Os Miseráveis

Os grandes elogios à pequena participação de Anne Hathaway em Os Miseráveis são bem mais do que merecidos. A atriz aparece em cerca de 20 minutos do filme, os únicos momentos de respiro que o épico musical de Tom Hooper permite ao espectador. Embora a história de Fantine seja uma história triste e pesada, a performance de Anne – e não apenas seu talento vocal – areja o longa, graças, sobretudo, aos méritos e a luminosidade próprios da atriz. Mesmo que “I Dream a Dream”, seu principal número solo, seja uma música kitsch – não muito diferente do restante da trilha sonora original da obra -, na interpretação de Anne, a canção ganha um peso emocional genuíno.

Pena que Fantine precise sair de cena para que a história do clássico de Victor Hugo continue porque o filme perde muito sem a senhorita Hathaway. O longa é uma adaptação do musical de Claude-Michel Schönberg e Alain Boublil, que transporta a obra original para os palcos. Os Miseráveis, o espetáculo, é um dos mais famosos do gênero, mas se Victor Hugo fez um trabalho universal sobre liberdade, a peça é destinada a agradar um público específico. Perfeito para quem tem disposição para este produto, que certamente tem um espectador fixo; torturante para quem não tem paciência para um musical pasteurizado, com um eterno e desinteressante tom épico.

No conjunto, as músicas do filme (e do espetáculo teatral) são enfadonhas. As canções, no entanto, traduzem fielmente o espírito do filme, que é como um enorme bolo massudo, de difícil digestão. E não se trata de gostar ou não de musicais, mas do tipo de material e do como esse material foi transporto para a tela. A direção de Tom Hooper não é exatamente ruim, mas o academicismo do cineasta o deixa aprisionado a uma fórmula desgastante. Os Miseráveis é quadrado e acomodado. Quando o diretor resolve ousar, ele erra. O que explica que um filme com uma preocupação realista tenha personagens e figurinos como os de Sacha Baron Cohen e Helena Bonham-Carter, ambos vestidos como num filme de Tim Burton? Mas nem dá pra reclamar muito já que eles cantam algumas das músicas mais interessantes do filme.

Hugh Jackman comprova que tem talento para cantar e sua performance no começo do filme é realmente bem boa, mas logo se rende ao clima instalado por Hooper e, assim como Russell Crowe, Amanda Seyfried, Eddie Reymane e “grande elenco”, cai na burocracia. E essa burocracia arrasta o filme até o final. O fato dos atores cantarem “ao vivo” se perde diante dos maneirismos desse filme massudo e interminável. Hooper não conseguiu fugir das armadilhas. Só a direção de arte impressiona. Em alguns momentos. Os Miseráveis sofre pela falta de leveza, pela incacidade de fluidez, pelo ranço. Mas, pesando bem, talvez esta seja a forma exata de se adaptar um material tão maçante como este.

Os Miseráveis EstrelinhaEstrelinha
[Les Misérables, Tom Hooper, 2012]

Comentários

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37 comentários sobre “Os Miseráveis”

  1. Apesar do filme ser um tanto cansativo, achei-o ótimo.
    Creio que foi cansativo pois, por não saber inglês, tive que ler as legendas.
    Quem não “curte” um filme deste nível, só pode ser vítima das dezenas de produções enlatadas hollywodianas que somos obrigados a engolir anualmente!

  2. Incluo-me entre os que foram arrebatados por “Os Miseráveis”. Particulamente, a opção de Hooper em filmar um filme totalmente musical em ambientes realistas e com uma fotografia sem truques, deu um tom ao filme que me agradou muito, embora não saiba definir exatamente. Ficou talvez mais “europeu”, se assim pode dizer. Gostei muito da interpretação do Hugh Jackman, para mim ele foi a alma do filme. Mas a Anne está igualmente fantástica nos 20 minutos em que aparece. Ela realmente soube emocionar. Entendo as críticas feitas ao filme, mas sinto que, assim como outros, vi outro filme que boa parte da crítica não viu. Sem dúvida é um filme cansativo, mesmo para quem curte musicais (e não me incluo). E sem dúvida não é um filme perfeito. Mas é também um filme que não faz concessões com suas opções, nem ao público, e mesmo assim tem feito grande sucesso de bilheteria. Particularmente, procurei embarcar no espírito do filme, e a experiência, ao menos para mim (mas de muitos outros cinéfilos, tenho certeza) foi bastante emocionante. Abraços.

  3. Sendo admiradora do livro e série Os Miseráveis me impressionou a riqueza que o filme proporcionou, a história em si é longa, é cansativa, e também é envolvente o que não deixou o filme pesado, claro que para quem nada sabe e nem quer saber dos clássicos e prefere ficar no superficial este deve ter sido um filme massante, no mínimo. Sendo assim, o filme me impressionou, de fato pensei que fosse ser cansativo por ser todo cantado e me surpreendeu, foi incrível, com muitas modificações da série, mas mesmo assim impressiona.

    Obs.: Assistir filmes de histórias clássicas que agregam valores ao ser humano significa abrir a mente para absorver a carga de emoções, se não entendeu a densidade da história é melhor ficar no crepúsculo.

  4. O filme tem tudo pra ser cansativo e maçante sim, só que ele é suave e cativante também, me cativou como um todo…Assistiria mais uma vez!

  5. Acho que vimos filmes diferentes!
    Mas, de fato, para quem tem como o melhor filme brasileiro dos últimos dez anos O SOM AO REDOR, é de entender que você faça tantas ressalvas a OS MISERÁVEIS.
    É uma questão de gosto, realmente.

    1. É um filme pra quem tem espírito destemido, os desafios enfrentados pelos personagens passam lonje de ser fáceis, então por que o clima do filme que os retrata deveria ser? Com certeza sou um espectador que admirou esse trabalho e que discorda da forma que a frieza crítica de alguns serve de mola para ataques ao resultado apresentado.

  6. Filme chato. E a direção do Hooper eu achei bem menos que acadêmica. Achei ruim mesmo. Ajuda a tornar o filme mais lento e cansativo. E o que a direção de arte tem de legal no início perde-se por completo na hora da barricada no beco diagonal.

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