A INGLESA E O DUQUE
Grace Elliott era quase uma cortesã, mas guardava grande dose de pureza em sua alma. Fazia de tudo para ajudar as pessoas, conhecendo-as ou não. E, durante a Revolução Francesa, não faltava gente precisando ser ajudada. A senhora Elliott tinha por hábito anotar os principais acontecimentos de seus dias, com um destacado espaço para suas (boas) ações. O nouvellevagueano Éric Rohmer escolheu como roteiro, para o que classifica como seu último filme – Rohmer tem 94 anos -, a história da senhora Elliott. E fez isso da maneira mais fiel possível às memórias de sua protagonista: tratando seus dias como páginas de um diário, romãntico, idealizado e, por conseqüência, artificial.
Elliott é retratada como uma mulher tão ingênua, que quase se esquece que ela vivia pulando de parceiro, trocando um duque pelo outro e mantendo uma relação amistosa com todos eles, afinal ela é uma boa pessoa. Se isso era pecado no século 18, Grace Elliott deve tê-lo pago ao acolher um fugitivo da revolução que mal conhecia debaixo de seus lençóis. Os fatos da vida da senhora Elliott podem até ter sido verdade, mas parecem tão construídos, fabricados que fica difícil se emocionar com eles. Rohmer, com bastante propriedade, conduz seu longa com distanciamento, como se não quisesse se comprometer com plausibilidade. Para o texto e para as interpretações (pouco empolgadas e empolgantes, sobretudo a da insossa protagonista), isso não funciona. O espectador olha e, quando não tira um cochilo, não se interessa. Para a imagem, a história é outra.
O programado artificialismo abraça uma idéia fantástica: todos os cenários externos são pinturas. Os atores contracenam diante de imensos painéis, que viram ruas, praças, rios e paisagens campestres. Eles entram e saem dos cenários e interagem diretamente com as telas. O tom assumidamente fake tem um resultado fabuloso visualmente. Muitas e muitas cenas parecem pinturas vivas, criando um efeito impressionante e fascinante. Pena que uma imagem só valha mais que mil palavras. Aqui precisava-se de mais.
A Inglesa e o Duque
L’Anglaise et le Duc, França, 2001
Direção: Éric Rohmer.
Elenco: Lucy Russell, Jean-Claude Dreyfus, Alain Libolt, Charlotte Véry, Rosette, Léonard Cobiant, François Marthouret, Caroline Morin, Héléna Dubiel, Laurent Le Doyen, Georges Benoît, Serge Wolfsperger, Daniel Tarrare, Marie Rivière, Michel Demierre, Serge Renko, François-Marie Banier.
Roteiro: Éric Rohmer, com base nas memórias Journal of My Life During the French Revolution, de Grace Elliott. Produção: Françoise Etchegaray. Fotografia: Diane Baratier. Edição: Mary Stephen. Direção de Arte: Antoine Fontaine. Figurinos: Nathalie Chesnais e Pierre-Jean Larroque.