Filmes com temas polêmicos ou imagens chocantes não faltam no line up do Festival do Rio. Além do ótimo O Ato de Matar, documentário sobre o massacre na Indonésia, o evento traz filmes como cenas de tortura, sexo explícito, adolescentes usando drogas, atores pornôs e estrelas em momentos de escatologia. Veja cinco exemplos:
The Canyons ½
[The Canyons, Paul Schrader, 2013]
Paul Schrader tenta convencer o espectador de que a história que ele está contando é importante. Para os papeis principais, ele escala uma atriz decadente, que, entre uma temporada e outra na prisão, tenta reerguer o que sobrou de sua carreira, e um ator pornô. Mas a simples presença de Lindsay Lohan, de cujo comportamento o próprio cineasta afirmou ter se tornado “refém”, não garante a substância que o filme pretende ter. A escolha de uma protagonista decadente não significa que o cineasta desvendou a decadência dos bastidores do mundo do cinema em Hollywood.
Um Estranho no Lago
[L’Inconnu du Lac, Alain Guiraudie, 2013]
Este filme já apareceu antes por aqui. A cada dia que passa, Um Estranho no Lago cresce na memória. A cena final do filme é espetacular, radicalizando a discussão que Alain Guiraudie faz sobre até onde vai o desejo (e talvez o amor). O diretor propõe uma operação curiosa: passa boa parte do filme sendo explícito, há nus frontais e de sexo oral, em cenas que dissecam um ambiente de pegação gay, e repetitivo, causando a banalização das imagens e, desta forma, invadindo os desejos do protagonista. Guiraudie filma o fluxo dos personagens sem romantismo, mas parece apaixonado pelo movimento circular daqueles homens em busca de saciedade. Econômico, o longa é todo rodado em cenário único, às margens de um lago, utilizado como ponto de pegação por homossexuais de todas as idades. que serve para estudar o comportamento gay. As cenas noturnas são as mais bem filmadas, com o mínimo de luz insinuando os personagens.
Heli
[Heli, Amat Escalante, 2013]
Se renega os excessos dramáticos em favor de um cinema mais “direto”, Amat Escalante, em Heli, comete outros excessos. As cenas de tortura são filmadas com brutalidade, muita brutalidade, e com imagens explícitas de espancamento e até queimadura de órgãos genitais. A intenção pode ser chocar, denunciar a violência da situação específica e da situação social, mas o impacto desses excessos causam, como sempre, a impressão de que o cineasta quis fazer de seu filme, um filme importante, sincero, sem firulas, que vai direto ao ponto.
Obsessão
[The Paperboy, Lee Daniels, 2012]
O conceito da personagem de Nicole Kidman é interessante: uma mulher que não consegue represar sua sexualidade, o que termina agravando seu estado mental, já bem frágil. A insistência de Lee Daniels em invadir o terreno do ridículo é ousada, mas o diretor fraco não consegue dar conta do projeto e o ridículo, em vez de tentativa de linguagem, vira ruim mesmo. Kidman é bastante prejudicada por isso. Pega um papel medíocre e devolve com uma interpretação meia-boca. A cena em que ela urina no personagem de Zac Efron, que não está ruim, além de não ter o mínimo impacto, é completamente gratuita. Onde foi parar aquela grande atriz?
Spring Breakers: Garotas Perigosas ½
[Spring Breakers, Harmony Korine, 2013]
Se fosse só um filme alienado e amoral que retratasse o comportamento alienado e amoral do jovem americano, Spring Breakers seria muito mais interessante, mas esse negócio de querer fazer poesia com câmera lenta e “reflexão” sobre a perdição da juventude não leva Harmony Korine muito longe de um Kids, que ele mesmo escreveu, com garotas de biquini e machine guns. O diretor acompanha suas quatro protagonistas na versão americana para a Semana do Saco Cheio, a “pausa da primavera” do título, em que os estudantes ganham folga antes de voltar ao batente. Nesse intervalo em que vale tudo, as moças vão parar na Flórida, onde se envolvem com álcool, drogas, sexo e um assalto, um cardápio perfeito para Korine divagar sobre o futuro de uma geração.
Estará por aí Lacrau do diretor português João Vladimiro, assisti em Curitiba, no último final de semana, o filme é um pé nos colhões e o sujeito é um bruxo… A poética e o volume que ele oferece ao som e à imagem, a textura e a sutileza com que ele trata esses dois personagens, sem perder o olhar crítico para com a realidade, ora margeando o alegórico, outras, o mi(s)tico, num passeio ao sacro e ao profano das relações com do homem com a natureza, tornam o filme uma obra prima, um verdadeiro caosmótico Deleuzeano. É contemporâneo no sentido neobarroco. Este, sim, não pode ser perdido.