A Ilha dos Milharais
[სიმინდის კუნძული / Simindis Kundzuli, George Ovashvili, 2014]
Não sabemos de onde vêm e quem são os protagonistas de A Ilha dos Milharais. Eles nunca aparecem fora do cenário que dá título ao filme, a não ser quando estão chegando de barco ao lugar ou coletando mandeira na outra margem do rio. Esse mistério ajuda a dar ao filme uma aura de delicadeza que invade um campo quase místico embora o longa, o segundo do diretor, trabalhe basicamente com o realismo. O mais bonito no filme talvez nem passe pelos personagens, avô e neta num recorte do que é um período do ano em suas vidas, mas em como a passagem do tempo transforma a paisagem. O cenário reduzido, um barranco de terra que surge sazonalmente no leito de um rio que divide a Geórgia e o Azerbaidjão, e onde os moradores aproveitam para plantar milho, é recompensado por uma fotografia que sempre oferece um novo ângulo do lugar. George Ovashvili quer retratar o ciclo da vida. E o faz com tantos detalhes que a sutileza perde um pouco de sua força. Se não quisesse parecer tão importante, o filme poderia ser mais sucedido, mas ainda assim há um punhado de belas cenas que ajudam a transformar esta numa experiência de rara beleza mesmo para um “filme de festival”.
Jauja
[Jauja, Lisandro Alonso, 2014]
Jauja é um lugar mítico onde, diz a lenda, as pessoas não precisam trabalhar e há abundância e felicidade. Lisandro Alonso invade o mito transportando seus elementos para uma Argentina de paisagens improváveis no século 19. Em sua Jauja, o protagonista é um dinamarquês enviado para o novo mundo com sua filha. Tanto ele quanto ela parecem perdidos numa terra estranha até que ela se deixa encantar por um morador local e foge. É então que o cineasta transforma Jauja, o filme num road movie em que tempo e espaço se confundem, uma jornada existencial que dura uma eternidade e onde o presente pode visitar o futuro e os personagens podem se perder na imensidão. Essa jornada do protagonista, vivido por um dedicado Viggo Mortensen, essa busca em si, parece importar mais a Alonso do que a personagem ou a amarração da trama. Depois de algum tempo de procura, a exaustão do caminho inóspito leva Gunnar Dinesen para um estado de transe onde a realidade é o que menos interessa. Talvez tenhamos finalmente chegado em Jauja.
A Fuga ½
[A Blast, Syllas Tzoumerkas, 2014]
O cinema grego recente parece se utilizar de um certo estado de demência para retratar o caos sócio-político-financeiro que atingiu o país nos últimos anos. Syllas Tzoumerkas escolheu um caminho diferente: A Fuga, seu segundo longa-metragem, é um filme urgente, nervoso, que com uma câmera tensa, uma montagem acelerada e anacrônica, e uma protagonista sempre prestes a explodir, tenta inserir o espectador no redemoinho que devassou a Grécia. Nesse sentido, o filme parece mais fiel ao desespero da condição grega do que Attenberg, por exemplo, mas a intensidade de seu retrato é tanta que se transforma num tipo de esquizofrenia cinematográfica e compromete não apenas a fluidez da trama como a própria credibilidade da proposta. Angeliki Papoulia, atriz de um marco do cinema contemporâneo do país, Dente Canino, é o grande trunfo do filme. Assume os excessos da personagem sem excessos de interpretação e justifica seu comportamento e seu desejo sexual. Pena que o filme não consiga acompanhar seu ritmo.