Com o bloqueio do meu antigo blogue pela graciosa Globo.com, meus textos publicados lá – muitos, em mais de um ano de blogue – focaram perdidos no ciberespaço. Por algum motivo, eu consegui recuperá-los por inteiro. Aproveitando o mote da estréia em circuito de Sob a Névoa da Guerra, reposto aqui o texto-comentário sobre este filme e Na Captura dos Friedmans, ambos vistos durante a Mostra de Cinema de São Paulo, no ano passado.

Mas daí, surge uma dúvida: textos antigos devem ser repostados, caso haja justificativa, neste espaço? Que tal vocês me ajudarem a decidir?

a) não, Chico, de jeito nenhum. Este espaço só deve ter textos novos; coloca os antigos num outro lugar;

b) sim, Chico, por quê não? Os textos são seus, se houver algum motivo para repostá-los, não vejo problema;

c) Chico, cai na real, ninguém quer ler textos velhos; joga tudo fora.

Enquanto vocês me ajudam a decidir:

FILMES DO CHICO reloaded

DAS VERDADES E DAS MENTIRAS

Dois documentários apostam no formal como arma narrativa para estabelecer a a forma mais pura de uma história

Nos últimos anos, o conceito de documentário tem, cada vez mais, sido revisto e ampliado. Os documentaristas evitam a perseguição da imparcialidade (amplamente discutida e acertadamente desacreditada), deixando os filmes mais pessoais e menos jornalísticos, o que, ao mesmo tempo, enriquece as possibilidades de narrativa e de concepção e pode enfraquecer a função básica de um documentário: informar. A questão aqui não é tentar ser neutro, mas oferecer ao espectador todos os elementos necessários para que ele chegue a uma conclusão. O documentário mais famoso dos últimos anos – e um dos mais polêmicos da história – Tiros em Columbine é o exemplo perfeito. Na ânsia de fazer um filme contundente, Michael Moore apostou numa narrativa rica e cheia de desdobramentos, mas comete pecados capitais: se intromete na informaçãoo fazendo de si mesmo uma espécie de anti-herói dono da verdade. Seu filme, excepcionalmente bem idealizado e editado, sofre então uma queda de credibilidade porque defende com tanto radicalismo suas idéias que se torna questionável. Afinal, onde está o foco?

Na Captura dos Friedmans, do ex-compositor Andrew Jarecki, resgata o conceito do documentário desgastado com o passar do tempo. Aqui, não há revoluções narrativas ou engenhosas criações estéticas, o alvo é apenas contar uma história. Jarecki escolhe a fantástica epopéia da fam?lia Friedman, que aparentemente se apresenta como uma família normal, mas aos poucos revela a instabilidade das relações e dos comportamentos dentro de uma mesma casa. O pai, professor conhecido e respeitado, é acusado, junto com o filho mais novo, de pedofilia e abuso sexual. É aí que o diretor mostra sua habilidade. A perversão dos atos e fatos fica dúbia o tempo inteiro. Jarecki apenas fornece as informações para que o espectador decida no que acreditar. E faz isso com uma impressionante habilidade para colher e editar depoimentos. O grau de desequilíbrio de cada integrante da família Friedman, inclusive daqueles que não foram acusados de crime algum, é revelado em cada entrevista. Jarecki consegue, sem malabarismos e com inteligência, cumprir o papel de um documentarista. E é isso que faz de Na Captura dos Friedmans um filme muito melhor do que parece. E que faz o espectador sair pesado do cinema.

De outro lado, Errol Morris acredita que um personagem é o suficiente para a construção de um documentário. Sob a Névoa da Guerra tem um bom personagem: o ex-secretário de Defesa dos Estados Unidos, Robert McNamara. Seus depoimentos são o mote para se contar anos da história militar norte-americana. A partir daí, Morris elabora um filme sobre bastidores de fatos políticos, com um grande trabalho de pesquisa para conseguir imagens sobre todos os períodos citados. As entrevistas são polêmicas e contundentes, mas o fato de centrar o filme na verdade de um homem apenas enfraquece muito a informaçãoo. Não seria melhor uma entrevista no tradicional formato pingu-pongue? No conjunto, o filme sofre por ter sido dirigido de uma maneira velha, perdida no tempo. Parece muito com um daqueles documentários que você assiste por acaso num canal a cabo. O formato quadrado também deixa o filme chato. O mérito é jogar luz sobre aspectos ainda sombrios de cenas importantes da história. Mas filme mesmo, faltou.

NA CAPTURA DOS FRIEDMANS
Capturing The Friedmans, EUA, 2003

Direção: Andrew Jarecki.

Elenco: Arnold Friedman, Elaine Friedman, David Friedman, Seth Friedman, Jesse Friedman, Howard Friedman, John McDermott, Frances Galasso, Joseph Onorato, Judd Maltin, Abbey Boklan, Ron Georgalis, Scott Banks, Debbie Nathan, Jerry Bernstein, Peter Panaro, Lloyd Doppman, Jack Fallin.

Fotografia: Adolfo Doring. Edição: Richard Hankin. Direção de Arte: Nava Lubelski. Música: Andrea Morricone. Produção: Andrew Jarecki e Marc Smerling.

SOB A NÉVOA DA GUERRA
The Fog of War: Eleven Lessons from the Life of Robert S. McNamara, EUA, 2003

Direção: Errol Morris.

Elenco: Robert McNamara.

Fotografia: Peter Donahue. Montagem: Doug Abel, Chyld King e Karen Schmeer. Direção de Arte: Ted Bafaloukos. Música: Philip Glass. Produção: Julie Bilson Ahlberg, Errol Morris e Michael Williams.

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