Lee Daniels adora praticar abusos. Preciosa é um exercício apelativo, em que a protagonista é colocada sob todas as provas possíveis. Obsessão mira no ridículo e no grosseiro para se vender como genuíno. Diante de um retrospecto como este, seria de se esperar que O Mordomo da Casa Branca, seu trabalho mais recente, fosse minimamente provocativo, mesmo que pelas razões equivocadas. Pelo contrário. É um dos filmes mais apáticos do ano.
A história do mordomo que serviu a sete presidentes americanos segue as regras das cinebiografias de tom grandioso, que louvam seus protagonistas. A grande questão aqui é que nunca se apresenta um verdadeiro motivo para que o homenageado aqui seja celebrado. Por sinal, homenageado é a palavra certa para descrever como Daniels trata o personagem. Sua moral, sua polidez, sua discrição, seus méritos éticos e até sua neutralidade são celebrados como exemplo máximo de vida. A trajetória de Cecil Gaines é, para o cineasta que outrora procurou o choque, um modelo a seguir.
Daniels filma de maneira preguiçosa. Parece recusar qualquer possibilidade de criação. As cenas são meras molduras para que Forest Whitaker revele sua suposta bela interpretação para “um americano de verdade”. O ator, que já demonstrou seu talento inúmeras vezes, está morto em cena, nunca arrisca, passa praticamente despercebido. Mas não pelo diretor. A montagem maniqueísta do filme induz o espectador a acreditar que a subserviência de Gaines foi um ato político que teve reflexos importantes para a história americana. Da morte do pai aos papos com Ronald Reagan, o longa vende o personagens como um revolucionário silencioso. Tão silencioso que o espectador nunca percebe sua revolução.
A apatia se espalha por todo o lado. O elenco cheio de nomes famosos mais parece um desfile da Ilha de Caras. Nenhum dos atores de primeira linha como Vanessa Redgrave, Jane Fonda e Alan Rickman (um inglês interpretando Ronald Reagan) mostra qualquer diferencial em suas interpretações. Quem mais sofre são os que precisam usar maquiagem. John Cusack está especialmente ridículo como Richard Nixon. Robin Williams e Liev Schreiber não dizem a que vieram. A personagem de Oprah Winfrey é uma das mais fracas, inexplicavelmente chatíssima, embora a direção, o roteiro e atriz, tentem fazer com que ela valha um Oscar.
No fim das contas, O Mordomo da Casa Branca parece um filme-propaganda, um crowd pleaser que não incomoda ninguém, exceto quem pede um pouco mais de inteligência. A bilheteria de mais de U$ 100 milhões no Estados Unidos se explica porque os americanos adoram ver seus presidentes no cinema (e aqui há vários deles) e pelo fato do filme se apresentar como “cinema negro”. Com pontas de seus “brothers” Mariah Carey e Lenny Kravitz, Lee Daniels pisou na bola mais uma vez. Não que alguém esperasse algo diferente. Só menos burocrático.
O Mordomo da Casa Branca
[Lee Daniels’ The Butler, Lee Daniels, 2013]
Que deprimente, a crítica. Ao contrário do que foi dito, o incômodo não se fez pra quem pede um pouco mais de inteligência ( que falta de respeito com pessoas que VIVEM e se EMOCIONAM com os filmes. Não gastam seu dinheiro para observar falhas, porque é exatamente isso que pessoas como VOCÊ, frustadíssimas com certeza, fazem.), mas para aqueles que, mesmo sabendo das simplificações e possíveis alterações em relação à real história, tiveram compaixão com a luta dos negros pelos direitos civis e com a figura tocante do mordomo. Você não entende de gente.
Ester, vc está certa. A maneira com que escrevi não respeitou quem gostou do filme.