X-Men 2

Bryan Singer tem uma carreira curta no cinema. Depois de um filme que ninguém viu fez um que todo mundo assistiu, Os Suspeitos. Ganhou pontos sua obra seguinte, O Aprendiz, e em 2000 recebeu a missão de levar para o cinema o maior grupo de super-heróis da história dos quadrinhos, os X-Men. Seu filme foi rapidamente alçado a melhor adaptação de um personagem de HQ para as telas. Elogiado pelos fãs e pela crítica. Mas ainda faltava alguma coisa. Faltava ideal.

Os X-Men surgiram na década de sessenta, junto com os grandes personagens de Stan Lee para a editora Marvel Comics: Homem-Aranha, Hulk, Quarteto Fantástico, entre muitos outros. O grupo de mutantes (pessoas especiais portadoras de um gene capaz de lhes garantir superpoderes desde crianças) lutava menos com seus inimigos e mais por sua aceitação entre os humanos comuns. Os X-Men se tornaram um marco nos quadrinhos. Eles eram a diferença. E a diferença sempre incomodou.

O universo dos mutantes foi absorvido imediatamente para o universo dos leitores, em sua maioria adolescentes, prontos para enfrentar o mundo que não os entende. Essa associação multiplicou várias vezes a fama e a mitificação dos heróis, que também aumentaram em quantidade. Mais de vinte deles participaram dos X-Men, além de outros tantos (com tantas histórias diferentes) que compunham equipes paralelas como o X-Force, os Novos Mutantes, o X-Factor e o Excalibur. Os X-Men se tornaram muito maiores do que Lee poderia imaginar.

Nas mãos da dupla Chris Claremont e John Byrne, os mutantes explodiram em sua popularidade, com histórias cada vez mais complexas e seus conflitos cada vez maiores. Transportar – ou melhor, recriar – personagens tão complexos como Wolverine, Magneto, Jean Grey e o Professor Xavier para as telas era arriscado e difícil. Mas no primeiro filme, Singer, que nunca tinha lido uma revista do grupo, soube apresentar os heróis, sobretudo pelo casting perfeito. Faltava falar de motivação.

É justamente ela, a motivação, que transforma X-Men 2, este sim, na melhor adaptação de personagens de quadrinhos para o cinema. A luta contra o preconceito para com os mutantes é a mola mestra do filme, que defende o ideal do professor e mostra na prática como os mutantes sofrem para ser aceitos. “Por que você não se disfarça o tempo todo?”, pergunta Noturno para a Mística. “Porque não deveríamos ter de fazer isso” é a resposta que ele consegue.

Metáforas à parte, o filme diz que todo mundo merece ser respeitado. Conseguir dizer isso em pleno cinema comercial norte-americano e com super-heróis que se teleportam, movem objetos, controlar o tempo ou soltam raios é muita coisa. É arte. Singer prova que a arte está em qualquer lugar. Basta ter talento pra chegar nela. O cineasta equilibra a tênue linha entre o idealista e o vilão em Magneto. Nenhum personagem é caricatural. Wolverine volta a excelência da interpretação do surpreendente Hugh Jackman e Alan Cumming recria o Noturno perfeito. Até Halle Berry, que tinha decepcionado no primeiro filme consegue fazer uma Tempestade digna (e finalmente com o cabelo no lugar).

Outro grande trunfo do filme é que o espírito dos X-Men corre ao lado da eficiência técnica. As cenas de combate ou de simples exibição de superpoderes são deliciosas. A transformação do Colossus, Kitty Pryde atravessando as paredes, as teletransportações do Noturno são feitas com perfeição. Nostalgia pura. É sonhar com o que ainda está por vir – e as ambições dos produtores incluem sagas alternativas, como o clássico Dias de um Futuro Esquecido, que se passa numa realidade alternativa. Assistir X-Men 2 no cinema é voltar aos tempos da adolescência e mergulhar num universo único onde as ideologias e caráteres ajudam a se formar. Testemunhar como tudo foi tão perfeitamente respeitado nesse filme é simplesmente delicioso e merece reverência. Surpreender-se com a possibilidade completamente real – vide a imagem final – do surgimento da Fênix no próximo filme é pertubador. Difícil conter os arrepios.

Que venha o Hulk.

X-Men 2 ****½
[X2: X-Men United, Bryan Singer, 2003]

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