Thomas Vinterberg ficou conhecido há 14 anos quando fez Festa de Família, o primeiro – e melhor – filme do movimento Dogma 95. O longa, que pelas regras do grupo não leva a assinatura do diretor, revelou um cineasta provocador, afeito a temas polêmicos, que utiliza o aniversário de 60 anos de um homem para devassar os segredos na história de sua família, criando algumas das cenas mais incômodas do final da década de 1990. Depois de um surgimento tão promissor, Vinterberg ficou devendo. Nenhum de seus projetos seguintes provocou reação semelhante a de seu filme mais famoso. Pelo contrário. Dogma do Amor fez muita gente duvidar de seu talento. Depois do ensaio de um retorno no irregular Submarino, o dinamarquês faz as pazes com o bom cinema em A Caça.
No filme, estrelado por Mads Mikkelsen, que ganhou o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes deste ano, o cineasta volta a tocar em um tema delicado, talvez o mais delicado de todos: a pedofilia. Mas ao invés de seguir pelo caminho mais convencional, o da denúncia, Vintenberg se dedica a estudar suas repercussões e lançar um questionamento mais profundo sobre o poder da palavra na sociedade de hoje. Como em Festa de Família, o tom é o de terror psicológico, que sufoca tanto o protagonista quanto o espectador, preso numa rede de intrigas que ganha novos capítulos e personagens a cada cena.
No entanto, embora Mikkelsen interprete um professor de escola fundamental que se vê acusado de abusar de uma garotinha de imaginação fértil, o filme não se resume ao pavor provocado pela possibilidade de pedofilia, mas ajuda a pintar um quadro pessimista do estado do homem atual, sempre disposto a apontar e julgar suspeitos. O diretor parece afirmar que hoje vivemos na época do decreto, em que a pluralidade das vozes determina certezas. Ao acompanhar detalhadamente o processo de isolamento do personagem principal, Vinterberg faz uma reflexão sobre a paranoia, na qual fantasmas de assuntos proibidos nem precisam se materializar para provocar pânico, definir verdades e precipitar condenações.
A Caça ½
[Jagten, Thomas Vintenberg, 2012]
Um pensamento sobre “A Caça”