Maldeamores , de Carlos Ruíz Ruíz e Mariem Pérez Riera
O público gostou bastante, mas essa coleção de histórias de amor, ou quase isso, é pobrezinha demais. O roteiro preguiçoso recicla clichês de comédias românticas e melodramas familiares. O texto é raso, o humor fácil e os personagens, mal construídos, estereotipam o latino ao máximo grau. Os diretores investem na fórmula do menos que é mais e fazem um filme para o povão pouco exigente. Porto Rico fica devendo.
Il Divo , de Paolo Sorrentino
Engraçado, Il Divo é saudado como um exemplar do cinema italiano renovado, mas nada mais é do que um filme político com a montagem no fast. As cenas são calculadíssimas, o que resulta em alguns momentos realmente inspirados (sobretudo quando as soluções encontradas por Paolo Sorrentino pinçam o filme da condição de história para “ei, isto aqui é cinema, é truque”). Mas esse cinema pensado demais também cansa um pouco. A trilha berra em nossos ouvidos, mas é bem usada para os fins do diretor. A interpretação de Toni Servillo, embora invada muitas vezes a caricatura, é o que de melhor o filme tem a oferecer.
Conhecendo Andrei Tarkovsky , de Dmitry Trakovsky
Começou prometendo ser uma experiência interessante, com um tom bastante pessoal, onde o diretor compatriota de Tarkovsky tenta descobrir mais sobre seu cineasta favorito. Mas a inexperiência do autor (não sei se o sobrenome é de verdade ou se ele surrupiou de seu objeto de estudo) não soube concluir sua ambiciosa proposta: materializar o modo de Tarkovsky encarar o mundo. Era difícil mesmo. Então, embora ele tente pintar todas as entrevistas e informações que coleta ao longo do filme com um verniz de mais sério e profundo, o resultado fica no óbvio. O sentimento de frustração é inevitável, mas a viagem vale a pena, nem que seja pra ver a imagem da vila onde Tarkovsky nasceu, hoje uma área alagada, onde a única coisa que se vê é o topo de uma enorme cruz.
El Regalo de Pachamama , de Toshifumi Matsushita
O que esse japonês foi fazer na Bolívia é um mistério. Provavelmente tem a ver com sua experiência com documentários. El Regalo de Pachamama poderia bem ser um daqueles longas documentais que apresentam o cotidiano de personagens que vivem isolados, no caso o povo quéchua, que vive na Rota do Sal, mas vai além disso. Matsushita cria uma historinha mínima que funciona do começo ao fim (sendo o fim uma micro-história de primeiro amor), não se perde em excesso de detalhes, nem na vastidão na paisagem (o que virou marca do cinema latino-americano) e dirige seus não-atores melhor do que qualquer iraniano. Não tem nada de muito especial, mas é uma experiência válida.
Jodhaa Akbar , de Ashutosh Gowariker
Eu não recomendo este filme a ninguém porque ele exige bastante concessões do espectador. Primeiro, tem que se ter a mínima noção do que é Bollywood e da lógica do cinema comercial indiano. Segundo, é preciso ter paciência porque este é um filme com vários números musicais – e ele tem quase três horas e meia de duração. Quem não estiver disposto a relativizar certamente tentará ridicularizar esse filmaço, um espetáculo kitsch de primeira grandeza, uma ode ao exagero, pouquíssimo preocupado com verossimilhança, e coerente com uma filmografia popular. Jodhaa Akbar se baseia em fatos históricos pouco confiáveis para criar uma epopéia máxima, algo como um Cecil B. De Mille dos tempos atuais. Exagera em tudo.
Os figurinos multicoloridos explodem ao longo do filme, que começa com uma batalha que usa discretamente efeitos digitais. Os atores, limitados, são sempre orientados para o overacting. A Juliana Paes indiana, a lindíssima Aishwarya Rai, a maior atriz do país, lidera o elenco no papel título, contracenando com um galã bombadíssimo, canastrão como há tempos não se via. Há uma cena fantástica, em que a princesa começa a se interessar pelo imperador e admira seu torso nu ao sol, na melhor linha do antigo Cine Privê, da Band. Mas o melhor mesmo é a trilha sonora. A primeira música só chega aos 40 minutos de filme, mas traz dezenas de coleguinhas sucessivamente. E quando não canções, existe a trilha instrumental que joga um estrondoso “tanran!!!” em cada cena de tensão do filme.
O Amigo , de Micha Lewinsky
A idéia inicial é boa: mulher pede a um cara que ela mal conhece para ele fingir ser seu namorado e depois morre. Ele resolve assumir o papel para a família da moça. No entanto, o diretor não sabe muito bem por onde levar o filme, não acha um tom interessante e se perde. Aqui e ali há uns cacoetes (a mãe do protagonista é superprotetora e carente; a relação entre a mãe da morta e a irmã é difícil; o pai é um cara amoroso), mas também existem cenas onde o filme muda de cores (como na carta lida no velório). O diretor termina tapando como pode as arestas que deixou (a relação entre o personagem principal e sua mãe se resolve sem explicação), abusa de imagens óbvias (como as da praia) e chega um resultado conciliatório meia-boca.
Sob Controle , de Jennifer Lynch
Quando dirigiu Encaixotando Helena, Jennifer Lynch tinha 25 anos. O trauma foi tão grande que somente agora, 15 anos depois, ela se aventura novamente no comando de um longa-metragem. Há de se dizer que a filha de David Lynch envoluiu, embora a temática ainda seja a América doentia (bem próxima da América doentia de seu pai, diga-se de passagem) e os personagens continuem desequilibrados. Felizmente Jennifer resiste à tentação de introduzir elementos oníricos à narrativa do filme, o que seria uma herança entendível. Mesmo assim, Sob Controle, apesar de bem amarradinho, não é lá essas coisas. Depois do choque, parece fácil, truqueiro, clichezão. A projeção digital prejudica bastante o filme, que fica parecendo um daqueles longas policiais b com mistérios e reviravoltas, que passavam na Sessão de Gala.
Tulpan , de Sergey Dvortsevoy
Tulpan é uma gracinha. Imagino o quanto essa palavra – gracinha – possa ser entendida como sinônimo de um filme feito para “distintas senhoras”. Mas não é bem isso o que eu quis dizer. Esse longa é surpreendente porque tudo indicava (sinopse, lugar de onde ele veio, atores não-profissionais) que ele seria mais um daqueles exemplares de filme pequenos sobre lugares pequenos dispostos a encantar o espectador por sua simplicidade e seus personagens singelos. Mas Sergey Dvortsevoy passa ao largo desta proposta, com dois grandes acertos: uma ótima direção de atores e um roteiro bem escrito e executado, que exalta a história e não cai no conto da paisagem bonita. Tulpan acerta porque é universal.
Belo filme.
Fica a expectativa pelo encontro com a Tulipa, a torcida pela libertação e os risos pelos singelos e hilários momentos.
Adorei.
Um abraço.
Pois é, Faéu… Pena que se explore muito pouco do cenário…
“nem que seja pra ver a imagem da vila onde Tarkovsky nasceu, hoje uma área alagada, onde a única coisa que se vê é o topo de uma enorme cruz.”
de fato 🙂