[o novo filme policial]


A reencarnação de Miami Vice não poderia mesmo ter sido um sucesso em solo norte-americano. Michael Mann faz o que pode ao longo de mais de duas horas para quebrar as expectativas do espectador, seja em relação a uma adaptação de uma série ultrapop, a um filme policial, a uma superprodução. Em boa parte deste tempo, as cenas de ação são substituídas por imensos períodos de diálogos e, principalmente, pelo que mais parece interessar ao diretor: a exploração do espaço.

A ação que se vê no filme é quase uma não-ação. A câmera de Dion Beebe segue em sua jornada em busca de novas texturas e enquadramentos, assumindo uma postura estética que às vezes se sobrepuja ao funcional. Essa obsessão que cresce a cada filme de Mann termina por jogar o longa num outro plano, numa espécie de dimensão paralela dos filmes policiais, muito além de um bangue-bangue urbano. Todos os quadros são trabalhados pra que seja retirado deles o que há de mais cinemático. É um filme na sua real acepção.

Os personagens parecem interessar menos do que a ambientação – e aí, leia-se imagem, música e sonoplastia. O melhor conjunto do ano. Possivelmente o melhor dos últimos anos. A trilha de John Murphy, com apropriações do Mogwai e de outros, consegue dar um clima muito estranho ao filme, algo entre o etéreo e o épico. Tanto que o que mais provoque choque no espectador seja o quão pouco dramático o filme é. Por mais que exista um romance naqueles moldes de proibido – muito eficiente, por sinal -, ele é um ponto no meio do universo à parte que Mann nos apresenta.

Curioso que num filme sobre uma dupla, o Rico de Jamie Foxx tenha sido quase deixado à parte. Não grandes destaques de elenco, mas Gong Li está encantadora e sensualíssima em todas as cenas. Mann é um diretor bastante masculino, mas segue caminhos muito diferentes e distantes do padrão de um cinema para homens. Seus filmes são musculosos, mas tem tratamento quase poético. E, se como filme policial, Miami Vice se apresenta assumindo outra face, sua resolução fica cada vez mais interessante do ponto de vista de crescendo narrativo, numa sucessão de cenas empolgantes. Só pelo fato de fugir de um cinema fácil, este filme merece muita atenção. Mas há muito mais.

[miami vice ]
direção e roteiro: Michael Mann, baseado em série de TV criada por Anthony Yerkovich.
elenco: Colin Farrell, Jamie Foxx, Gong Li, Naomie Harris, Ciarán Hinds, Justin Theroux, Luis Tosar, Barry Shabaka Henley, John Ortiz, Elizabeth Rodriguez, Domenick Lombardozzi, Eddie Marsan, Isaach de Bankolé, Ana Cristina de Oliveira, John Hawkes.
fotografia: Dion Beebe. montagem: William Goldenberg e Paul Rubell. música: John Murphy. desenho de produção: Victor Kempster. figurinos: Michael Kaplan e Janty Yates. produção: Pieter Jan Brugge e Michael Mann. site oficial:
miami vice. duração: 134 min. miami vice, Estados Unidos, 2006.

nas picapes: [we’re not here, mogwai]

Comentários

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13 comentários sobre “[miami vice]”

  1. Gostei muito do seu texto sobre Miami Vice…o filme tem sido um tanto suubestimado a meu ver. Michael Mann é um grande diretor. Realmente o Rico foi pouco explorado, mas acho que as personagens são bastante importantes para a história. Eles tem muita textura, são perturbados embora não haja muita importancia em explicar-lhes e dramatizar…foi também assim com o Colateral.

  2. Ah… Os dois sao fodões. Mas Miami é mais bonito, sei la… Aquela cena do tiroteio e a do resgate não me saem da cabeça!

    Abraço

    Márcio

  3. Mas o do Lee é mais complexo, abrangente, relevante, contemporâneo e charmoso. E tem uma trilha sonora mais legal. “Miami Vice” vale o ingresso, mas não foi, para mim, uma experiência marcante.

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