O Grande Hotel Budapeste

O filme anterior de Wes Anderson, Moonrise Kingdom, parecia catalisar o projeto de cinema que o diretor vinha desenvolvendo desde seu primeiro longa. A melancolia, a afetação e a obsessão por uma paleta de cores milimetricamente calculada, marcas das quais o cineasta sempre abusou, de repente, apareciam sob um spotlight gigante. Tudo é levado ao extremo, desde o comportamento blasé dos personagens às cores da fotografia e direção de arte. As características que geralmente eram os maiores trunfos para que Anderson desenvolvesse uma linguagem e um universo próprios tinham chegado a um grau de estilização que situavam o filme numa dimensão artificial que se resolve em si mesma. A forma havia vencido o conteúdo.

O Grande Hotel Budapeste segue um fluxo completamente oposto. Embora todas as marcas do diretor estejam lá, Wes Anderson utiliza cada uma delas como argamassa para criar uma base sólida e levantar essa nova obra. E não como um fim. A história fictícia do famoso concierge de um hotel europeu refinado no início dos anos 30 tanto tem elementos dos romances de Stefan Zweig, influência assumida pelo diretor, quanto o espírito livre das screwball comedies, as comédias malucas que Hollywood produzia a rodo nesta mesma década e na seguinte, com cortes e diálogos rápidos e ousados. Ernst Lubitsch, um dos principais autores destes filmes, é outra referência imediata para o diretor. Essa moldura traz frescor para o filme de Anderson que soma à trama uma história de assassinato. Deliciosa.

Que ninguém se engane pelo elenco numeroso, a maioria aparece em uma ou duas cenas. Mas isso não importa muito quando se tem Ralph Fiennes. O homem está possuído no papel principal, mas sua personagem só funciona com tanta plenitude por causa de sua interação com Tony Revolori, que aos 17 anos estreia em longas-metragens e é um coprotagonista com uma impressionante desenvoltura. Os dois atores compram a proposta do diretor e constroem, junto com ele, a atmosfera do filme. A personagem de Fiennes, seríssimo no trabalho, austero com seus subordinados e extremamente sedutor para as clientes que atende com dedicação, sobretudo quando elas são senhoras mais velhas, parece simples, mas mostra um ator dedicado aos detalhes, que se adapta ao vai e vem de ritmos do filme.

Ora Monsieur Gustave é um lorde, ora um tirano desbocado. Sua moral é quase tão duvidosa quanto os roteiros das screwball comedies, cheios de safadeza implícita. Essa versatilidade do protagonista reproduz a versatilidade do próprio filme, que combina gêneros, faz homenagens e citações, coloca sua plástica a favor da narrativa e, em meio à corrida maluca das personagens, seja vivendo a trama seja apenas vivendo, encontra momentos para que falar de responsabilidade, identificação e paternidade, este, um dos braços de um dos temas mais caros a Wes Anderson, a família. Se em seu filme anterior, a tentativa de fazer um trabalho pessoal demais colocou a obsessão estética acima de suas discussões, em O Grande Hotel Budapeste, desviando o foco com uma arquitetura aparentemente menos pretensiosa, Anderson conseguiu encaixar todas suas boas neuroses.

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[The Grand Budapest Hotel, Wes Anderson, 2014]

Comentários

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10 comentários sobre “O Grande Hotel Budapeste”

  1. Assisti, ou melhor, tentei assistir esse filme ha algumas semanas. Digo que “tentei” porque tive que sair da sala do cinema apos 1 hora de apresentacao e essa foi a primeira vez que tive que fazer isso.
    Achei o filme pessimo…mas horrivel mesmo…intragavel. Certamente gostei da fotografia do filme, do vestuario, dos cenarios da decada de 30 que gusto muito, mas o filme, ate onde assisti, e pura bagunca.
    Personagens que voce ano sabe quem sao e de onde vieram, dialogos apressados que voce nao entende nada, Tony Revolory que se esquece que eh um rapaz de 17 anos na decada de 30…age como se fosse um estudante universitario Americano de 2014.
    Ralph Finnes arrogante, chato, confuso, irritante.
    Enfim, a confusao reina nesse filme, alem de varios atores estarem realmente perdidos, com uma pessima representacao.
    Meia (1/2) estrela para esse filme, para ser bonzinho.

  2. O filme é simplesmente maravilhoso.
    Prende a atenção do inicio ao fim. Rico em detalhes que hoje em dia já não se encontra mais nos empregados, pois estão maus acostumados em querer servir apenas no intuito de ser bem remunerado em gorjetas.

  3. Assisti quando viajava de volta para o Brasil pela TAM, e realmente é um dos melhores filmes que vi ultimamente, desde o inicio quando a menina se aproxima do busto do escritor que escreveu o romance (deve ser 2013), que remete ao mesmo quando esta preparando uma entrevista ( em 2002) conta com o encontrou-se no passado com o proprietario (em 1980) que lhe conta o que ocorreu em 1930 ele nos captura, ao mesmo tempo que da um andamento leve não deixa de incluir referencias melancolicas ao inicio da guerra, a brutalidade da mesma.

    Realmente é para se ver varias vezes

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