O Escafandro e a Borboleta

O Escafandro e a Borboleta é um desafio o espectador. Durante seus primeiros trinta (talvez mais) minutos, não vemos o rosto do protagonista. Num clássico filme de doença, passado quase que inteiramente dentro de um hospital, Janusz Kaminski reiventa o que se chama de fotografia, assumindo não apenas o ponto de vista de quem conta a história, como transformando sua visão turva e limitada num carrossel de experimentos visuais e sensoriais em que os atores encaram a câmera o tempo todo. Um trabalho impressionante que precisa ser visto para dar conta de sua totalidade.

Em seu terceiro longa, Julian Schnabel radicaliza seu compromisso com o marginal, que ficava mais em seus objetos nos filmes anteriores que dirigiu, Basquiat e Antes do Anoitecer, e leva suas experiências plásticas para a forma como filma. É seu trabalho mais apurado, embora a radicalidade do primeiro ato seja abafada depois de uma reviravolta, espertamente justificada no roteiro, tornando o filme mais convencional e talvez mais palatável para um espectador que busca apenas uma bela história. Afinal, o filme é sobre um editor de uma revista que sofre um derrame, perde os movimentos, mas consegue escrever um livro.

Mesmo assumindo esse lado mais clássico, Schnabel adota alguns métodos que deixam O Escafandro e a Borboleta diferenciado dos outros exemplares de seu ‘gênero’. Primeiro, Ronald Harwood, que escreveu aquela ode à tristeza que é O Pianista, não apenas adaptou o livro de Jean-Dominique Bauby, como tentou capturar seu antes e seu imediatamente depois, rendendo um monólogo aparentemente interior que ganha a cumplicidade do espectador, o único capaz de ouvir o personagem principal, o que cria uma intimidade silenciosa.

O segundo grande trunfo é como, apesar de bastante delicado e inevitavelmente entristecido, o filme tem um enorme senso de humor, com Mathieu Amalric fazendo piadas sucessivas sobre a condição de seu personagem e todos que o cercam. Um grande trabalho de interpretação, por sinal, já que o ator só tem diálogos em flashback, mas se desdobra para dar conta da complexidade do protagonista. O restante do elenco, cujas performances são quase que sempre uma conversa com a câmera, também é desafiado, com Emmanuelle Seigner e, principalmente, Marie-Josée Croze sendo as melhores em cena.

Entre o filme de doença e o experimento cinematográfico, Julian Schnabel conseguiu um meio termo bastante equilibrado. Um filme inteligente, que tenta trazer um algo novo e que, ao mesmo tempo, é uma homenagem singela que talvez mereça uma estrelinha a mais.

O Escafandro e a Borboleta EstrelinhaEstrelinhaEstrelinha
[Le Scaphandre et la Papillon, Julian Schnabel, 2007]

Comentários

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31 comentários sobre “O Escafandro e a Borboleta”

  1. É uma pena, muitos opinioes, muitos entendimentos, talvez isso que aflora dentro do pensamento do ser humanos, seja nossa realidade, cultura, valores esquecidos a quem somos, a vida, passageira que nao tem retorno, o filme em si retrata a vida, o que somos o que podemos ser, nao somos nada, somos obra do destino, devemos sim é valorizar aproveitar, fazer o bem, compartilhar a fraternidade a igualdade entre os seres dotados de razao, veja por esse lado, sua vida o que ela significa pra voce, oque voce pode fazer pelo seu proximo, ainda da tempo, faca pelo menos alguma coisa, algo de bom, beije sua esposa(o)diga quanto ama seu filho(a) ame sua vida, a unica coisa certa que voce tem razao e consiencia.

  2. Achei o filme magnifico! Alem da fotografia impressionante que me colocou dentro dele tornando-me tanto escafandro quanto borboleta, falou de outros tipos de clautros que sao possiveis de acontecer (como o do sequestrado, o pai dele no apartamento)e outras dimensões daliberdade.

  3. Esqueci… o que é aquele abecedário? Até hoje ouço aquela interminável repetição. Gostaria de entender mais de filmes e achar alguma coisa interessante neste tipo de filme.

  4. eu amei o filme por sua profundidade, como mtas vezes levamos a vida s/ ter consciência da importãncia dos movimentos + simples q fazemos, amores e amigos q mtas vezes nessas horas abandonam e os verdadeiros amigos q realmente se esforçaram p ajudá-lo até sua ex, um filme bastante reflexivo. Mto interessante como a câmera foi colocada de forma q em mtos momentos nos sentimos na pele do protagonista, eu recomendo sim + uma estrela s/ dúvida. Perfeito.

  5. chico, me identifiquei com a sua crítica ao filme. um filme belo sem dúvida. todas as estrelas para ele. cenas, enquadramentos, fotografia, tudo concebido com muita sensibilidade. mais estrelas para a capacidade, do diretor, de aliar um humor finíssimo a um tema triste e trágico. tocante. me fez sair muda do cinema. merece um céu de estrelas. amei.

  6. amei esse filme…bastante interessante..com cenas incriveis e de reflexão! realmente não tem como esquecer as cenas em que a camera simula o olho..expressando as emoções..
    é um enorme contato do filme com o publico! me emocionei demais..é como se vivêssemos junto do protagonista aquele momento..sabendo exatamente como ele se sentia..
    amei! =)

  7. Este é um filme que não termina quando saimos do cinema, pois nos faz refletir sobre a vida, sobre a capacidade de amor que nos mostram alguns personagens, sobre o poder da imaginação e da memória que mantém vivo o protagonista, sobre a capacidade de reinvenção do diretor e do responsável pela fotografia, etc, etc. É simplesmente magnífico. Pretendo ler o livro imediatamente e aconselho a todos que apreciam a arte cinematográfica que não percam esta obra prima. A ele daria todas as estrelas.

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