[novo diretor, velho Oeste]

Três Enterros são dois filmes em um. Na primeira metade, ele é um filme de Guillermo Arriaga, aquele que adora picotar a narrativa para criar enlaces-surpresas revelados em intermináveis flashbacks, com efeitos diversos. Uns funcionam bem, outros parecem revelar bobagens sem qualquer interesse para a trama; parecem apenas exercícios estilísticos. Esta primeira parte, ainda que o filme assuma um ritmo bem lento, é a conversa do filme com um cinema mais atual, onde o esquartejamento cronológico parece querer determinar invenção, criação, significação. O dispositivo se transformou em modelo desde meados da década passada e se desgastou rapidamente, mas parece que muita gente não partilha da mesma opinião.

A segunda metade é um filme de Tommy Lee Jones, um diretor estreante, que bebe na fonte clássica de nomes com John Ford ou, mais recentemente, Clint Eastwood, e aposta numa narrativa mais fluida com um duelo mais claro entre as personagens. É quando o diretor assume o controle da obra. Há ainda certa exaltação ética do protagonista, do homem do interior: o filme é o cumprimento de um compromisso entre o cowboy interpretado pelo próprio diretor e seu amigo estrangeiro. A viagem que se segue é mais uma daquelas onde a missão factual tem aqueles importantes efeitos de descoberta interior, de entendimento da solidão, mas Jones, que apenas nesta segunda parte parece ter controle do filme, se revela um cineasta simples, direto e, desta forma, muito eficiente.

O que é mais lamentável é que, ao partir para seu verdadeiro filme, o diretor abandone a melhor intérprete em cena, a garçonete de meia idade, feita por Melissa Leo. Em todas as cenas dela, fica clara a dedicação de Jones à composição da personagem, com olhares e silêncios ocupando o lugar de discursos para justificar suas ações. Mas, mesmo com a ausência da atriz, é na segunda fase que o filme realmente existe. E o diretor não teme filmar diálogos com mortos devidamente expostos para revelar as motivações de seu alter ego. Jones está muito em como ator, mas Barry Pepper está melhor. Um vilão que revela sua fragilidade à primeira mudança de contexto. Embora algumas cenas redentoras sejam extremamente dispensáveis, a estréia de Tommy Lee Jones como diretor deu um belo filme. Um filme comum, bem longe da obra-prima que pintaram, mas um belo filme.

[três enterros ]
direção: Tommy Lee Jones. roteiro: Guillermo Arriaga. elenco: Tommy Lee Jones, Barry Pepper, Julio Cedillo, Dwight Yoakam, January Jones, Melissa Leo, Mel Rodriguez, Cecilia Suárez, Ignacio Guadalupe, Vanessa Bauche, Irineo Alvarez, Guillermo Arriaga. fotografia: Chris Menges. montagem: Roberto Silvi. música: Marco Beltrami. desenho de produção: Meredith Boswell. figurinos: Kathy Kiatta. produção: Michael Fitzgerald e Tommy Lee Jones. site oficial:
três enterros. duração: 90 min. the three burials of melquiades estrada, estados unidos/frança, 2005.

nas picapes: [lay your trouble on my shoulders, paul mccartney]

Comentários

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5 comentários sobre “[três enterros]”

  1. Chico,

    Mais que John Ford e Clint Eastwood, Tommy Lee Jones parece beber da fonte de Sam Peckinpah para este seu longa de estréia.

    Mas é realmente inevitável pensar, devido à sua economia na direção, que ele aprendeu uma ou duas coisas com Eastwood ao atuar com e sob a direção dele em “Cowboys do Espaço”.

    Eu daria mais uma estrelinha pra ele, nem que fosse apenas pela cena da ligação telefônica no bar mexicano, que é um primor de direção cinematográfica.

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