme tem uma identidade completamente própria. Parece uma grande resposta a tudo o que ele passou como criador ao longo de toda sua vida. A metalinguagem é literal já que vemos um filme sobre um filme inacabado, o que viria a se tornar a própria maldição do longa. Não fica claro o quanto o filme é premonitório em relação a si mesmo ou se Welles foi o homem mais cínico e inteligente do cinema. Talvez seja as duas coisas. Montado e finalizado de acordo com suas anotações, assim diz o Netflix, assisti-lo no cinema foi uma experiência intensa. Welles faz questão de não deixar ninguém confortável, de maneira alguma. O preto-e-branco e as cores se alternam sem aviso, o filme e o filme-dentro-do-filme se completam e se confundem. A montagem é alucinante em pelo menos metade das sequências, com cortes rapidíssimos acompanhados de minimovimentos de câmera, como se o espectador chegasse enquanto o filme ainda estava se desenhando, criando tanto uma sensação de urgência quanto colocando que assiste como parte do motor da obra.

11 Uma Terra Imaginada, Yeo Siew Hua

A degradação da condição humana é contínua, infinita e alucinógena no primeiro motor da sociedade industrial — o uso maciço e ilegal do imigrante como força elementar de trabalho — segundo o cineasta cingapuriano Yeo Siew Hua. E sua consequência mais imediata — ou a saída mais viável para o indivíduo, numa outra interpretação — é ser literalmente engolido pelo processo ou se alienar no próprio mecanismo, atravessando algumas vezes os limites da mente e da metafísica. Mais do que a expansão imobiliária e urbana, há uma expansão específica em progresso aqui, o crescimento do espaço de produção, que o diretor acredita estar diretamente associado à expansão do campo onírico, inclusive como refúgio possível para o trabalhador que se permite a consciência do processo. O cineasta se lança numa ambiciosa empreitada que discute a própria noção de realidade, tanto na vida e na rotina de trabalho como em seu próprio cinema, que absorve esse debate, abraçando a mudança de aspecto, recorte e narrativa sem aviso prévio, mas de uma maneira supreendentemente orgânica, como se “a evaporação de um homem” fosse vista de dentro, num mecanismo gradativo de abstração da condição humana e da própria condição existencial, com aspectos psicológicos e até de certa forma religiosos ou espirituais sendo levados em conta nesta espécie de ficção-científica ritualística e de atmosfera transitória. Um grande filme, mas, se perguntar, ele nega.

10 Asako I & II, Ryûsuke Hamaguchi

O que determina o amor, o que nos move em relação a outra pessoa, o que mais pesa na hora de escolher se apaixonar? Estamos presos para sempre ao que sentimos por alguém que foi embora ou ainda não descobrimos como lidar com a perda? As perguntas que Asako I e II nos lança são diretas, mas nunca fáceis de responder. O filme de Ryûsuke Hamaguchi sobre os encontros de uma mulher com dois homens idênticos parte de uma novela popular e namora com o fantástico. Sugere o duplo para logo se dedicar ao uno, mas sem abandonar sua premissa. Em seu jogo de delicadezas, transforma uma confusão de identidades para um embate entre paixão e amor. Em seus momentos mais inspirados, encanta pelo banal, ou por encontrar o sublime no meio da banalidade. É um filme que talvez faça mais sentido para quem entende, vive ou conhece um certo “modo oriental” de lidar com as relações e com os sentimentos, mas sua atmosfera etérea, sua estranheza, seu timing particular são passaportes alternativos para se discutir relacionamentos muito reais em três atos distintos: o da entrega, o da conquista e o da dúvida.

9 Conquistar, Amar e Viver Intensamente, Christophe Honoré

Em seu novo filme, Christophe Honoré faz uma escolha bastante ousada. Ao retratar os anos iniciais da crise do HIV, escolhe as pessoas e não a doença. O filme não tem a preocupação de ser um registro histórico, nem um manual de comportamento sexual. Para o francês, o interessante não é mostrar personagens derrotados pela doença, punidos pelo pecado do amor proibido. A morte é o destino final, mas o foco é a sobrevivência. É como o protagonista elege a vida. Sem drama, sem culpa, sem a necessidade de expiação. Sob as leituras punitivas e de segregação espalhadas como metástases mundo afora nos dias de hoje, poderia ser facilmente interpretado como um filme irresponsável, que desperdiça ou sumariamente ignora sua função social, quando seu verdadeiro papel social é encontrar o humano dentro daquela situação, o humano culto, o humano sedutor, o humano ainda capaz de amar e de ser amado. Honoré escolheu o lado mais difícil e desafiou a ignorância.

8 Trama Fantasma, Paul Thomas Anderson

O último filme de Paul Thomas Anderson é fogo que arde sem se ver, ferida que dói e não se sente (ou é sobre a dor de parto do criador ou sobre a dor da condição de criatura). É sobre estar-se preso por vontade, servir a quem vence, o vencedor (mas é sobre jogar o jogo do outro, guardando para si um poder doloroso por ser invisível). É sobre ter com quem nos mata lealdade e sobre andar solitário por entre tanta gente. Tão contrário assim é mesmo o amor, diz o cineasta, rebuscado, defendendo sua verdade, talvez criando um espelho de si mesmo.

7 Roma, Alfonso Cuarón

Em Roma, Alfonso Cuarón volta à infância para homenagear sua babá não apenas revisitando sua biografia, mas a transformando num fio condutor para fazer uma radiografia de um país cheio de contradições a partir de um recorte. Ao mesmo tempo em que critica a hipocrisia no tratamento em relação às empregadas domésticas, “como se fossem da família”, sabe materializar em pequenos goles um afeto sincero. Cleo, a personagem principal, a jovem que saiu da periferia para anular sua vida cuidando das vidas de uma família de classe média alta, nos leva por uma jornada solitária que não apenas mapeia suas tragédias pessoais, mas desvenda um México em ebulição, em que os jogos de poder independem das classes, mas se materializam principalmente no abismo entre elas. Cuarón tenta não ser maniqueísta em suas escolhas e acerta em boa parte delas. Estetiza, como de praxe, o olhar de sua câmera, mas não para entregar um filme limpinho. Seu preto-e-branco, seus travellings, procuram dar conta de sua intenção de registrar, de documentar, ao mesmo tempo em que acolhem seus personagens. Roma não foge à regra de seus projetos: é imenso sendo pequeno, é para o mundo sendo também pessoal.

6 Um Elefante Sentado Quieto, Bo Hu

Bo Hu não enxergava o mundo com bons olhos e seu primeiro e único filme, de quase quatro horas de duração, adaptado de um conto escrito pelo próprio realizador, está extremamente ligado a uma tragédia externa e posterior a sua realização. Bo Hu tirou a própria vida logo após encerrar o projeto. O desconforto e a desesperança do cineasta em relação a tudo que o cerca estão materializados nas trajetórias de seus quatro protagonistas, que se intercalam sempre amarradas à iminência do desastre, da violência, da tristeza. Espelhadas na própria desilusão do cineasta, a solidão e a falta de perspectivas que os livrem de seus infortúnios embala os caminhos dos personagens das primeiras cenas até o desfecho. Mas, se eles não se eles não escapam da adversidade, o filme nunca se esquiva na forma tortuosa de buscar suas humanidades.

5 Arábia, Affonso Uchoa e João Dumans

Arábia está a frente do cinema brasileiro contemporâneo porque, além de sua clara intenção política, se preocupa com sua forma, abraçando o dispositivo para envelopar sua proposta. E seu dispositivo é a narrativa. Quando adotam a carta como mecanismo, Affonso Uchoa e João Dumans validam tanto sua crítica social e seu cinema menos tradicional quanto permitem ao filme o tratamento poético, o texto bruto e simples, mas com intenções delicadas e rebuscadas, características que muitos filmes brasileiros recentes perdem pela falta de um dispositivo que os liberem da prisão da estética da captura do real. Nester filme, a observação do mundo convive harmoniosamente com o relato poético. O resultado tem uma força inédita que transforma seu retrato do cotidiano do homem comum – e consequentemente dos espaços que o oprimem, amordaçam e expulsam – num canto de guerra contra o estado das coisas, num pequeno tratado sobre o coração do Brasil, numa ode à liberdade de existir enquanto homem, trabalhador e, por que não?, poeta do dia-a-dia. A arte também é estar pronto para a luta.

4 Assunto de Família, Hirokazu Kore-eda

Enquanto os espasmos de ódio feriram amizades de morte e apunhalar famílias nos últimos tempos na vida real, os filmes ajudaram a construir laços apertados entre estranhos nestes mesmos últimos tempos. Foi o caso de Assunto de Família, que investiga o que faz da relação entre duas pessoas uma relação verdadeira e o que é realmente uma família. O filme mergulha profundamente em perguntas um tanto óbvias para chegar a conclusões um tanto óbvias percorrendo os caminhos menos óbvios possíveis. Os protagonistas curam sua solidão caçando companheiros, parceiros, cúmplices. A casa cheia é cheia de pessoas desiludidas, amarguradas e abandonadas que buscam refúgio e colo em pessoas desiludidas, amarguradas e abandonadas. Os caminhos não são fáceis, como a vida não é fácil, principalmente para quem não segue as regras. E o método do diretor, o do retrato do cotidiano, o da observação dos detalhes, é fundamental para que o elo entre os personagem se estabeleça espontaneamente. Kore-eda fecha o foco tanto, tantas vezes, que parece chegar à essência daqueles relacionamentos, que partem da autopreservação para a manutenção do clã, com direito a todos os desacertos e fragilidades que a vida pode nos acometer.

3 Transit, Christian Petzold

A vida em fuga e a fuga como forma de sobreviver. Christian Petzold nunca falou tão perto ao coração e ao metabolizar um livro escrito durante a Segunda Guerra amplia seus limites de tempo, espaço, e suas reflexões, cresce o material, num exemplo de domínio da arte da narrativa que pouco se viu recentemente, para, ora, tornar esta história mais intimista. Um filme sobre abandonar e ser abandonado. Sobre apegar-se, apaixonar-se mesmo, pelo que está mais perto ou pelo que restou. Sobre finalmente se permitir abrir-se e ser engolido pela vida. Sobre o que carregamos de generoso e de mesquinho. Sobre acertar nos desacertos, errar nas certezas e sobre a imprevisibilidade, sobre morrer confortável e sobre aguardar o final feliz.

2 Em Chamas, Lee Chang-dong

Jongsu toca sua vida, administrando suas tragédias e frustrações. Finge que não, mas guarda rancor pelo que não teve e pelo que lhe foi tirado. Cresceu autocentrado, um tanto egoísta, ainda que não fuja a suas responsabilidades, que aumentam a cada dia. Não é de pedir, mas às vezes ganha presentes que não esperava – e com os quais demora a se acostumar. O reencontro com a antiga vizinha, que ele conhece desde a infância, é, a princípio, blasé, mas logo se torna necessário. Jongsu rapidamente incorpora esses “novos elementos” a sua rotina de necessidades. É prático, como se o que e quem surge servisse para suprir o que e quem se foi. Então, como aceitar perder uma nova conquista? Lee Chang-dong adaptou um conto de Haruki Murakami para realizar em Em Chamas. Seu principal objetivo parece ser avaliar como um homem solitário lida com o que parece ser uma ameaça à ilha de tranquilidade que finalmente encontrou, mas oferece uma nova leitura a cada cena e cada revisita. Linda interpretação de Ah-In Yoo, que encontrou em Steven Yeun, o Glenn de “The Walking Dead”, um oponente à altura.

1 Amanda, Mikhaël Hers

Amanda, como tantos, é um filme sabotado por qualquer sinopse que tente resumir a história de seus personagens. O longa, exibido na Mostra de Cinema de São Paulo e no Festival do Rio, pode parecer banal quando se lê sobre ele porque, no papel, é difícil não cair na tentação de enclausurá-lo como mera consequência de um “evento transformador”, mal maior da ficção. Amanda, que deve ser lançado comercialmente no ano que vem, tem, sim, em sua trama um acontecimento que desestabiliza o status quo dos protagonistas, mas o filme não segue o modelo óbvio de causa e efeito. Seu diretor não entende a vida como produto de episódios pontuais. Ele se apropria de um tema de impacto, de um assunto do momento, para mostrar como o externo nos revela por dentro. No final das contas, é um filme sobre crescer. Sobre estar preparado ou não para enfrentar pequenas e grandes tragédias. Sobre como pode ser doloroso continuar, seguir em frente, puxar para si, assumir, acolher, tomar a responsabilidade. Hers parece acreditar que nossa essência sempre está ali e que a generosidade talvez seja o que carregamos de melhor. E que fazer a coisa certa talvez seja nosso maior desafio. Quando isso acontece, não importa o tamanho da dor, o amor vence.

E mais:

OITO FILMES DE QUE EU APENAS GOSTAVA, MAS REVI ESTE ANO, PEÇO HUMILDES DESCULPAS E CONSIDERO OBRAS-PRIMAS
ordem cronológica

Roma, Cidade Aberta (1945), Roberto Rossellini
Contos da Lua Vaga Depois da Chuva (1953), Kenji Mizoguchi
O Intendente Sansho (1954), Kenji Mizoguchi
Sombras (1959), John Cassavetes
O Leopardo (1963), Luchino Visconti
Morte em Veneza (1971), Luchino Visconti
Cabaret (1972), Bob Fosse
Paisagem na Neblina (1988), Theo Angelopoulos

CEM OBRAS-PRIMAS (OU QUASE – OU FILMES MUITO, MUITO BONS) QUE VI PELA PRIMEIRA VEZ EM 2018
ordem cronológica

Quatro Cavaleiros do Apocalipse, Os (1921), Rex Ingram
Esposas Ingênuas (1922), Erich von Stroheim
Irmãs de Gion, As (1936), Kenji Mizoguchi
Humanidade e Balões de Papel (1937), Sadao Yamanaka
Mulheres na Noite (1948), Kenji Mizoguchi
Ato de Violência (1949), Fred Zinnemann
Conflitos de Amor (1950), Max Ophüls
Matador, O (1950), Henry King
Sal da Terra, O (1954), Herbert J. Biberman
Rio 40 Graus (1955), Nelson Pereira dos Santos
Cilada Mortífera (1958), Irving Lerner
Fortaleza Escondida, A (1958), Akira Kurosawa
Conexão, A (1961), Shirley Clarke
Crônica de um Verão (1961), Jean Rouch e Edgar Morin
Noite do Terror, A (1961), Curtis Harrington
Tempestade Sobre Washington (1962), Otto Preminger
Amor Eterno, O (1963), Han Hsiang Li
Crisis: Behind a Presidential Commitment (1963), Robert Drew
Trinta Anos Esta Noite (1963), Louis Malle
Assassinos, Os (1964), Don Siegel
Pedro, o Negro (1964), Miloš Forman
Seis Mulheres Para o Assassino (1964), Mario Bava
Três Samurais Fora-da-Lei (1964), Hideo Gosha
Esposa Solitária, A (1964), Satyajit Ray
Flor Seca (1964), Mashiro Shinoda
Getrud (1964), Carl Theodor Dreyer
Vagas Estrelas da Ursa (1965), Luchino Visconti
Yoyo (1965), Pierre Étaix
Guerra e Paz (1965-1967), Sergei Bondarchuck
Grande Mestre Beberrão, O (1966), King Hu
Morte de um Burocrata, A (1966), Tomás Gutiérrez Alea
Ó, Sol (1967), Med Hondo
Rebelião (1967), Masaki Kobayashi
Infância Nua (1968), Maurice Pialat
Vida Provisória. A (1968), Maurício Gomes Leite
Enforcamento, O (1968), Nagisa Ôshima
High School (1968), Frederick Wiseman
Crônicas de Anna Magdalena Bach (1968), Jean-Marie Straub e Danièle Huillet
Bravo Guerreiro, O (1968), Gustavo Dahl
Estranho Caminho de Santiago, O (1969), Luis Buñuel
Dor e a Piedade, A (1969), Marcel Ophüls
Círculo Vermelho, O (1970), Jean-Pierre Melville
Hospital (1970), Frederick Wiseman
Sem Essa, Aranha (1970), Rogério Sganzarla
Joelho de Claire, O (1970), Éric Rohmer
Amor, O (1971), Károly Makk
Corrida Contra o Destino (1971), Richard C. Sarafian
Cuadecuc, Vampir (1971), Pere Portabella
Emigrantes, Os (1971), Jan Troell
Fata Morgana (1971), Werner Herzog
Longo Adeus, O (1971), Kira Muratova
Mensageiro, O (1971), Joseph Losey
Violonista no Telhado, Um (1971), Norman Jewison
Johnny Vai à Guerra (1971), Dalton Trumbo
Bleak Moments (1971), Mike Leigh
Na Boca da Noite (1971), Walter Lima Jr.
Confissões Íntimas de uma Cortesã Chinesa (1972), Yuen Chor
Estado de Sítio (1972), Costa-Gavras
My Childhood (1972), Bill Douglas
Sambizanga (1972), Sarah Maldoror
Tudo Vai Bem (1972), Jean-Luc Godard e Jean-Pierre Gorin
Imagens do Velho Mundo (1972), Dusan Hanák
Belladonna of Sadness (1973), Eiichi Yamamoto
Irmãos de Sangue (1973), Chang Cheh
Mãe e a Puta, A (1973), Jean Eustache
Alice nas Cidades (1974), Wim Wenders
Cães Raivosos (1974), Mario Bava
Céline e Julie Vão de Barco (1974), Jacques Rivette
Homem que Dorme, Um (1974), Bernard Queysanne
Viagem dos Comediantes, A (1975), Theo Angelopoulos
Detetives, Os (1976), Michael Hui
Trás-os-Montes (1976), António Reis e Margarida Cordeiro
Homem de Mármore, O (1977), Andrzej Wajda
Três Mulheres (1977), Robert Altman
Girlfriends (1978), Claudia Weill
Hipótese do Quadro Roubado, A (1978), Raúl Ruiz
Nighthawks (1978), Ron Peck
Vencedor, O (1979), Peter Yates
Contratempo (1980), Nicolas Roeg
Documenteur (1981), Agnès Varda
Sedução e Vingança (1981), Abel Ferrara
Nômade (1982), Patrick Tam
Tempo para Viver, um Tempo para Morrer, Um (1985), Hou Hsiao-hsien
Alvo Duplo (1986), John Woo
Terroristas, Os (1986), Edward Yang
Ladrão de Cavalos, O (1986), Tian Zhuangzhuang e Pan Peicheng
Ela Quer Tudo (1986), Spike Lee
Sonho da Ópera de Pequim (1986), Tsui Hark
Pássaro Sangrento, O (1987), Michele Soavi
Ariel (1988), Aki Kaurismäki
Rouge (1988), Stanley Kwan
Alvo Duplo 3 (1989), Tsui Hark
Confiança (1990), Hal Hartley
Atriz, A (19919, Stanley Kwan
Bela Intrigante, A (1991), Jacques Rivette
Companheiros, Quase uma História de Amor (1996), Peter Chan
Made in Hong Kong (1997), Fruit Chan
Samurai do Entardecer, O (20029, Yôji Yamada
Intruso, O (2004), Claire Denis
It’s Such a Beautiful Day (2012), Don Hertzfeldt

MEUS EVENTOS CINEMATOGRÁFICOS PARTICULARES DO ANO

ver as quatro partes de Guerra e Paz (Sergei Bondarchuck, 1965-1967) no cinema
ver O Outro Lado do Vento (Orson Welles, 1971-2018) no cinema

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