[bonitinho e ordinário]

Eu sou um defensor incondicional da expressão bonitinho. Não consigo entender porque o diminutivo de bonito é tão rechaçado pelas pessoas. Talvez porque elas queiram elogios sempre maiores e, nesse sentido, os ãos e os aços são mais eficientes. Eu já acho que a função do diminutivo é a da aproximação, da demonstração de carinho. Por isso, quando eu acho uma coisa é merece um elogio pela sensibilidade ou que merece mérito pelos pequenos detalhes, eu uso sem dó nem perdão a expressão bonitinho. Albergue Espanhol, filme do francês Cédric Klapisch, de uns dois ou três anos atrás, se encaixa perfeitamente na descrição: um filme bobo, despretensioso, que vence pela identificação, pelo carinho com as personagens, pela maneira fácil, mas inteligente, de se apresentar uma discussão.

Começava com a viagem de um jovem francês para a Espanha, onde foi fazer faculdade, e se desenvolvia numa casa onde o protagonista passou a morar com outros cinco estudantes de nacionalidades diversas. O filme se utilizava do método para questionar os efeitos da criação da União Européia e discutir o conceito de identidade. Foi um dos filmes mais pop daquele ano. E ainda tinha umas brincadeiras de linguagem, que davam um molhinho extra. Engraçado que o filme parecia ter cumprido seu papel, mas Klapisch resolveu que não e ressucitou o mesmo protagonista numa continuação sem graça chamada Bonecas Russas.

As peripécias amorosas de Xavier parecem menos interessantes do que sua relação com seus ex-flatmates de nacionalidades diferentes. Enquanto o filme anterior aposta num discurso menos empostado para discutir identidade numa época em que os limites geográficos são mais fragéis, Bonecas Russas aposta numa busca pela mulher perfeita num molde desgastado, disfarçado de moderninho. O novo filme utiliza os mesmos artifícios do longa original e não apresenta novas idéias. O frescor não existe mais. Se o primeiro apostava no Radiohead como trilha, este vai de Beth Gibbons. Klapisch só usa as personagens que julga necessárias para compor a nova história e força a barra num desfecho todos-juntos-somos-fortes desinteressante.

Ah, qual foi a razão para fazer este filme? Oportunismo? Nostalgia? Apego às personagens? Não sei dizer, mas me pereceu, além de cômodo, pouco justificável. Albergue Espanhol era bem bonitinho. Bonecas Russas, nem isso.

[bonecas russas ]
direção e roteiro: Cédric Klapisch. elenco: Romain Duris, Kelly Reilly, Audrey Tautou, Cécile de France, Kevin Bishop, Evguenya Obraztsova, Irene Montalà, Gary Love, Lucy Gordon, Aissa Maïga, Martine Demaret, Pierre Cassignard, Olivier Saladin, Pierre Gérald, Zinedine Soualem, Hélène Médigue. fotografia: Dominique Colin. montagem: Francine Sandberg. música: Loïc Dury e Laurent Lavesque. desenho de produção: Marie Cheminal. figurinos: Anne Schotte. produção: Matthew Justice e Bruno Levy. site oficial:
bonecas russas. duração: 125 min. les poupées russes, frança/inglaterra, 2005.

nas picapes: [regret, new order]

Comentários

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9 comentários sobre “Bonecas Russas”

  1. Sou mais um órfão de “Albergue Espanhol”, com o qual me identifiquei muito. “Bonecas Russas” patina quase o filme inteiro, e só tem algum interesse quando resolve focar na história de amor entre Xavier e Wendy, mas aí já é tarde demais. E o senso de humor do filme é de doer…

  2. Aso a expressão “bonitinho” até quando o elogiado é grandão. Bonitinho é outra coisa, muito além da beleza. Seu blog é bonitinho demais, viu? Você escreve muito bem.
    Ah… sobre o filme: adorei o albergue, essa discussão da união européia é muito interessante (pessoalmente acho impossível reunir tantas culturas e ficar tudo em paz) e ele tratou do tema com leveza. Uma boa mistura.

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