Os filmes indicados e o que eu achei deles:

Batman Begins , de Christopher Nolan.

É extremamente feliz a idéia de estruturar o roteiro a partir do medo. Isso pontua todo o filme, contamina desde o tratamento dado a Bruce Wayne até as personagens que o cercam. O clima sombrio está de volta depois do carro alegórico de Joel Schumacher, Batman está mais maduro. Os flashbacks, possível herança do mais famoso filme de Nolan, que poderiam seguir o caminho da pieguice ou tentar excessivamente fundamentar as motivações da personagem, são utilizados com habilidade, nos momentos certos. Indicação: fotografia.

Boa Noite, e Boa Sorte. , de George Clooney.

Com um tema como este (história real, fato político-histórico), outro cineasta faria um filme de três horas, mas George Clooney fechou o seu na metade deste tempo. Curioso que ele pareça ter muito mais (não numa avaliação aborrecida) por causa da quantidade de material que ele apresenta. Clooney se aproveita com precisão de imagens, depoimentos, entrevistas, gerando um longa quase documental, mas econômico e direto, com fotografia habilidosíssima e boa montagem. David Strathairn está fantástico. Indicações: filme, direção, ator, roteiro original, fotografia e direção de arte.

Capote , de Bennett Miller.

O mais honesto no filme é como Miller, ao contrário do tratamento que dá à sexualidade do protagonista, expõe suas orientações éticas bastante questionáveis. Em muitos momentos, Truman Capote é um crápula, um aproveitador, mas o roteiro sempre dá relevo a isso, humanizando a personagem. É nessa complexidade, nessa indefinição que Capote ganha mais força. Indicações: filme, direção, ator, atriz coadjuvante e roteiro adaptado.

O Castelo Animado , de Hayao Miyazaki.

Belíssima nova experiência sensorial do diretor japonês, o mesmo de A Viagem de Chihiro. Toda a concepção de imaginação, de construção da realidade viram um tratado sobre o fantástico e como ele surge em nosso cotidiano. Indicações: animação.

Crash – No Limite , de Paul Haggis.

O que mais me incomoda neste filme é sua visão determinista de como todos estamos destinados a nos corromper de alguma maneira, de como estamos fadados ao racismo, à intolerância, a irmos de encontro à ética. Haggis não acredita no ser humano enquanto elemento ativo diante de seu próprio cotidiano. A corrupção é questão de tempo. Ou ainda não se teve a chance de se corromper ou a fatalidade conspira para que o herói vire vilão. Indicações: filme, direção, ator coadjuvante, roteiro original, montagem e canção.

A Fantástica Fábrica de Chocolate , de Tim Burton.

A concepção visual, espetacular, mais uma vez parece ser o foco, mas é apenas uma arma do cineasta para cooptar a história para si. O diretor trata de, mesmo diante de uma obra de alcance infanto-juvenil, dar mais idade ao texto, ressaltando seus aspectos mais cruéis e mórbidos. Johnny Depp consegue se encaixar perfeitamente ao tom que Burton busca. Seu Willy Wonka é perturbado, agressivo, vingativo, impiedoso. Indicação: figurinos.

Guerra dos Mundos , de Steven Spielberg.

O talento para criar o suspense, para envolver o espectador, característica presente em quase toda sua obra, está em seu estado mais avançado. E Spielberg não se acovarda e, inclusive, se aproveita desse dom para incorporar o espírito original da obra, pessimista, implacável, violento. Consegue construir seqüências físicas, exaustivas, onde o limite entre a tela e quem assiste desaparecem. Indicações: efeitos visuais, edição de som, som.

Harry Potter e o Cálice de Fogo , de Mike Newell.

Mike Newell devolve o caráter mais amplo à série, inclusive porque a história pedia isso. É obviamente delicioso – mais uma vez – acompanhar Harry nos mirabolantes desafios mágicos do torneio que virou a espinha dorsal do longa. Há inclusive uma cena maravilhosa, debaixo d’água, quando descobrimos quais os tesouros que Harry tem que recuperar numa das provas. Indicações: direção de arte.

O Jardineiro Fiel , de Fernando Meirelles.

Eu nunca tive nada contra Hollywood. Por sinal, lá foram feitos muitos dos melhores filmes da minha vida. As paisagens artificialmente belíssimas já eram naturalmente belíssimas então, pouca coisa mudou. Eu adoro e defendo a ingenuidade. Não acho que seja justo julgar o engajamento de cada um. A denúncia pela denúncia seria chata de qualquer maneira, mas o filme é muito bem construído como thriller e se resolve muito bem (ainda que ingenuamente bem). Indicações: atriz coadjuvante, roteiro adaptado, montagem, trilha sonora.

Johnny & June , de James Mangold.

A música, justamente o que deveria ser o carro-chefe de um filme como este tem função meramente ilustrativa. O longa de James Mangold é careta e extremamente burocrático. Reese Whitterspoon está notável, sobretudo nas primeiras cenas. Já Joaquin Phoenix, embora sempre correto, só consegue estar pleno quando solta a voz. Por sinal, uma bela voz. Indicações: ator, atriz, som, figurinos, montagem.

King Kong , de Peter Jackson.

O tamanho no filme de Peter Jackson não é apenas documento, é em função dele que o diretor constrói seu filme. E é sendo do tamanho que é que o longa permite suas alternâncias de ritmo, que revelam suas nuances múltiplas. De crônica social a filme de aventura, de superprodução a épico rômantico sobre um amor (im)possível, Peter Jackson faz um filme quase perfeito. Quem diria que o casal mais arrebatador de 2005 seria tão lindo? Indicações: direção de arte, edição de som, som, efeitos visuais.

A Lula e a Baleia , de Noah Baumbach.

É uma das melhores crônicas familiares norte-americanas em muito tempo. Faz uma belíssima mistura de melancolia com referências pop (seja nas citações do roteiro, seja na trilha) sem aquele quê de ‘olha como eu sou inteligente’ e consegue dar densidade aos dramas das personagens, em plenos anos 80, a década perdida. O elenco é uma pérola: desde os dois garotos a Laura Linney, sempre bem, e Jeff Daniels, talvez no melhor papel (e interpretação) da sua carreira. Indicações: roteiro original.

A Luta pela Esperança , de Ron Howard.

Estamos na América, a terra dos bravos e da liberdade, a terra da justiça, a terra dos sonhos. Nessa América, os heróis são os homens comuns, que inspiram os outros homens comuns em seu difícil dia-a-dia. Fazer um filme que não tem nenhuma nuance e que se limita à primeira e rasa versão da história pudica e débil que pretende contar é quase criminoso; é brincar com a inteligência do espectador. Pelo menos, uma coisa vale a pena: Crowe leva muita porrada. Indicações: ator coadjuvante, montagem, maquiagem.

Marcas da Violência , de David Cronenberg.

Tom Stall escolheu sua parceira e com ela teve seus dois filhos. E nada vai fazer com que ele desista da família dele ou do futuro que ele desenhou pra ela. Nada que venha de fora, nada que venha de dentro. A silenciosa última cena é o laço mais perfeito – e mais coerente com tudo o que se viu na tela – no presente que Cronenberg escolheu para seu espectador. Indicações: ator coadjuvante, roteiro adaptado.

A Marcha dos Pingüins , de Luc Jacquet

A própria natureza do ciclo de reprodução dos pingüins já tem drama suficiente para emocionar o público. Tudo é tão bonito, as imagens são tão fortes. Os pezinhos para cima e tudo. Para que então o artifício de ‘humanizá-los’? É de lascar. O roteiro não tem a mínima vergonha de apelar no melhor estilo novelão mexicano. Eu, se fosse um pingüim imperador, me sentiria insultado. Indicação: documentário.

Memórias de uma Gueixa , de Rob Marshall.

A história é ruim e o diretor faz de tudo para torná-la mais brega ainda. Desperdiça bons atores, uma bela reconstituição de época, exagera na câmera que parece adorar se mexer para mostrar como é inteligente e exalta o drama da trilha de John Williams o quanto pode. No fim, não dá em nada além de um filme da Barbie. Indicações: fotografia, direção de arte, figurinos, trilha sonora, som e edição de som.

Munique, de Steven Spielberg.

Mesmo abraçando o documental, o diretor não se esquiva de uma das coisas que melhor sabe fazer: humanizar suas personagens. Todos os integrantes do grupo ganham atenção em maior ou menor grau. Não se trata de imparcialidade, mas de foco. Há, inclusive, uma bela cena entre um judeu e um árabe numa discussão sobre terra, lar, casa. Para Spielberg, o que importa não é a política. Nem exatamante a ética. O que conta é a porrada nos ouvidos de quem aperta o botão. Indicações: filme, direção, roteiro adaptado, montagem, trilha sonora.

A Noiva-Cadáver , de Tim burton e Mike Johnson.

O que mais faz falta nessa nova incursão de Tim Burton pelas animações tradicionais é justamente o macabro que é tão insinuado no tema, na forma, na intenção. Há, para não ser completamente injusto com o filme, o mérito de tratar a morte como um assunto qualquer para as crianças. Mesmo assim, é um filme que tem muitos encantos em suas qualidades mais, digamos, cinematográficas. Indicação: animação.

Orgulho e Preconceito , de Joe Wright.

Luminoso filme de estréia do diretor, que dá um vigor impressionante a uma história clássica. Keira Knightley está belíssima e muito à vontade no papel, mas o tristonho Matthew McFayden é quem dá um verdadeiro show. O texto afiado ganhou intérpretes dedicados e uma direção refrescante. Indicações: atriz, direção de arte, figurinos, trilha sonora.

O Segredo de Brokeback Mountain , de Ang Lee.

Retratar um relacionamento escondido por vinte anos poderia facilmente cair no banal, no desfile de exibições de preconceito. Ang Lee foi para outro lado. O preconceito do mundo aparece menor do que o próprio preconceito interior. O filme para ser mais uma luta íntima contra as próprias limitações do que uma batalha contra fronteiras impostas pelos outros. É um filme que não abre espaço para a afetação ou para o melodrama. O corte é seco, o texto é duro, a fotografia é elegante, enxuta, clássica. Tudo o que um filme macho pede. Indicações: filme, direção, ator, ator coadjuvante, atriz coadjuvante, roteiro adaptado, fotografia, trilha sonora.

Sra. Henderson Apresenta , de Stephen Frears.

Frears se rende aos light-hearted movies numa aposta não muito impossível para o Oscar. O filme se apóia em estereótipos clássicos (a velhota impossível, a frente de seu tempo – Judi Dench, num timing absurdo para a comédia – que encontra um homem durão para confrontá-la) e não traz novidade alguma. O visual, aliás, toda a técnica é competentíssima. A música de George Fenton enche os ouvidos, assim como as belas e bobas canções. Indicações: atriz, figurinos.

Star Wars: Episódio III – A Vingança dos Sith , de George Lucas.

Um incontestável mérito do filme é o de trabalhar com inteligência a partir do óbvio. Nada é tão fácil. Todas as decisões têm prismas diversos. A primeira frase de Darth Vader, o maior dos vilões, é bem pontual neste sentido. E o amor também gera o mal. Mesmo a personagem de Ian McDiarmid ganha contornos que multiplicam suas leituras. E os jedis não são tão perfeitos assim. Lucas faz heróis falíveis. E isso encanta. Indicações: maquiagem.

Syriana , de Stephen Gaghan.

Filme-denúncia sobre a corrupção e as negociatas que imperam na indústria petrolífera. Com tantos personagens, não raramente fica confuso. Aliás, é meio difícil mesmo conseguir entender todos os detalhes da trama. Mas as histórias são bem resolvidas pelo roteiro e o filme termina fechadinho. George Clooney, que disputa o Oscar, está bem mesmo. Indicações: ator coadjuvante, roteiro original.

Transamérica , de Duncan Tucker.

Felicity Huffman, da série Desperate Housewifes, que eu nunca vi, cotada para o Oscar. Ela está ok, mas o que mais chama atenção é mais sua personagem do que sua interpretação em si. O filme segue uma fórmula de reencontro familiar que não acrescenta muita coisa ao que já se viu. É simpático, só isso. Indicações: atriz, canção.

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