Batman v Superman: A Origem da Justiça

O excesso parece ser o fantasma dos filmes baseados nos heróis das DC Comics. Se a escala dos eventos – e, consequentemente, das cenas de ação – era a maior aposta e o maior pecado de O Homem de Aço, esta continuação quer trabalhar numa intensidade ainda maior. É a tentativa de estabelecer de uma vez por todas – e com anos de atraso -, um universo interligado para os personagens da editora no cinema, tentando recuperar o tempo perdido em relação ao extremamente bem-sucedido projeto de sua rival, a Marvel. Mas enquanto a megalomania não enforca os planos capitaneados por Zack Snyder, discípulo do grande culpado por isso tudo, Christopher Nolan, o fã de quadrinhos pode surpreender com um filme cheio de equívocos, mas com belíssimos acertos como Batman v Superman: A Origem da Justiça.

Antes, seria interessante observar que a questão da escala em que os eventos acontecem nesse filme parece ser uma consequência direta do perfil dos principais personagens da editora. Se os nomes fortes da Marvel surgiram nos anos 60, no embalo da contracultura, da luta pelos direitos humanos e no meio de um cenário onde grande parte da população americana era contrária à Guerra do Vietnã, os ícones da DC nasceram durante a Segunda Guerra Mundial, uma época muito mais romantizada, em que heróis como Superman, Batman e Mulher-Maravilha rapidamente se transformaram em símbolos de justiça e liberdade. Os quadrinhos surgiam tanto como arte quanto como indústria e, ao contrário do que aconteceu com a Marvel, que humanizou seus personagens para apostar na identificação com o público, a DC investiu na inspiração. Ela queria deuses e foi isso que criou.

O roteiro de Chris Terrio e David Goyer tem extrema consciência do tipo de material que tem em mãos e, obedecendo o crescendo inaugurado pelos Batmans de Nolan e consolidado na reapresentação do Superman, assinada pelo mesmo Snyder que dirige este novo filme, tem a intenção de ir além, levando os conflitos para um outro nível. Encaixar esses personagens mitológicos num contexto realista, também cortesia dos filmes de Nolan, é um desafio que a dupla cumpre em parte. As cenas de ação são, mais uma vez, longas, exaustivas, excessivamente plastificadas, estreladas por um vilão pouquíssimo carismático, mas ganham um importante aliado no objetivo maior do filme, que já era conhecido por quem acompanha os bastidores desde que o projeto foi anunciado numa convenção de quadrinhos: lançar a semente da Liga da Justiça.

Nesse sentido, as decisões tomadas para o desfecho do filme parecem ter sido as melhores possíveis porque, além de arriscadas, são bastante emocionais, oferecendo um contraponto tão gigantesco quanto a escalada de destruição que vemos nas cenas de ação. Essa preocupação em não deixar o emocional de lado mesmo com as obrigações de blockbuster está espalhada pelo longa, que, além de seguir a história de O Homem de Aço, precisa reintroduzir o homem-morcego nesse novo contexto já que os filmes de Christopher Nolan não tinham compromisso em alimentar um universo compartilhado. A escolha por um Batman mais velho, ousada, que deve muito em corpo e espírito ao herói imaginado por Frank Miller em “O Cavaleiro das Trevas”, deu certo porque explora uma maturidade até então inédita para o personagem no cinema.

A chegada de Terrio parece domar o gosto de Goyer pela grandiloquência, ordena melhor as narrativas paralelas, estabelece com relativo sucesso o clima de conspiração e encontra espaço para desenvolver os personagens. Para se ter uma ideia, as cenas de bastidor são infinitamente superiores às de batalha. E, contrariando todos os prognósticos, Ben Affleck se encaixa muito bem ao papel, numa interpretação surpreendentemente sóbria, com seu vigilante recebendo tratamento em pé de igualdade ao messias humilde de Henry Cavill. O bom mocismo do ator mais uma vez parece bem adequado ao espelho do herói, desta vez mais fiel a sua essência do que no longa de 2013. E, se vemos mais uma releitura da cena clássica em que Bruce Wayne perde os pais, vemos também a exploração de um elo bem interessante entre os dois personagens e que tem a ver com duas figuras elementares em suas formações.

A participação da Mulher-Maravilha, de quem temos uma palhinha bastante razoável, é muito bem resolvida e Gal Gadot não faz feio, o que desperta mais interesse ainda pelo longa solo da personagem que Patty Jenkins dirige para o ano que vem e que parece ser um filme de época. Por outro lado, Jesse Eisenberg abraça forte seu Lex Luthor, mas o tratamento que o personagem recebe do roteiro é meio questionável porque aproxima Luthor das características de outro dos pilares da vilania no universo DC, o Coringa. Em vez do estrategista racional que nas HQs, numa sacada genial, se tornou presidente dos Estados Unidos, temos um psicótico cheio de tiques que Eisenberg defende com competência, mas talvez não da maneira mais correta.

No entanto, o grande problema é que muitas das boas ideias do filme não são levadas a cabo de maneira satisfatória até o final: o duelo entre Batman e Superman parece uma briga de moleques, o truque de Luthor para enganar o Homem de Aço é simples demais e o “grande” vilão de ação do filme transforma o campo de batalha numa interminável sequência digital. Mas há uma coisa que realmente funciona nesse filme e que passa por sentimentos que talvez sejam difíceis de colocar em palavras. A reunião gradual e respeitosa dos três maiores ícones da DC Comics, pela primeira vez juntos num mesmo filme, ao mesmo tempo em que abraça um novo espectador, aponta diretamente para o emocional do leitor dos quadrinhos, remete a uma espécie de origem de tudo. Ou à nova metamorfose de um universo. Ter a consciência de estar presente nesse momento de criação, ainda mais depois de um desfecho tão sentimental, é extremamente recompensador para quem nunca deixou de acreditar em suas lendas.

Batman v Superman: A Origem da Justiça EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha
[Batman v Superman: Dawn of Justice, Zack Snyder, 2016]

Comentários

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33 comentários sobre “Batman v Superman: A Origem da Justiça”

  1. Não tem o menor sentido, o cara é de aço, mais rápido que uma bala, tem super força, capaz de alterar a rotação da terra girando-a ao contrário, super visão, aliás, não só super visão, como visão a laser, super audição, capaz de ouvir seletivamente quem fala do outro lada da cidade. E esse cara vai enfrentar o Batman? Batman que muitas vezes apanhou do pinguim e no seu último filme levou uma surra do vilão Bane, em Batman o cavaleiro das trevas ressurge. Não, isso é uma afronta a minha infantil inteligência.

  2. uma coisa sobre a historia das duas empresas Marvel e DC .. ambas começaram antes da segunda guerra … uma das cenas mais historias da Marvel foi na primeira edição do capitão America em que ele aparece na capa dando um soco em hitler>>> (https://translate.google.com.br/translate?hl=pt-PT&sl=en&u=http://marvel.com/comics/issue/7849/captain_america_comics_1941_1&prev=search)<<< isso em 1941 ja quando existia outros heróis … agora minha opiniao sobre o filme .. gostei simmmm do filme achei incrivel .. principalmente da mulher maravilha… sei que poderia ter sido melhor, mas mesmo assim ele ainda é muito bom

  3. Melhor crítica que li até agora sobre esse filme.

    Sou Marvel desde criancinha, fã do Spider.

    Mas esse filme é bom. E está sendo injustiçado pelos críticos.

  4. A crítica mais sólida e racional que li até agora.
    A maioria por ai dizendo que o filme é um lixo, nada faz sentido, ou que o filme está todo nos trailers mostrado anteriormente (se fosse diferente seria apedrejado tanto quanto pois falariam que teria sido propaganda enganosa ¬¬), e por ai vai… Ou seja, oque andam escrevendo sobre o filme é algo irracional e sem nexo. Acham defeitos sem sentido e toscos. E aqui vejo uma crítica que trate o filme não como perfeito mas também não o cúmulo do lixo como a maioria vem fazendo sem sentido.

  5. penso, que poderia ser melhor, muita espera , muita mídia e ficou sim a sensação de uma estória fraca, a primeira hora serviu pra encher linguiça, faltou uma melhor estória, na segunda hora , o filme na minha opinião foi bom, dando uma nota de zero a dez ; fica aqui um 6,5. Espero que o filme da guerra civil não decepcione também.

  6. Concordo completamente que o filme poderia ter sido bem melhor e que parece ter sido lançado às pressas para tentar recuperar o “tempo perdido”. Mas acredito que ele pode até virar um filme cult pelas alusões à religião e mitologia e simplesmente por ser, como você disse, o primeiro filme que reune os três personagens. Outra coisa são as dicas dos novos personagens que irão aparecer. Aqui segue uma resenha do Batman v Superman na qual vou mais a fundo sobre esses traços mito-religiosos.

  7. Fui assistir esperando um filme de médio a bom, saí o considerando bom. O que me incomodou foi a velha história: Lois Lane em perigo, surge o Superman para salvá-la, e ela, Lois, tem duas cenas decepcionantes, uma na luta entre os dois, a outra no edifício, poderiam ter deixado de lado, nada acrescentou e ficou forçada a primeira e boba a segunda.

    1. “fica ainda aquele sentimento de que poderia ser melhor !!”

      Senti exatamente a mesma coisa assim que sai do cinema, satisfeito porem com um vazio

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