Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre sua Existência
[En Duva Satt på en Gren och Funderade på Tillvaron, Roy Andersson, 2014]
O cinema de Roy Andersson tem uma fórmula que se repete: seus filmes são formados por esquetes de humor nonsense que geralmente preparam o espectador para uma mensagem ou um questionamento final. O sueco é um bom encenador, tem um dom para criar quadros sólidos, que funcionam isoladamente, mas que também dialogam uns com os outros e, muitas vezes, consegue oferecer boa comédia em suas microestórias melancólicas. Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre sua Existência, premiado em Veneza, segue essa proposta de cinema, expondo o absurdo do cotidiano para denunciar a hipocrisia da vida. Em cada pequeno capítulo, Andersson usa a maquiagem excessiva, a encenação nada naturalista e a idiossincrasia das situações retratadas para chamar atenção para o ridículo no ser humano. Seu plano é deixar o espectador anestesiado, mas atento para que ele perceba onde o homem pode chegar. Essa reflexão sobre a própria existência só peca justamente pela repetição da fórmula. O processo do cinema de Andersson fica muito exposto e diminui o impacto de suas próprias revelações. O mecanismo parece tão ou mais importante do que as conclusões filosóficas do cineasta.
As Maravilhas
[Le Meraviglie, Alice Rohrwacher, 2014]
Gelsomina, como a personagem homônima vivida por Giulietta Masina em A Estrada da Vida, está descobrindo o mundo. A adolescente, filha de uma família que vive de produzir mel no interior da Itália, começa a se interessar por um garoto e vê na possibilidade de participar de um programa de TV a chance para conhecer novos horizontes. A maior qualidade de As Maravilhas é sua fortíssima ligação com a memória. O filme é uma espécie de diário poético sobre uma infância idealizada, onde é permitido acrescentar fantasia e elementos mágicos para construir uma lembrança perfeita. A cineasta Alice Rohrwacher se baseou em passagens de sua juventude para escrever o longa e escalou a irmã, Alba, para o papel da mãe de Gelsomina. Muito mais complexo do que parece, o filme costura essa caderneta de notas do passado com referências sutis ou explícitas a Federico Fellini, uma crítica colorida à televisão italiana (com a ajuda de Monica Bellucci) e uma poesia sincera que servem para basear a história da transformação de uma menina em adolescente.
Mary, Rainha da Escócia ½
[Mary Queen of Scots, Thomas Imbach, 2013]
A narrativa de Mary, Rainha da Escócia é em missivas. Thomas Imbach usa as cartas de Mary para Elizabeth e de Elizabeth para Mary como base para construir a trama política intrincada sobre as duas primas-rainhas como um livro de história. O diretor acerta em cheio em apostar na ausência física de Elizabeth. Mostrar a Rainha da Inglaterra sempre pareceu irresistível para os cineastas que contaram antes esta história, mas, ausente, Elizabeth cresce fantasmagórica. As belas imagens no entanto se perdem um pouco por causa do tom do filme. Da trilha à montagem, tudo é solene no filme, baseado na novela de Stefan Zweig, menos a interpretação esquálida da protagonista Camille Rutherford, que nunca consegue alcançar a pompa que Imbach tenta impor ao longa. Para realizar seu intento, o diretor precisaria de uma atriz muito mais poderosa. O duelo entre a intérprete e a protagonista prejudica muito o resultado. Mas o cinema de Imbach é bastante vigoroso.