Plínio Marcos é como Nelson Rodrigues. Ícone maldito. Mexeu em obra dele, cutucou num vespeiro. José Joffilly, do medíocre A Maldição de Sanpaku, resolveu se atrever e fazer sua versão de Dois Perdidos numa Noite Suja. O material não parecia muito animador, mas o resultado é surpreendente. Joffilly transfere a ação do roteiro para Nova York e faz uma alteração radical: transforma Paco numa mulher. A ousadia já vale um ponto para o cineasta. O texto, rico, ganha novo vigor e o envolvimento entre os personagens impressiona pela coesão.
Debora Falabella é uma grande atriz. Sua interpretação de Paco é furiosa. O problema talvez seja que suas interpretações sempre sejam furiosas, mas não há demérito aqui. Paco não tem amarras e Debora também não. Rasga o verbo, a roupa e a carinha de bebê para ser a personagem. Roberto Bontempo, mais discreto, faz seu contraponto perfeito. Vive um personagem difícil (poderia passar despercebido) com intensidade e sutileza. Os dois dão novas cores ao texto de Plínio Marcos numa simbiose raro vista no cinema, sobretudo no brasileiro, cujo maior pecado ainda é a falta de bons roteiros. Mesmo que não seja um grande filme, Dois Perdidos numa Noite Suja é uma das boas surpresas da cinematografia nacional nos últimos tempos.
Dois Perdidos numa Noite Suja ½
[Dois Perdidos numa Noite Suja, José Joffilly, 2002]