Foxcatcher

Foxcatcher deveria ter sido lançado em 2013, mas não ficou pronto em tempo hábil. Bennett Miller pode ter demorado a encontrar o tom que gostaria de impor ao filme, a versão de uma história real sobre um evento trágico que, como o título brasileiro ressalta, abalou os Estados Unidos no final dos anos 80. E foi exatamente no presságio da tragédia que o cineasta, que assina apenas seu terceiro longa ficcional, encontrou sua inspiração. O filme parece anunciar o destino trágico das personagens na fotografia que muitas vezes os aprisiona nos cenários imenos, na trilha sonora que impõe melancolia à história e até no desempenho discreto do trio principal. Esse tom solene marca, move e causa estranheza a Foxcatcher.

Miller remonta a história de quando o milionário americano John du Pont – um homem riquíssimo, mas que nunca conseguiu se fazer útil em sua própria família -, resolve convocar os irmãos Mark e David Schultz, medalhistas olímpicos, que já não estavam em suas fases mais prósperas, para montar uma equipe de luta livre e disputar os jogos de Seul. O diretor acerta ao materializar o vazio nas vidas dos personagens principais. Steve Carell está especialmente assustador, além de transfigurado pela maquiagem, no papel do milionário de fala mansa e olhar doentio e, embora ronde a caricatura, geralmente escapa ileso e ofereça uma melancolia dolorida. A personagem carrega o peso de uma certa herança aristocrática tipicamente americana.

Ele é o adulto que nasceu em berço de ouro, mas que, provavelmente por causa de sua sexualidade dúbia, nunca foi levado a sério. É o homem que, se não consegue ser herói, escolheu comandar heróis da vida real – atletas, lutadores, medalhistas olímpicos -, para tentar virar o protagonista que sempre almejou. É o homem que busca aprovação, que se coloca no papel de mestre mesmo que não tenha bagagem para ser um exímio professor e que talvez amenize seus instintos secretos no contato físico que tem com seus “pupilos”. Carell consegue traduzir toda essa complexidade numa interpretação difícil, que encontra no atleta arredio vivido por Channing Tatum, um ator que cresce a cada papel, um oposto complementar perfeito para deixar fluir suas peculiaridades.

Mark Schultz, o verdadeiro, reclamou de seu retrato no filme e das liberdades históricas de Miller (os irmãos nunca teriam estado ao mesmo tempo na fazenda que abriga a equipe montada por Du Pont), mas a personagem criada por Tatum foge dos esteréotipos, apresentando um homem que não cabe em si mesmo. Um herói que não se conforma em ter perdido seu posto. Mark Ruffalo, com seu jeito tímido de falar, completa o elenco, dando corpo a um bom coadjuvante.

De um lado é possível reconhecer um esforço gigantesco do diretor em tornar tudo muito importante. Do outro, esse esforço parece realmente ter capturado um sentimento de estranhamento, como se fosse o filme realmente se realizasse como o prelúdio de uma tragédia. Foxcatcher talvez seja incômodo por seu diretor ter encontrado a maneira mais fiel de apresentar homens verdadeiramente tristes, buscando uma maneira de materializar o vazio de suas vidas, revelando para a América o que os americanos têm de mais frágil.

Foxcatcher EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha½
[Foxcatcher, Bennett Miller, 2104]

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