Las Acacias

O argentino Pablo Giorgelli veio ao Brasil para lançar seu primeiro trabalho num longa-metragem, o belíssimo Las Acacias (leia a crítica aqui), que já tinha sido exibido na Mostra de Cinema de São Paulo. Entre os compromissos oficiais, o cineasta, que ganhou o Câmera de Ouro, prêmio para diretores estreantes no Festival de Cannes, deu uma entrevista exclusiva para o Filmes do Chico, onde explica, entre outras coisas, como conseguiu dirigir um bebê de cinco meses.

Las Acacias é um filme bem diferente dos longas argentinos que costumam chegar ao Brasil. Como você definiria seu filme?

Existem várias definições que podem caber bem. Em primeiro lugar, eu diria que é um filme clássico, popular até, apesar da forma austera que é apresentado. É uma história de transformação interior, de reencontro consigo mesmo e com um outro caminho, viajando.

Em alguns dos muitos festivais de que participei, definiram o filme como um western e, claro, muita gente chamou de road movie, o que de fato é. Mas a definição mais simpática veio de um espectador, que me disse: “seu filme não é um road movie, mas um truck-movie (filme de caminhão)”, o que, talvez, inaugure um novo gênero.

Para mim, é essencialmente uma história sobre paternidade, sobre um homem e sua dificuldade em se relacionar com os outros, uma história de amor no final.

Você segue um roteiro rígido ou abre espaço para a espontaneidade? Seu filme dá a ideia de que muito do que acontece surge de forma espontânea. Você adapta seu roteiro ao processo?

Estou feliz que você pense que muito acontece de forma espontânea, é um grande elogio! Mas, com exceção de algumas situações, o filme é muito fiel ao script. Foram quase dois anos somente escrevendo o roteiro, um longo processo de maturação em que eu estava “descobrindo” o filme. Em todas as cenas, vou ensaiando e adaptando o que não funciona, um diálogo aqui,; outro ali. Mas, é claro, também aconteceram alguns “pequenos milagres” coisas que surgiram nas filmagens. Mas a maior parte do filme é muito parecido com o script, não é um filme improvisado.

Las Acacias é um filme que, com poucas palavras e muito silêncio, consegue ser uma experiência extremamente intensa. Como você imaginou a narrativa do filme?

As primeiras versões do roteiro foram muito mais “faladas”, mas finalmente descobrimos que para contar a dificuldade desse caminhoneiro para se comunicar, muitas vezes, o silêncio era melhor do que as palavras. E assim chegamos à versão final. Mas eu sinto que em meu filme, o silêncio é um “silêncio narrativo”. Eles falam pouco porque o filme é sobre isso. Mas, quando eles têm que falar, eles falam, como na parte final, por exemplo.

Gérman de Silva já tinha alguns filmes no currículo, mas Hebe Duarte está em seu primeiro trabalho no cinema. Único até agora, segundo o IMDB. Como você chegou aos dois?

Foi um processo longo – e bonito – que durou quase um ano de pesquisa. A princípio, minha idéia era fazer o filme com um caminhoneiro verdade, então eu pesquisei durante muito tempo em rotas e paradas de caminhões. Conheci e conversei com muitos caminhoneiros, o que me abasteceu com muitos detalhes desse mundo, mas, no fim das contas, nenhum deles funcionou. E eu acho que tem a ver com a questão de não improvisar e seguir o script. Com os não-atores, é difícil, porque você geralmente você tem que se adaptar a eles e a coisa não funcionava. E foi assim que eu decidi fazer um elenco de atores e, graças a Deus, apareceu Germán, que é um gênio! Nós entendemos rapidamente. Ele compreendeu o espírito de Rubén e o tom em que eu queria filmar, por isso foi muito fácil para mim. Em vários lugares, conversando com o público, me perguntam: “ele é um caminhoneiro ou um ator?.” Acho que é o maior elogio para trabalho dele.

O caso de Hebe é ainda mais curioso porque ela era assistente de produção da pessoa encarregada de procurar atores no Paraguai. Seu trabalho era procurar possíveis Jacintas para o papel. Depois de um ano de viagem a Assunção, procurando minha Jacinta sem encontrar, resolvemos fazer um teste com Hebe e foi incrível! Eu digo que ela não é uma atriz porque não trabalha com isso, mas a verdade é que é uma tremenda atriz! Sem Hebe e sem Gérman, este filme não seria o que é.

http://www.youtube.com/watch?v=D-fK1fKMEA4

A pequena Anahí é um achado. Ela ajuda a deixar o filme encantador. Difícil encontrar uma criança tão pequena e tão expressiva. Foi fácil encaixá-la às cenas ou você teve que escrever a partir das reações dela?

Ter encontrado Nayra, a bebê que vive Anahí foi um milagre! Ela apareceu apenas um mês antes de começar as filmagens e nos testes ela já era exatamente como é no filme, um bebê muito especial, muito conectado com os outros e com o meio tudo o que estávamos fazendo. E ela tinha apenas 5 meses!

Eu não lembro das cenas com ela terem sido muito difíceis talvez porque já tenha passado muito tempo, mas acho que nosso mérito foi planejar as filmagens de acordo com a bebê, seguir seu tempo, esperá-la, sem apressá-la, sem forçar nada. Se ela estava de bom humor, eu rodava cenas bem humoradas e quando ela estava cansada ou com fome – e a mãe dela não estava nas filmagens o tempo todo -, eu dizia: “agora ela está chorando com fome, vamos rodar as cenas de choro. Acho que facilitou prever no roteiro as situações pelas quais passa qualquer beber (comer, dormir, chorar). Definitivamente, um bebê não atua, ele simplesmente é o que ele é em frente a uma câmera.

Este é seu primeiro longa-metragem e você ganhou o Camera d’Or no Festival de Cannes. Como isso influenciou na carreira de Las Acacias?

Muitíssimo. O filme estreou comercialmete em muitos países, foi convidado para um monte de festivais, foi vendido para várias televisões em todo o mundo e foi visto por muitas pessoas. E, depois de Cannes, o filme recebeu mais de 30 prêmios. Em San Sebastian, em Londres, em Oslo, em Bombaim, etc. E foi muito bem recebido pela imprensa e pelo público, o que nem sempre acontece. Eu nunca imaginaria algo assim nem nos meus melhores sonhos. Eu acho que o filme consegue estabelecer contato com o público. É algo que o filme consegue por si mesmo, que não tem a ver com premiações.

Qual sua expectativa pro lançamento do filme no Brasil?

Estou muito animado! Eu sempre quis estrear no Brasil e no México e isso não foi fácil. Na verdade, no México ainda não está confirmado. Meu filme foi lançado em muitos países e fez sucesso em alguns, como na França, por exemplo, onde mais de 130 mil pessoas o viram. Mas na América Latina foi muito difícil. Estreamos no Uruguai, na Argentina e, agora, aqui. Para mim, é importante que o filme seja visto no cinema, numa sala cinema. E eu espero que o espectador se conecte ele.

Las Acacias inicia, no Cinesesc, sua trajetória brasileira. Depois do lançamento na capital paulista, a Vitrine Filmes planeja levar o filme para o Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba e Recife.

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