Dália Negra

Há aqueles que dominam o texto, que são geniais com os atores, que sabem contar uma história como ninguém, mas os cineastas que se dedicam de verdade ao cinema não são tantos. Brian De Palma é um dos maiores cineastas realmente cinematográficos. Durante toda duração de Dália Negra, esta certeza nos bate à porta. De Palma não depende do texto para nos oferecer sua narrativa e sabe transformar em imagens, em imagens belíssimas e cuidadosíssimas, as palavras que contam a história da vez, uma história noir.

A composição do filme, os detalhes de foco e os elegantes movimentos de câmera, que se move tão suavemente que parece fazer carinho no roteiro, se sobrepõem à ação. A forma como De Palma e sua equipe excepcional conduzem o longa é mais atraente do que a história que sai do livro de James Ellroy, a história do inocente frente a um mundo perverso. O filme negro respeita, recicla e reafirma as regras de um gênero tão delicioso. Josh Hartnett, o que parecia improvável, tem uma performance acertada e é bastante crível no papel central.

A sinfonia seca de De Palma segue lenta, mas no ritmo que parece ser o mais correto e, em muitos momentos, é brilhante, mas algo dá errado no canto final por causa de muita rendição às regras do noir. As soluções para o crime que batiza o filme são concentradas num espaço pequeno demais de celulóide e estas soluções ganham tentáculos múltiplos que parecem exagerar no número de reviravoltas, na tentativa de intrincar a trama. Pecado que compromete a estrutura e até o interesse por Dália Negra, cujo roteiro, como a segunda entrada da outrora excelente Fiona Shaw, ganha ares histriônicos.

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[The Black Dahlia, Brian De Palma, 2006]

Comentários

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13 comentários sobre “Dália Negra”

  1. Tiago, eu realmente não gosto do final. Acho que se ele fosse, pelo menos, diluído em mais uns dez minutos, funcionaria melhor para mim.

    Milton, não quis depreciar o livro de maneira alguma, o que eu quis dizer é que, em certa altura, eu gostava muito mais de acompanhar a direção do De Palma do que necessariamente a história que estava sendo contada. Mas quanto ao inocente versus mundo perverso, essa é uma história clássica do noir.

    Eu gosto bastante dos atores, em maior ou menor graus, embora não ache nenhum espetacular. Quanto a Hilary, gosto dela tb, mas em “Menina de Ouro” ela está ótima.

  2. De acordo com o Milton. Acho que todos os atores (em maior ou menor grau, mas em especial Hillary Swank, Fiona Shaw e Aaron Eckhart) captaram esse espírito de “evocação do gênero” nas atuações. Ouso dizer que é a melhor atuação da Hillary Swank até agora.

  3. Chico, apesar de ter uma impressão parecida sobre o filme e também achar o roteiro complicado (lato sensu), acho difícil determinar se foi no roteiro que a narrativa tomou o rumo meio atabalhoado.

    E mais: “A forma como De Palma e sua equipe excepcional conduzem o longa é mais atraente do que a história que sai do livro de James Ellroy, a história do inocente frente a um mundo perverso. “. Acho que não é bem por aí. Primeiro porque a história do livro não é exatamente essa – nem acho que a do filme, mas entendi o que tu disse. Segundo, porque a história do livro é interessantíssima.

    Agora, o acho mais curioso é que vejo o que tu chamou como “rendição às regras do noir” como uma escolha evidente para que outros aspectos do filme apareçam, mas preferia rever o filme para falar sobre isso. Acho que a abordagem está mais para Londe do Paraíso (Haynes) que para LA Confidencial, ou seja, está mais para a evocação de um gênero do que para a utilização em si das regras dele.

    Nesse sentido, acho a cena histriônica com a Fiona Shaw um dos grandes momentos do filme.

  4. Na verdade, acho que não ficou claro no texto, eu gostei muito do trabalho do De Palma no filme, mas achei que o roteiro, ou o texto, atrapalharam o fim da história.

    Não acho a Fiona Shaw tão Nora Desmond assim não. Eu tinha adorado ela na primeira cena em que ela surge, pensei até em votar nela no Alfred, mas o histrionismo final estragou tudo.

  5. Mas se o De Palma é um cineasta realmente cinematográfico, aquela confusão e rendição às regras do noir, no final, é o de menos, não? Acho até que faz parte da proposta toda: um noir pintado com cores fortes, histrionismo, exagero depalmiano (ugh, foi mal) mesmo.

    Fiona Shaw no final é Norma Desmond cuspida e escarrada. Bastante divertida.

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