Branca de Neve

É meio óbvio afirmar isso, mas primeira coisa que vem em cabeça quando se assiste o segundo filme de Pablo Berger é O Artista, de Michel Hazanavicius. Impossível fugir da comparação: os dois longas prestam homenagens aos primeiros anos do cinema, desenvolvendo histórias fabulares em narrativas silenciosas e em preto-e-branco. Se um resgata o misto entre inocência e desencanto de uma Hollywood clássica, o outro parte de um clássico da literatura infantil para recuperar um período da história de seu país. Em comum, além de atores mímicos e ausência de cores, a utilização maciça de belas trilhas sonoras que reforçam o encantamento que ambos os filmes têm como objetivo.

O fato é que, depois de se ter visto um filme com forma e artifícios tão parecidos, Branca de Neve perde um pouco de sua novidade. Plasticamente, o diretor acerta na composição da fotografia, rica de contrastes e cheia de momentos bonitos, mas encontra algumas soluções visuais contemporâneas para uma estrutura que remete a um cinema feito há mais de 80 anos. Em algumas cenas, a nostalgia não parece apenas um objetivo, mas uma muleta para vender o filme. Berger usa algumas premissas do conto dos irmãos Grimm, transportando a história para a Andaluzía dos anos 20, colocando as touradas na espinha dorsal da trama. Essa apropriação dá singularidade ao filme, que não fica refém de sua fonte, mas cria em certa medida um conflito entre a pretensão realista e a natureza fabular do material.

As idiossincrasias de Branca de Neve provocam um estranhamento interessante. O filme é bem melhor quando mira no que cria e não no que transforma. A mocinha toureira e os toureiros anões ganham da história de amor, mas Maribel Verdú, como a madrasta má, é um caso à parte. A versão latina de uma das maiores vilãs do imaginário popular ganhou novas texturas na interpretação da atriz, incorporando deliciosos cacoetes de folhetim à personagem. Mas nem ela tira um certo sabor de que este filme foi planejado demais para parecer tão espontâneo, puro, até ingênuo. Se assumisse a condição de homenagem de forma mais direta em vez de tentar provocar um efeito genuíno, Berger talvez tivesse dirigido um filme não apenas competente, mas mais sincero. Neste aspecto, O Artista leva uma certa vantagem.

Branca de Neve EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha
[Blancanieves, Pablo Berger, 2012]

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