Extermínio 2

A primeira seqüência de Extermínio 2 é uma das melhores cenas do ano, um exemplo para filmes que tentam dar credibilidade ao horror não apenas como gênero, mas como manipulador dos sentidos. O susto, instrumento para a manifestação do horror, lida com a perda, ainda que momentânea, dos parâmetros que definem a normalidade do humano. Mesmo muito simples, o susto é algo não tão fácil de se provocar.

O que o gênero de filmes de zumbi, criado e perpetuado por George A. Romero, faz é trazer este instrumento para o questionamento das prioridades do homem. Longe dos padrões que nos enquadram nas regras de civilidade e convívio social, ou mais dramaticamente, longe dos preceitos de certo-e-errado e bom-e-mau, ao ser humano resta a animalesca luta pela perpetuação.

Em 2003, Danny Boyle retomava estas reflexões com seu Extermínio, filme que, além voltar a discutir os limites do homem, era bastante eficiente numa capacidade que deveria ser inerente a todo e qualquer cinema: mover fisicamente o espectador. O conjunto imagem-edição-cenografia-música do longa sabia estabelecer o desespero e a falta de padrões como pilares de um ambiente fascinante e assustador.

A idéia de uma continuação parecia bastante desagradável e desnecessária. Como retomar um ciclo que parecia tão bem fechado no material original, ainda mais sem os cabeças da equipe criativa? Missão complicada, mas que Extermínio 2 resolve com certa destreza. A já citada seqüência de abertura abre um flashback, com eventos paralelos aos do primeiro filme, criados com igual eficiência. E, mesmo que o filme não ofereça depois dela nada tão impresionante, o roteiro caminha bem por terreno seguro.

Entendo o porquê do Ian não ter gostado (embora eu goste muito do que vi da Rose Byrne até agora) na mesma medida em que percebo as razões desta moça ter amado tanto.

A reintrodução da doença surge com uma boa idéia e os acenos para uma eventual cura abre novas possibilidades. A exploração de um conflito familiar, que poderia ter sido mais bem aproveitado, traz outra esfera para a discussão maior, a perda dos padrões da relação amor-afeto-carinho: a perpetuação não está mais na reprodução, mas na sobrevivência a qualquer custo.

A formação de um novo grupo ganha contornos de missão e para quem, como eu, adora HQs de heróis, os interesse cresce bastante. A jornada adquire um objetivo maior e, mesmo em meio a uma bela sucessão de lugares comuns, dos sacrifícios ao militarismo incômodo, o filme trabalha com certos conceitos fora de moda como altruísmo e doação. Conceitos meios ingênuos que nem ganham tratamento especial no longa, mas de que eu gosto de ser lembrado de vez em quando.

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[28 Weeks Later, Juan Carlos Fresnadillo, 2007]

Comentários

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7 comentários sobre “Extermínio 2”

  1. Seus raciocínios tem muito sentido, Ian, mesmo assim eu gosto do filme. A cena de abertura é muito boa. Quanto às crianças, nenhum problema com elas. O papel da Rose poderia ter essa função mais dramática mesmo, mas acho que a culpa é do roteiro. Ela é a condessa ou baronesa ou duquesa amiga da Kirsten no “Antonieta”.

  2. Gostei bastante de Extermínio, um dos poucos filmes de zumbis que achei realmente interessante e “assustador”, espero gostar da continuação tb.
    Bjos

  3. é que algumas coisas realmente não se encaixam, Chico.

    Se os zumbis morreram de fome, é porque não havia mais comida, correto? daí, das duas, uma: ou eles se alimentavam de carne humana, e daí não haveria escapatória para a mulher naquele instante em que ela é cercada por uma porção de zumbis (e eles pareciam muito famintos naquela seqüência). Se a fome fosse causada por escassez de alimentos, a mulher também teria morrido junto com os outros.

    E daí não há como afirmar que eles eram burros o suficiente para procurar comida, pois o Robert Carlyle sabia muito bem o que estava fazendo, para conseguir escapar do exército norte americano e ir atrás dos filhos a todo custo…

    o problema do filme é esse, os argumentos são extremamente frouxos, e são desmontados frente a qualquer contestação.

    Um outro erro é deixar boa parte da carga dramática do filme nas costas de duas crianças e da Rose Byrne que, repito, faz o mesmo papel que em Sunshine, dando a impressão de que ela não vai muito além. E acredita que não lembro dela em ‘Maria Antonieta’?

    Eles tiveram a sorte de contar com o Perrineau (Waaaaaaaaalt). Além de ser um bom ator, conseguiu protagonizar uma das melhores cenas heróicas, se não A, do ano.

    vamos discutindo.
    eu lembro de ter comentado, mas acho que meu sono foi tanto que eu não consegui terminar… afe.

  4. Eu não vi o filme, mas tava aqui me deliciando com seus textos, quando observei que nas (ou nOs?) pick-ups toca kaiser chiefs e não pude me furtar de dizer que adoro.

    Já está devidamente instalado por aqui, chicolino?

    um beijo.

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