Cornelia é uma mulher inconformada. Ela mora com o marido e frequenta festas dos novos ricos romenos, mas, apesar disso, vive lamentando a distância do filho, Barbu, um homem crescido que hoje vive com a namorada e mal tem contato com a mãe. Cornelia não aceita a ingratidão de seu “bebê”, a quem dedicou toda sua vida, para quem decidiu toda a vida. Uma vida que o filho rejeitou. O imenso vazio que partida de Barbu deixou, Cornelia supre em longas reclamações para a amiga Guta, alfinetando a nora e comprando presentes para a empregada que mãe e filho dividem para monitorar os passos do “garoto”.
As lamúrias de Cornelia ficam para segundo plano quando Barbu se envolve num acidente de carro e mata uma criança atropelada. O instinto de preservação enterra suas queixas e, justamente quando mais ela sentia falta disso, Cornelia ganha a oportunidade de exercer seu papel de mãe uma nova vez. Da única maneira que ela conhece, se atirando com toda a força para cima de quem ameaça seu filho. Sua pequena estatura contrasta com a postura de leoa. Cornelia não tem limites – muito menos pudores – para proteger Barbu. Mesmo que seus atos fujam da lei ou da ética. Esta é sua missão, esta é sua motivação.
Quem ama protege, acredita a protagonista de Instinto Materno. Mas qual o limite para o amor de uma mãe?, pergunta o cineasta Calin Peter Netzer, diretor do longa que ganhou o Urso de Ouro e o Prêmio da Crítica Internacional no Festival de Berlim neste ano. Mais do que mostrar a dedicação de uma mãe para ajudar o filho, mais do que investigar o comportamento de uma nova classe social que seu país conheceu pós-Cortina de Ferro, o diretor retrata uma relação obsessiva em que uma das pessoas anula a outra. O filho é sufocado pela mãe, para a qual só existe este tipo de amor.
A protagonista, Luminita Gheorghiu, é uma das maiores atrizes romenas dos últimos anos. Assumiu papeis de maior ou menos importância em filmes como A Morte do Sr. Lazarescu, A Leste de Bucareste, e 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias. Neste filme, é dona de uma performance avassaladora. Sem perder a sensibilidade, sua Cornelia devora tudo e todos em sua volta. Sua fúria, seu poder de persuasão, sua mania involuntária de controlar a vida de quem está por perto só esbarra no descaso de seu filho.
Netzer administra essa relação da maneira menos óbvia possível, abrindo espaço para pequenas delicadezas no meio de um doloroso processo de enfrentamento. Encontra lugar para que cada personagem defenda sua verdade. Cornelia e Barbu, o mesmo Bogdan Dumitrache de Quando a Noite Cai em Bucareste ou Metabolismo, cada um a seu modo, protegem seus pontos de vista, suas individualidades, suas necessidades básicas. A mãe precisa invadir a vida do filho para se sentir completa. O filho precisa se afastar das asas da mãe para poder respirar. Na Romênia ou em qualquer lugar do mundo, administrar limites e pilotar amores não é tarefa fácil.
Instinto Materno
[Pozitia Copilului, Calin Peter Netzer, 2013]
Um pensamento sobre “Instinto Materno”