Passei nove anos da minha vida trabalhando em emissoras de televisão e posso garantir que Carreiras é um filme estúpido, irresponsável e, com o perdão do trocadilho, carreirista. Para começar, existe uma completa ignorância de como funciona uma redação de TV. Parece que não tiveram dinheiro para contratar alguém para pesquisar melhor – se bem que as informações poderiam sair de uma mesa de bar… se é que não saíram.

Em seguida, há uma visão preconceituosíssima do jornalista de uma maneira geral, condenado à alcunha de figura desumana, vendida, corrupta e drogada – o título ‘espertinho’ faz uma perversa alusão a isso. Se fosse escrito decentemente ou tivesse um diretor inteligente, a visão clichê nem incomodaria tanto, mas o argumento é precário e a realização, medíocre.

Uma saída pra tentar equilibrar essa falta de talento é, acovardadamente, transformar Priscilla Rozenbaum numa versão feminina de Domingos Oliveira – com dicção melhor – efusivazinha, verborragicazinha, inquietazinha. Uma aposta certa numa fórmula batida. Sua personagem ‘cheirada’ é vergonhosa. Mas a apelação não pára por aí.

Sob a desculpa de justificar sua condição, digamos, ‘artesanal’, o filme tenta se vender como produto indie necessário para um “e a luta continua” da ala do cinema brasileiro que acha que tem alguma coisa a dizer. Para um filme que abre com um pedido de desculpas por existir, que se transforma em “me aceitem do jeito que eu sou e me defendam porque eu não tenho dinheiro” logo depois, era pedir demais qualquer coisa diferente. Fazia tempo que um filme não era tão ofensivo.

Carreiras Estrelinha
[Carreiras, Domingos Oliveira, 2005]

Comentários

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10 comentários sobre “Carreiras”

  1. Me incomoda como o filme é raso. E se a intenção não é atacar a profissão do jornalista, não sei bem qual bem é. Existiria uma concepção de um médico como alguém que se vende pela fama, sucesso, dinheiro e prestígio da forma como esse filme classifica o jornalista? Acho difícil, mas pode até ser. E, outra coisa que volto a falar, é preciso saber sobre o que se está tratando. Porque, olhando de dentro, os errinhos de nomenclatura, a visão simplista e equivocada de como se funciona um jornal ou um programa de TV só faz o armengue que este filme é crescer aos olhos.

  2. Gostei muito do filme. Não me pareceu que a intenção ali era utilizar a personagem para representar um grupo. Acho que o filme consegue individualizar a personagem, não importando muito se ela é uma jornalista, médica ou outra coisa. É uma situação genérica (envelhecimento x profissão) com uma resposta muito específica (acompanhamos a reação da personagem e não de um grupo representado por ela).
    O que pode incomodar um pouco algumas pessoas é ver um filme onde a personagem principal é egoísta, mas de forma alguma está ali como estereótipo de um profissional. O nome “Carreiras” do filme no plural até da uma pista: podem ser as “carreiras” de cocaína que ela cheira, as “carreiras” no sentido de corridas que ela dá na rua ou “carreiras” como o desenvolvimento profissional em qualquer profissão. Um abraço.

  3. Chico, tb não gostei do filme, achei que foi a pior coisa que o Domingos já fez, mas acho complicado assumir que ele quisesse atacar os jornalistas por fazer uma personagem jornalista daquele jeito. Se fosse uma atriz, seria um ataque às atrizes? Acho que não, é uma personagem, é uma no meio de várias.

  4. Se vc quiser um exemplo de filme ruim, Guiu, corra pro cinema.

    Tiago, eu me senti incomodado do começo ao fim. Nem acho que a questão seja simplificar o que é uma redação de TV, mas não ter informação mesmo. Errar feio em detalhezinhos fundamentais. E, por mais que esteja tratando de uma noite, o filme ainda me soa gratuito e equivocado.

    O diretor tem coisas boas, Eduardo, mas realmente acho que ele tem feito filmes bema mais ou menos.

  5. Não acho que o filme queira simplificar o universo de uma redação de TV. Não é por nada, Chico, mas mulheres como a do filme podem sim existir (por que não?). E, no mais, tudo o que o Oliveira retrata é apenas UMA madrugada de fúria na vida da moça. Tanto que (SPOILERS!) no dia seguinte, tudo fica bem novamente.

  6. Valha-me! Agora deu vontade de assistir! Até pq passei metade de minha carreira de 13 anos no jornalismo dentro de uma redação de TV… vejamos então…

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