Somos Tão Jovens

As primeiras cenas de Somos Tão Jovens têm muitos momentos de constrangimento. Os diálogos são didáticos – não apenas em relação à história, mas à concepção de um diálogo em si -, muitos desempenhos parecem amadores, mesmo quando se trata de atores veteranos, e a direção frouxa não dá credibilidade aos eventos. Tudo parece o primeiro de uma longa temporada de ensaios para se chegar à versão final da obra, contrastando com a experiência do diretor, de 77 anos, que tenta buscar o espírito revolucionário de Renato Russo, mas faz apenas um retrato rápido e comportado de um pós-adolescente inquieto, como se o mito bastasse e não fosse preciso vasculhá-lo.

Antonio Carlos da Fontoura passou alguns anos trabalhando no projeto, que opera no recorte entre o fim da adolescência do músico até a formação do Legião Urbana, reproduzindo um modelo de cinebiografia musical que virou padrão no Brasil nos últimos dez anos e já contou as histórias de Cazuza, Luiz Gonzaga e Zezé di Camargo e Luciano. Todos são filmes que não se arriscam, mas trabalham com a memória afetiva do brasileiro, interessado em ouvir as músicas de seus ídolos, entender suas histórias e descobrir como foram suas vidas. Todos bem diferentes do retrato sujo que Fontoura fez em 1974 do travesti Madame Satã em Rainha Diaba.

De 2 Filhos de Francisco, que inaugurou a série de cinebios de músicos brasileiros, o diretor tomou emprestado um dos protagonistas, Thiago Mendonça, intérprete de Luciano, que faz um trabalho esforçado para incorporar o gestual e a inquietação de Renato Russo. Sua interpretação parece caricatural à primeira vista, mas ganha força quando o filme promove momentos mais dramáticos, que exigem mais espontaneidade do ator. O próprio Mendonça canta as músicas do filme – emulando o líder do Legião Urbana no timbre e nos trejeitos vocais. O resultado é acima da média, mas se perde na linha reta que o filme segue.

Aninha, vivida por Laila Zaid, é uma figura fundamental para o desenvolvimento da trama do filme. Ela é o contraponto e o interesse romântico do protagonista. Mas, na verdade, a personagem é uma combinação de três amigas reais de Renato Russo, o que indica que o objetivo do diretor está muito mais em oferecer uma versão romanceada da vida do homenageado do que explorar as arestas de sua trajetória. Embora a atriz ofereça uma bela interpretação, estabelecer que na vida do “trovador solitário” havia uma única musa inspiradora, um verdadeiro amor, elimina boa parte da complexidade sobre o personagem.

Somos Tão Jovens não se interessa em explorar conflitos: a homossexualidade (ou bissexualidade) de Renato Russo ganha cenas que se apoiam mais na sugestão ou em diálogos superficiais do que abordam um assunto central na vida do cantor. O roteiro parece muito mais interessado em localizar os maiores clássicos do músico dentro da narrativa, seja contando a origem das composições, apresentando as músicas ou, na opção mais pobre do roteiro do experiente Marcos Bernstein, colocando títulos e versos conhecidos no meio dos diálogos: “Festa estranha”, diz Renato. “Gente esquisita”, completa Aninha. Exemplos de que o filme parece ser feito para suprir necessidades imediatas dos fãs da banda e, embora cumpra seu papel de oferecer um painel do surgimento do rock brasiliense, quase não se arrisca para descobrir o que há por trás do mito.

Somos Tão Jovens EstrelinhaEstrelinha
[Somos Tão Jovens, Antonio Carlos da Fontoura, 2013]

Comentários

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6 comentários sobre “Somos Tão Jovens”

  1. A verdade é que meu texto dá a impressão de que eu detestei o filme, mas acho que ele tem alguns acertos e, sem dúvida, coopta pelo lado emocional. A nostalgia bateu forte quando ouvi algumas músicas.

  2. é um filme infanto juvenil. renato russo pra quem assiste malhação. inclusive fontoura já foi roteirista de malhação, eu acho…

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