Jogos Vorazes: Em Chamas

Trocar de comando é sempre arriscado, seja no mundo dos negócios, seja no cinema – lembrando que, muitas vezes, esses dois campos são sinônimos. Ainda mais quando se está falando de uma franquia direcionada ao público adolescente, baseada numa coleção de best-sellers e cujo primeiro capítulo de sua versão cinematográfica fez um inesperado sucesso. Mesmo com tantos prós, Gary Ross não retornou à cadeira de diretor em Jogos Vorazes: Em Chamas. E por decisão dele mesmo. Os motivos que o fizeram declinar do convite pouco importam. O fato é que seu substituto, Francis Lawrence, fez muito melhor.

Na visão do novo diretor, o filme anterior cumpriu seu papel de introduzir o espectador àquele universo e isso é o suficiente. Em Chamas não tem nenhuma preocupação em contextualizar os personagens para quem não assistiu ao primeiro capítulo desta história, é um filme que se assume como sequência do começo ao fim. A decisão tem algo de surpreendente porque os grandes estúdios têm mania de tratar os espectadores com fraldas e chupetas, o que gera sequências desnecessárias e repetitivas e infla os filmes. Lawrence, sem qualquer pudor, faz a história correr e, em outra opção arriscada, coloca a ação em segundo plano.

Em sua essência, este novo longa é um filme político. Lawrence descreve com detalhes a transformação de Katniss Everdeen depois da vitória nos jogos. Gasta sequências inteiras para mostrar como a protagonista se acomodou em sua natureza inquieta, como ela parece disposta a aceitar o papel que lhe é imposto e como passa a perceber que não está sozinha. Jennifer Lawrence, pós-Oscar, ganha mais espaço para desenvolver a personagem e suas relações com o namorado Gale e o parceiro Peeta. O foco do diretor é nos bastidores e mecanismos da sociedade distópica em que a história acontece. Katniss é jogada nas engrenagens do sistema e colocada à prova.

Os novos jogos só entram em cena depois de uma hora e meia de filme. E, numa terceira decisão polêmica, Francis Lawrence não se interessa muito em mostrar as mortes dos participantes, o que o primeiro filme tinha de sobra e que costuma atender às expectativas de um público adolescente ávido por ação. Embora esta opção sacrifique alguns personagens – como Mags, que poderia ganhar mais tempo de filme e ser melhor desenvolvida – parece atender aos planos do diretor que se dedica a traduzir o crescente clima de insurreição em Panem.

De forma discreta, o filme ganha um tom épico que não esquece sua natureza de espetáculo, mas procura dar credibilidade a sua discussão sobre os excessos do poder. Ciente de suas obrigações para com os dois lados, Lawrence nos entrega um delicioso filme pop com 134 minutos de pouca ação e muita insinuação que fizeram uma sala de cinema vibrar em pleno início de feriadão. Poucas vezes, nos últimos tempos, Hollywood traduziu tão bem o “pão e circo”. E sem concessões.

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[The Hunger Games: Catching Fire, Francis Lawrence, 2013]

Comentários

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2 comentários sobre “Jogos Vorazes: Em Chamas”

  1. Concordo com o Chico. Se o 1º filme apesar de bem realizado não passava de um filme de caçada agora o tom muda e podemos ver caminhos muito mais interessantes para a história. Jennifer Lawrence parece que gostou da mudança e incorpora na personagem todas as novas nuances.

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