Nos últimos anos, o conceito de road movie tem sido reinventado. Alguns novos cineastas, sobretudo na América Latina, deixam de lado o personagem (ou o grupo de personagens) colocado na estrada diante das mais variadas situações para percorrer caminhos mais interiores. Essa trajetória – tão espacial quanto introspectiva – geralmente é adotada por diretores que aplicam métodos rígidos à estrutura de seus longas, como faz Lisandro Alonso na jornada de redescoberta do protagonista de Liverpool, ou por cineastas que filmam com a espontaneidade “calculada” de Las Acacias.
O estreante Pablo Giorgelli parte de um plot até comum para realizar seus experimentos: Ruben é um caminhoneiro que vai dar carona para uma mulher que precisa atravessar a fronteira entre Argentina e Paraguai. Jacinta leva no colo seu bebê, Anahi. Mas o cineasta evita soluções fáceis: os personagens são apresentados em doses homeopáticas, os diálogos são raros e quase sempre duram alguns segundos, a história dos três protagonistas, sobretudo Ruben, é uma quebra-cabeças que dura quase que toda a extensão do filme. Giorgelli não faz questão de deixar o espectador confortável.
Sua câmera é naturalista, capturando, com muita observação, todo o vazio que existe naquela relação que está começando a se desenhar, mas curiosamente o tom é de alguma leveza para se narrar o que pode vir a ser um encontro romântico. O que torna Las Acacias ainda mais interessante é como a forma do filme contrasta com sua simplicidade. Ao contrário de outros com um projeto estético semelhante, o longa quase nada tem de empostado e boa parte disso se deve à forma como Giorgelli utiliza o personagem mais peculiar do filme, a pequena Anahi.
Com uma sutileza invulgar, o roteiro, assim como Ruben, parece se render aos encantos da menininha, e ambos vão se transformando aos olhos do espectador. A aparente frieza na condução da trama revela suas delicadezas, assim como o protagonista revela suas motivações. O homem cujo peso da biografia o impede de abrir espaço para qualquer coisa que não seja sua aridez acha no encontro inusitado um ponto de conversão. O cineasta argentino demonstra um talento raro para extrair de criança tão pequena o necessário para fazer de um filme tão simples uma pequena revolução narrativa.
Las Acacias
[Las Acacias, Pablo Giorgelli, 2011]
Pena estar passando apenas em uma única sala aqui em Sampa. Esses distribuidores/exibidores estão de brincadeira. No mais, parabéns pelo “site” muito legal mesmo.
Célio, neste caso, o lançamento do filme é uma iniciativa louvável. A Vitrine Filmes é pequena e está começando a investir em produções estrangeiras. E o Cinesesc, uma das melhores salas de São Paulo, é um lugar especializado em filmes fora do circuitão.
Esse filme é maravilhoso. Impossível não se render à pequena Anahi.