Há aqueles que dominam o texto, que são geniais com os atores, que sabem contar uma história como ninguém, mas os cineastas que se dedicam de verdade ao cinema não são tantos. Brian De Palma é um dos maiores cineastas realmente cinematográficos. Durante toda duração de Dália Negra, esta certeza nos bate à porta. De Palma não depende do texto para nos oferecer sua narrativa e sabe transformar em imagens, em imagens belíssimas e cuidadosíssimas, as palavras que contam a história da vez, uma história noir.
A composição do filme, os detalhes de foco e os elegantes movimentos de câmera, que se move tão suavemente que parece fazer carinho no roteiro, se sobrepõem à ação. A forma como De Palma e sua equipe excepcional conduzem o longa é mais atraente do que a história que sai do livro de James Ellroy, a história do inocente frente a um mundo perverso. O filme negro respeita, recicla e reafirma as regras de um gênero tão delicioso. Josh Hartnett, o que parecia improvável, tem uma performance acertada e é bastante crível no papel central.
A sinfonia seca de De Palma segue lenta, mas no ritmo que parece ser o mais correto e, em muitos momentos, é brilhante, mas algo dá errado no canto final por causa de muita rendição às regras do noir. As soluções para o crime que batiza o filme são concentradas num espaço pequeno demais de celulóide e estas soluções ganham tentáculos múltiplos que parecem exagerar no número de reviravoltas, na tentativa de intrincar a trama. Pecado que compromete a estrutura e até o interesse por Dália Negra, cujo roteiro, como a segunda entrada da outrora excelente Fiona Shaw, ganha ares histriônicos.
Dália Negra
[The Black Dahlia, Brian De Palma, 2006]
Mas De Palma nos leva justamente a deixar a narrativa em segundo plano; sequer o considero um whodunit, embora aqui se insista em resolver um caso que nunca foi resolvido.
Também achei que o filme não se encaixa exatamente no gênero noir, mas faz uso dele para ir por um caminho mais pessoal do artista (a assinatura do diretor continua forte, embora não seja um de seus filmes mais extremamente idiossincráticos).
Aliás, aquele histrionismo da Fiona Shaw no final é a cara do De Palma, lembra John Lithgow e Michael Caine em outros filmes dele.
Chico, era exatamente essa a ressalva que eu ia fazer naquele almoço: o final do filme se atropela. Um abraço!
Acho que para mim no alfred só entraria em direção de arte e figurino… E concordo com o Marcelo, sobre a direção ser bem melhor que o roteiro. Exatamente o que achei de Miami Vice, aliás.